Vulnerabilidades aproximaes tericas para o exerccio da proteo
Vulnerabilidades: aproximações teóricas para o exercício da proteção social Carla Bronzo – FJP/MG Capacita SUAS Brasília - 2017
1. Vulnerabilidade e Proteção social: Qual o papel do Estado na garantia da proteção social? 2. O que cabe à assistência, em termos de proteção? 3. O conceito de vulnerabilidade. Porque não dizer de pobreza, simplesmente? 4. Os desafios de capturar e mensurar vulnerabilidade e oferta da proteção.
1. VULNERABILIDADE E PROTEÇÃO SOCIAL: QUAL O PAPEL DO ESTADO NA GARANTIA DA PROTEÇÃO SOCIAL?
• As políticas sociais emergem timidamente nos fins do século XIX (Lei dos Pobres, 1834, na Inglaterra; 1883, na Alemanha de Bismarck) e ganham corpo a partir da segunda metade do século XX, como um conjunto coerente de intervenção do Estado na garantia de direitos sociais. Somente a partir da década de 50, pode-se dizer da existência de Estados de Bem Estar Social. Concepção riscos e vulnerabilidade em sua base. • “A essência do Estado de Bem Estar Social reside na proteção oferecida pelo governo na forma de padrões mínimos de renda, alimentação, saúde, habitação e educação, assegurados a todos os cidadãos como um direito político, não como caridade” (Harold Wilensky, apud Faria, 1998, p. 39)
Os tipos de Estados de Bem Estar Social, por E. Andersen • Diferentes desenvolvimentos históricos e políticos das sociedades capitalistas levou a diferentes tipos de Estados de Bem Estar: compreensão diversa do papel que cabe ao Estado, ao Mercado e às Familias na provisão da proteção social (Esping Andersen). • Tipologia construída a partir de duas dimensões: – Desmercantilização: possibilidade dos indivíduos e famílias manterem padrão de vida independente da participação no mercado. – Estratificação social: a interferência do Estado Social corrige ou reforça a estrutura de desigualdade gerada pelo mercado. • “Estado de Bem Estar Social é em si mesmo um sistema de estratificação. É uma força ativa no ordenamento das relações sociais” (E. Andersen, 1990)
F E M Liberal: Mercado como principal provedor da proteção. Benefícios modestos e os critérios de elegibilidade selecionam apenas os que não contam com o mercado ou a família. Efeitos de desmercantilização baixos. Os mais ricos buscam proteção no mercado (iniciativa privada). Exemplos: EUA, Reino Unido, Austrália e Canadá. Conservador/corporativista Ênfase nas políticas de seguro (contributivas), com papel secundário para benefícios assistenciais. Efeitos de desmercantilização limitados. O foco no seguro social produz tensão entre incluídos e excluídos e reproduz estratificação do mercado. Exemplos: Alemanha e França. Socialdemocrata: estende o princípio de desmercantilização: Indivíduos dependem pouco da família e do mercado. Serviços sociais universais e de alto padrão e benefícios generosos. “todos se beneficiam, todos são dependentes e todos supostamente se sentirão no dever de contribuir”. Exemplos: países escandinavos. F F E M
Componentes de um sistema de Proteção Social (Cecchini e Martinez, 2011, Cepal) PROTEÇÃO SOCIAL SEGURIDADE (CONTRIBUTIVO) - Regimes de pensões contributivas (velhice, invalidez) - Seguros de saúde - Seguros desemprego - Licenças (maternidade, paternidade, enfermidade) ASSISTENCIA SOCIAL (NÃO CONTRIBUTIVO) -Transferência de renda e de bens, sujeitas ou não a condicionalidades (pensões sociais, programas de transferência de renda, etc) - Subsídios ao consumo - Empregos de emergência - Promoção e acesso aos serviços sociais (educação, saúde, cuidado, moradia, socioassistenciais) REGULAÇÃO MERCADO DE TRABALHO -Normativa e supervisão de padrões laborais orientados a fomentar e proteger o trabalho decente -Formalização de contratos, negociação coletiva, segurança no trabalho, salário mínimo, eliminação do trabalho infantil, políticas anti discriminação etc.
(Fora proteção social): microcrédito Sistema e componentes de Proteção Social: uma outra Proteção social representação Seguro social (social insurance) e políticas de mercado de trabalho Serviços sociais Acesso serviços educação, saúde, nutrição Pensões sociais, Public works Social safety nets (ou assistencia social) Transferências de renda incondicional (Fora proteção social): treinamento de professores Seguridade em saúde (health insurance) Fonte: BIRD. The state of social safety nets, 2014 Transferência renda condicionada
O que toda essa discussão tem a ver com vulnerabilidade? • O modelo de proteção social tem implicações diretas na estratificação da sociedade, nas condições de pobreza e vulnerabilidade da população. O Estado tanto pode produzir vulnerabilidades quanto pode superá-las a partir de políticas de proteção social. • O modelo de proteção social adotado espelha escolhas éticas e concepções de justiça social. Não há neutralidade e nem se trata de uma questão meramente técnica. É sobretudo uma questão política, de conflitos de interesses. Importante saber de que lado se está.
• A política de Assistência Social é apenas um componente da proteção social. A proteção não ocorre sem políticas fortes de seguridade social e sem políticas fortes de proteção ao trabalho. O momento político que vivemos e as ameaças aos direitos sociais, base de um sistema efetivo de proteção social. • As Reformas do Trabalho e da Previdência propostas pelo atual governo constituem um retrocesso em termos de garantias de proteção social. Restringem direitos. Impactos econômicos positivos das políticas sociais. O paradigma da inversão / investimento social e a visão estreita da proteção atual no atual governo.
2. O QUE CABE À ASSISTÊNCIA, EM TERMOS DE PROTEÇÃO?
• Política de Assistencia Social = Benefícios/transferências não contributivas (BPC, BF) + serviços socioassistenciais (SUAS) • Perspectiva dos direitos: assistência no âmbito da seguridade social (Constituição Federal de 1988) e sua organização por níveis de complexidade • Necessidade de identificar situações de desproteção, de vulnerabilidade; e ao mesmo tempo identificar recursos e serviços que podem ser mobilizados nos territórios (micro ou regionais) para “lidar” com tais situações. • A vigilância socioassistencial como função e ferramenta da proteção da assistência social.
• Os serviços de proteção social básica têm como objetivo: prevenir situações de vulnerabilidade social e risco pessoal e social por meio do desenvolvimento de potencialidades e aquisições, e o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários, em situações nas quais não houve ainda direitos violados ou vínculos comunitários e familiares rompidos. • A proteção social especial pode ser de média ou alta complexidade, e destina-se a famílias e indivíduos cujos direitos tenham sido violados ou ameaçados, envolvendo ou não a ruptura dos laços familiares e comunitários. Trata-se da “modalidade de atendimento assistencial destinada a famílias e indivíduos que se encontram em situação de risco pessoal e social, por ocorrência de abandono, maus tratos físicos e, ou, psíquicos, abuso sexual, uso de substâncias psicoativas, cumprimento de medidas sócio-educativas, situação de rua, situação de trabalho infantil, entre outras” (BRASIL, 2009, p. 37).
Aquisições e potencialidades. . • Desenvolvimento de padrões não violentos de resolução de conflitos • Aumento do sentimento de pertença • Promoção de proteção mutua • Aumento do conhecimento sobre direitos • Promoção e fortalecimento de redes de apoio • Fortalecimento da função protetiva da família • Prevenção da ruptura dos laços familiares • Potencialização do protagonismo e autonomia das famílias • Promoção do acesso a serviços socioassistenciais e setoriais Fonte: Maia, Priscila. MDS. Oficina de trabalho sobre acompanhamento das famílias em descumprimento de condicionalidades do Programa Bolsa Família
PNAS: orientada para garantir proteção social aos cidadãos contra riscos sociais inerentes aos ciclos de vida e para o atendimento das necessidades sociais. PAIF Básica (baixa CRAS complexidade) Objetivos/funções da Política Assistência Social: (PNAS; NOB/SUAS; Tipificação Serviços etc) SCFV Defesa de direitos Vigilância Socioassistencial Se materializa Seguranças: acolhida Espaços, escuta, informações sobre direitos, oferta de serviços e de locais de permanência Rede socioassist. Proteção social renda Auxílios financeiros e benefícios continuados para cidadãos em situação de vulnerabilidade Especial (média e alta complexidade) convívio Construção, restauração e o fortalecimento de laços de pertencimento; ruptura isolamento social autonomia Capacidades e habilidades para o protagonismo e exercício de cidadania CREAS PAEFI apoio e auxilio Auxílios em bens materiais e em pecúnia, em caráter transitório
A cadeia de objetivos para produção de efeitos Ações/ processos Insumos S E G U R A N Ç A S Produtos/Resultados intermediários - Acesso a bens e serviços -Fortalecimento dimensão protetiva da família (vínculos) e dos vínculos comunitários - Autonomia, fortalecimentos ativos psicossociais REDUÇÃO DA VULNERABILIDA]DE AUMENTO DA PROTEÇÃO SOCIAL A Q U I S I Ç Õ E S efeitos impacto
• A política de assistência tem uma dimensão clara de atuação no plano material, na oferta de benefícios e serviços para o público atendido, entre eles, o acesso à rede de serviços, seja da assistência ou de outras políticas ou setores. • Entretanto, uma dimensão central do trabalho social consiste em atuar na esfera do intangível, das relações sociais, da sociabilidade, na matéria mesma do tecido social. Vínculos, identidade, pertencimento, autonomia, protagonismo (dimensões “menos tangíveis”) • Como alterar aspectos psicossociais? Como fortalecer vínculos? Ou criar autonomia? A discussão interessa tanto para mensurar ou construir indicadores de resultados quanto para subsidiar as “tecnologias de intervenção”.
3. VULNERABILIDADE: PORQUE IMPORTA DISCUTIR CONCEITOS?
• A ideia básica: diferentes concepções levam a diferentes formas de mensuração e também, por outro lado, a diferentes respostas quanto às políticas e estratégias de intervenção. In measuring poverty, there is no single truth. Haughton & Khandker, Handbook on poverty and inequality
Mensurar envolve identificar os públicos potenciais e legítimos das ações no campo da proteção social. Operacionalização/ mensuração Concepção/enfoque Toda estratégia de intervenção tem uma teoria - mais ou menos explícita ou implícita – sobre o problema, que fornece o arcabouço para a ação. Estratégias de intervenção “A taxa de pobreza é, de fato, um construto social e de políticas públicas” (Haughton & Khandker) “Uma vez identificado o mal, tem-se o remédio para seu enfrentamento” (E. Fanfani)
Enfoques sobre a pobreza em uma linha temporal Antes dos anos 70 Pobreza como ausência de renda Linhas de pobreza Anos 70 Conceito necessidades básicas insatisfeitas, que envolve acesso a certos bens e serviços. Privações Rowntree, 1899, cidade de York. Linha pobreza baseada criterios nutricionais Anos 90 Anos 80 Enfoque das capacidades e da exclusão social, e a percepção de que pobreza é relativa e conectada com dimensões políticas, morais e culturais de cada sociedade. Noção de trajetória Pobreza multidimensional e altamente especifica ao contexto. Território. Foco não mais exclusivamente na caracterização da pobreza, mas nos processos. Noção de risco e vulnerabilidade. Ativos, estrutura de oportunidades, empoderamento. Anos 2000 – adoção do enfoque da vulnerabilidade na matriz de proteção social na Europa. Enfoque da proteção social integral com foco em direitos (CEPAL). Brasil: modelo de proteção - enfoque da vulnerabilidade, como base para o SUAS
Enfoque monetário • Conceito de pobreza colado à sua mensuração. Não existe definição; parte-se do método de mensuração • Distinção pobreza absoluta e relativa. Pobreza absoluta: Tal concepção considera como pobres aqueles que apresentam renda inferior a um valor equivalente ao necessário para a subsistência. Pobreza relativa: Define pobreza em termos de carências materiais expressas monetariamente, mas se fundamenta na idéia de que as necessidades são culturalmente determinadas. Fixa linha de pobreza como fração da renda média, incorporando assim uma medida de desigualdade. • Pressupostos: - Pobreza é igual à insuficiência de renda - Possibilidade de descontinuidade entre pobres e não pobres, com linha não controversa, definida como mínimo aceitável
Necessidades básicas insatisfeitas • Método direto de mensuração da pobreza, pois focaliza as condições de acesso e usufruto de serviços básicos: – habitação, água potável, energia elétrica, serviços sanitários, educação, saúde, nutrição etc. • Foco nos resultados efetivos em termos de qualidade de vida e não nos meios. • Concepção multidimensional • Perspectiva mínimos sociais • Caráter relativo do que pode ser considerado mínimo (altamente dependente do contexto) • Permite identificar heterogeneidade em termos de zonas geográficas. Construção de mapas. • Pobreza é multidimensional. Isso não significa que precisa ser medida (ou que será melhor medida) por um índice multidimensional.
Enfoque das Capacidades (Amartya Sen) • Pobreza como privação de capacidades básicas para operar no meio social. Pobreza como privação de liberdade • Inserção das noções de liberdade, dignidade e auto estima na caracterização do bem-estar. • Embora incorpore dimensões relacionais (inclusão e exclusão de A. Smith), o foco permanece no indivíduo. • Inserção noções de autonomia, agência. • IDH como medida decorrente. Encolhimento, na mensuração, da noção de desenvolvimento humano. • IPM – Índice Pobreza Multidimensional • Dimensões faltantes da pobreza: indicadores para mensurar aspectos menos tangíveis: humilhação, empoderamento, vergonha. . . OPHI (Oxford Poverty Human Institute)
Exclusão Social • Exclusão entendida como processo e não como situação estática; trajetórias. Caráter dinâmico • Exclusão centra-se nas relações e interações sociais, grupos e comunidades, mais do que nos indivíduos; dimensão relacional e relativa. • Foco na interação entre as diversas dimensões do problema. Multidimensionalidade. Aspectos econômicos, políticos, sócio culturais. • Noção de ação/agência. Exclusão como produto de escolhas de agentes públicos e privados. • Estrutura e agência se combinam nas raízes da exclusão, de forma específica, em lugares e tempos concretos.
VULNERABILIDADE • A singularidade da perspectiva da vulnerabilidade: sofrimento, insegurança, desamparo, para além das privações monetárias ou materiais em si. • Concepção de vulnerabilidade como uma abordagem capaz de absorver dimensões presentes em outros enfoques e expandi-las. • Ultrapassa as dificuldades decorrentes de uma concepção multidimensional da pobreza, ao focar os ativos, que permitem um ponto estável para construção de parâmetros para mensuração
• Concepção de vulnerabilidade reconhece a dupla dimensão da pobreza : fenômeno que agrega dimensões materiais e não materiais: privações objetivas e subjetivas (Dagmar Raczinsky) A visão dos pobres, pelos setores não pobres, como aqueles “que não sabem”, “que não têm”. Tais relações frequentemente reforçam atitudes psicossociais negativas (atitudes e comportamentos de apatia, passividade, resignação, baixa auto-estima, baixo protagonismo, baixa autonomia, desesperança, subordinação/subalternidade, fatalismo, dependência etc)
Elementos chave da concepção de vulnerabilidade: • Ideia de riscos • Ideia de processo- trajetória. Caráter dinâmico da pobreza (estratégias ex ante e ex post. Prevenção, mitigação e superação). • Noção de ativos: recursos de natureza tangível (capital humano, físico, financeiro) e menos tangível (capital social, relações familiares, dimensão relacional e psicosocial) • Estratégias de respostas. Uso dos ativos. Manejo dos ativos. Interação entre os diversos tipos de ativos e resultados que produzem no curto, médio e longo prazo (Caroline Moser) • Estrutura de oportunidades: conjunto de leis, instituições, políticas. Dimensão macro, contextual. • Unidades de análise: indivíduos, domicílios, territórios
O risco é a contra face da vulnerabilidade • Riscos: naturais (terremotos e cataclismas), • saúde (doenças, acidentes, epidemias, deficiências), • riscos ligados ao ciclo de vida (nascimento, maternidade, velhice, morte, ruptura familiar), • sociais (crime, violência doméstica, terrorismo, gangues, exclusão social), • econômicos (choques de mercado, riscos financeiros), • ambientais (poluição, desmatamento, desastre nuclear), • políticos (discriminação, golpes de estado, revoltas), etc. (Banco Mundial)
Nível micro Ativos materiais e não materiais Estratégia de resposta Nível macro Estrutura de oportunidades recursos financeiros, físicos, ligados ao capital humano (educação e saúde), relacionais, psicossociais Uso dos ativos: Interação entre os diversos tipos de ativos: diferentes estratégias e multiplicidade de resultados possíveis (ex: não pobreza e trabalho infantil; relações familiares e impacto nos ativos econômicos etc). Território e infra estrutura social. Políticas públicas. Leis e mercado
A emergência do território • A dimensão espacial, do território, da comunidade e da vizinhança na (re)produçāo da pobreza e vulnerabilidade. Impacto do território sobre a pobreza. Áreas segregadas ampliam e criam pobreza. Parte da pobreza não é explicada por nenhuma variável senão a partir da noção de área • Convicção empírica: áreas de extrema pobreza tem dificuldades maiores para transpor as privações, por conta da operação de múltiplos vetores de destituição que se somam, interagem e se reforçam mutuamente para a reprodução do ciclo de privação.
• A localização territorial da pobreza (territorialização da pobreza) constitui um mecanismo que possibilita ações melhor direcionadas, ao delinear um diagnóstico mais preciso e focalizado. • Captura da diversidade e maior “aderência” aos problemas e necessidades da população. • Politicas públicas precisam considerar diferenças nos territórios para guiar a intervenção: condição para sua efetividade • Estado pode ser tanto o promotor de processos de segregação e degradação de áreas quanto pode mitigar os efeitos do território sobre a pobreza. • Território como base para o conhecimento mais adequado da vulnerabilidade. Mas também importa para desenhar estratégias mais efetivas de intervenção.
• Infra estrutura social (Liz Richardson e Katharine Mumford, 2002): Interação entre dimensões materiais (infra estrutura, bens e serviços) e a organização social para entender processos de degeneração e regeneração de áreas degradadas. • Relação entre declínios de áreas e queda nos mecanismos de controle informais. O papel das normas e dos controles informais para preservação e regeneração de áreas degradadas: Idéia de capital social.
Comunidade / Infra-estrutura social (Liz Richardson e Katharine Mumford, 2002) Serviços e instalações (exemplos) Atividades para jovens Infraestrutura urbana bem conservada Acesso a serviços de maternidade Organização social Normas e controles redes de amizade pequenos grupos
Infra estrutura social • Engloba os serviços públicos e as estruturas de apoio existentes (escolas, unidades de saúde, igrejas, transporte público, área de lazer, meio ambiente saudável, oportunidades de trabalho etc) • Aspectos da organização social: relações de amizade, grupos informais, normas e regras que, conjuntamente, operam como importantes mecanismos de controle social e incidem na formação de padrões de sociabilidade. • Território como conceito geográfico, mas sobretudo relacional. “Espaço vivido”, tramas do cotidiano. Modos de vida. • Território como geografia, mas sobretudo como redes e comunidade(valores, identidades, costumes, comportamentos, etc. ). Território como contexto e condicionante das respostas das famílias.
• Conviver em espaços degradados, com baixa infraestrutura social fragiliza os laços de integração social, desencadeando padrões de sociabilidade que podem ameaçar a boa convivência, ampliando os aspectos de segregação e visões negativas sobre a comunidade. • Estudos empíricos (TORRES E MARQUES, 2004) apontam a relação entre residir em regiões destituídas de infraestrutura física e social e as baixas taxas de escolaridade entre os jovens, altas taxas de desemprego e menores chances de obter emprego formal. Tudo isso acompanhado de outras situações de risco: elevado índice de evasão escolar, gravidez na adolescência, mortalidade infantil, dentre outros. • Os efeitos negativos da pobreza e das situações de vulnerabilidade são amplificados quando ela é espacialmente concentrada. • Territórios vulneráveis e suas causas macro sociais.
• Território como elemento de análise e ação. • Aspectos menos tangíveis, também nos territórios. Necessidade de instrumentos que capturem tais dimensões: sociabilidade, normas e controle social, aspectos de vizinhança, conflitos e divisões internas, dinâmicas sociais. Juntamente com dados sobre existência de serviços, demandas e necessidades de proteção social especial, oferta de ações nos territórios.
Qualificação Profissional Trabalho Infraestrutura Renda: Parâmetro nutricional Dimensões objetivas interrelacionadas Saneamento Transporte Saude Educação TERRITÓRIOS A L P I T L U E D O O S Ã Ã Ç Ç DE TERRITÓRIOS A A Moradia V A V I I D PR PR ACI O O AP M M CO CO E C Dimensões A A E Z Z D psicosociais: E E A R R D B valores, crencas, B R O O E P P IB comportamentos L Dimensões subjetivas: Aspectos sociais e psico sociais Sociabilidade (política e capital social) M Ativos materiais e interação com ativos menos tangíveis
Vulnerabilidade como síntese • Vulnerabilidade geralmente envolve, além da precariedade da renda por um longo período de tempo, necessidades insatisfeitas em múltiplos âmbitos (escolaridade, alimentação, saúde, moradia, trabalho, transporte etc), relações sociais fragilizadas, baixa capacidade de mobilização de ativos e aspectos psico-sociais negativos. Envolve a dupla dimensão da pobreza: privações materiais e privações de ordem subjetiva • Multidimensionalidade, heterogeneidade da pobreza. • Implica pensar políticas de prevenção, mitigação e enfrentamento (ex-ante e ex post)
4. OS DESAFIOS DE CAPTURAR E MENSURAR VULNERABILIDADE E OFERTA DA PROTEÇÃO.
• Para alcançar os objetivos de redução das vulnerabilidades e ampliação da proteção social, a política de assistência deve contar com estratégias e instrumentos de leitura da realidade dos diversos territórios (em vários níveis) e das famílias que ali habitam. Capturar o território por meio dos “números grandes” e dos “números miúdos” (Dirce Koga)
Para identificar vulnerabilidades e proteções • Que aspectos capturar da realidade social dos territórios? E as vulnerabilidades das famílias? Que ativos considerar, tanto das famílias quanto dos territórios? • Como capturar o “menos tangível”? Dimensões de vínculos, isolamento, autonomia, empoderamento. . . E o menos tangível nos territórios? Organização social, capital social. . . • Processo de seleção e construção de indicadores: conceito, dimensões, variáveis, indicadores. . . • Indicadores quantitativos e indicadores qualitativos
• Um indicador social é uma medida em geral quantitativa (mas não exclusivamente), dotada de significado social substantivo, usado para evidenciar, quantificar ou operacionalizar um conceito social abstrato, de interesse teórico (para pesquisa acadêmica) ou programático (para formulação de políticas). • Todo indicador expressa uma maneira de ler a realidade. Podem existir diferentes leituras. Existe embutida em todo indicador uma idéia (ou concepção) do que é mais importante compreender sobre a realidade. • “É preciso refletir para medir e não medir para refletir. ” (Gaston Bachelard) • “Indicador social apenas indica, não substitui o conceito que o originou. ” (Jannuzzi, 2002) • Armadilha: Medir o que é fácil medir.
IDH – Indice de Desenvolvimento Humano ASPECTO VARIÁVEL INDICADOR Vida longa e saudável Longevidade p Esperança de Acesso ao conhecimento Nível educacional p. Taxa de (conhecimento) alfabetização de adultos; p. Taxa de escolaridade bruta combinada Padrão de vida digno Renda p PIB per capita vida ao nascer
IVS (PBH) - considera a exclusão a partir de cinco dimensões de cidadania.
Mapa da Vulnerabilidade Social da população da cidade de São Paulo, 2004 – parte de políticas públicas a) Acesso a serviços e equipamentos públicos b) Qualidade dos serviços c) acesso a serviços básicos (infra estrutura) a) - Distancia média do grid ao ambulatório de baixa complexidade mais próximo - Distancia média do grid ao ambulatório de média ou alta complexidade mais próximo - Distancia média do grid ao ambulatório que oferece atendimento odontológico mais próximo - Distancia média do grid ao ambulatório que oferece pequenas cirurgias mais próximo - Distancia média do grid à Unidade Básica de Saúde mais próxima - Indicador de prioridade para instalação de novas unidades básicas de saúde - Distancia média do grid ao Núcleo Sócio Educativo mais próximo - Indicador de prioridade para instalação de novos Núcleo Sócio Educativo b) - Percentual de professores de 1 a 4 series com licenciatura completa - Percentual de alunos de 5 a 8 séries que estudam em escolas sem bibliotecas c) - Percentual de domicílios sem rede geral de água - Percentual de domicílios sem rede geral de esgoto - Percentual de domicílios sem coleta de lixo
Mapa da Vulnerabilidade Social da população da cidade de São Paulo, 2004 –Indicadores de Alerta risco à infância - Proporção de crianças de 5 a 9 anos não alfabetizadas (também capta informações sobre alfabetização precoce, entre crianças de 5 e 6 anos) - Taxa de internação por doenças infecciosas de veiculação hídrica em crianças de até 5 anos de idade (por 100 mil habitantes deste grupo etário) - Taxa de internação em decorrência de pneumonia em crianças de até 5 anos (por 100 mil habitantes deste grupo etário) risco à juventude - Percentual de mães entre 10 e 19 anos de idade no total de mulheres nessa faixa etária - Percentual de mães entre 10 e 19 anos de idade com até 7 anos de escolaridade, no total de mães jovens - Percentual de filhos de mulheres entre 10 a 19 anos de idade com baixo peso ao nascer (menos de 2, kg), em relação ao total de filhos de mães jovens - Taxa de homicídios entre pessoas de 15 a 29 anos de idade (por 100 mil habitantes deste grupo etário)
• Que tipo e que nível de agregação das informações é necessário para cada ator envolvido na execução da política? (nível território, municipal, regional, estadual, federal) • Tais informações são suficientes e necessárias para que? • Como serão produzidas e utilizadas? Responsabilidades e atribuições, periodicidade, formato de difusão das informações, fluxo?
Os números grandes. . . • Maioria dos municípios brasileiros (cerca de 88% das cidades brasileiras) são de Pequeno Porte II (BRASIL, 2015, p. 20). • Em Minas Gerais, 80% dos municípios são de Pequeno Porte I (675 municípios com menos de 20 mil habitantes) • Em Minas Gerais, 62% dos municípios são considerados “essencialmente rurais e próximos”, totalizando 532 municípios, com 4. 608. 454 de habitantes vivendo nestes municípios. • Outros 51 municípios são classificados como “essencialmente rurais e isolados”. • Somados, estes municípios correspondem a quase 70% dos municípios de Minas Gerais.
Um foco em alguns dos números grandes Município Belo Horizonte Território Metropolitano População Censo 2010 Porte 2. 375. 151 Metrópole CRAS Localização CRAS Independência Urbano/Rural São João del Rei Vertentes 84. 404 Médio CRAS Havaí / Ventosa CRAS Senhor dos Montes CRAS São Sebastião da Vitória Diamantina Alto Jequitinhonha 45. 880 Pequeno II CRAS Palha Rural Prados Vertentes 8. 395 Pequeno I CRAS Coqueiros Rural CRAS Pinheiro Chagas Urbano/periférico Rural Fonte: Relatório de Pesquisa Proteção social, autonomia e território: termos de uma equação necessária para ampliar a efetividade da ação governamental junto às famílias em condição de pobreza extrema. Edital CNPq/MDS 2013. Pesquisa coordenada por Carla Bronzo, FJP, finalizada em 2015.
População de baixa renda, pobre e extremamente pobre referentes aos municípios de Belo Horizonte, Diamantina, São João del Rei e Prados (MG) com base no Censo 2010. Município Belo Horizonte São João del Rei Diamantina Prados População Censo 2010 Porte População de baixa renda (até 1/2 salário mínimo per capita) Estimativa de famílias pobres de baixa renda com perfil CadÚnico (Censo 2010)¹ 2. 375. 151 Metrópole População pobre (até 140, 00 per capita) % Estimativa de famílias pobres perfil BF (Censo 2010)² 135. 415 6% 84. 404 Médio 7. 349 45. 880 Pequeno II 8. 395 Pequeno I População extremamente pobre (até 70, 00 per capita) Beneficiários Bolsa Família % População em extrema pobreza Censo 2010 % 79. 528 3% 30. 914 1% 65. 030 81% 9% 4. 070 5% 1. 291 2% 3. 765 92 % 5. 444 12% 3. 624 8% 2. 964 6% 3. 233 89 % 1. 119 13% 595 7% 213 3% 198 33 % Quanti dade % (em relação de perfil BF) famílias 2015 Fonte: MDS / Matriz de Informação Social. Informações Municipais. Censo 2010; ¹ A estimativa de famílias pobres com perfil CadÚnico (baixa renda) é calculada com base nos dados do Censo IBGE e em coeficientes de volatilidade de renda, levando em consideração a renda per capita de até 1/2 salário mínimo ² É a quantidade estimada de famílias pobres com perfil de atendimento para o Bolsa Família, calculada a partir dos dados do Censo Demográfico 2010, levando em consideração a renda familiar de até R$ 140, 00 por pessoa, acrescida de um coeficiente de volatilidade.
Quantidade de participantes por faixa-etária do Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV), agosto/2014 CRAS Município Localização 0 a 6 anos 7 a 14 anos 15 a 17 anos Adultos Idosos CRAS Independência* Belo Horizonte Urbano 72 0 0 _ 66 CRAS Havaí / Ventosa* Belo Horizonte Urbano 60 0 0 _ 41 CRAS Palha Diamantina Rural 7 30 16 26 3 CRAS S. Sebastião São João del da Vitória Rei Rural 50 36 0 28 31 CRAS Senhor dos Montes São João del Urbano / Rei Rural 40 55 34 45 32 18 10 108 56 72 17 13 0 20 0 CRAS Pinheiro Chagas Prados Urbano Periférico CRAS Coqueiros Prados Rural Fonte: BRASIL, MDS, Censo SUAS 2014 * Os dados referentes ao CRAS Independência e CRAS Havaí / Ventosa foram retirados do Sistema de Registro de Atendimentos (RMA), pois as informações do Censo SUAS 2014 atinentes a esses dados estavam em branco.
Total de famílias em acompanhamento pelo PAIF segundo dados do Registro Mensal de Atendimentos (RMA). Referência: agosto/2014 CRAS Município Total de famílias Famílias em em Famílias situação Localização acompanhamento beneficiárias de extrema pelo PAIF Bolsa Família pobreza ago/2014 CRAS Independência Belo Horizonte Urbano 215 6 7 CRAS Havaí / Ventosa Belo Horizonte Urbano 255 6 7 CRAS Palha CRAS São Sebastião da Vitória Diamantina Rural 120 0 7 São João del Rei Rural 240 3 34 CRAS Senhor dos Montes São João del Rei Urbano / Rural 921 2 12 Prados Urbano Periférico 36 1. 787 0 17 2 69 CRAS Pinheiro Chagas Total Fonte: BRASIL. MDS, Registro Mensal de Atendimentos dos CRAS - RMA. Ano: 2014
E os “números miúdos” ou os sentidos da vulnerabilidade • Um vídeo curto de pequenos relatos: famílias em Diamantina
• O distrito de São Sebastião da Vitória, de São João Del Rey, é cortado pela BR e o CRAS se situa na margem da rodovia. Na vizinhança, não se vê miséria ou pobreza intensa. Mas se vê ociosidade e ausência de oportunidades. Ali a escolaridade é maior, bem como é menor a condição de pobreza. Entretanto, nesse distrito ficou evidente a realidade do desemprego e do emprego precário, como também a ausência de oportunidades diversas. • A área tem forte presença do trabalho agrícola, em grandes fazendas da região, que usam maquinário moderníssimo, grande e pesado. As pessoas trabalham nessas grandes lavouras sem carteira assinada e existem denúncias de que algumas mulheres recebem apenas quatro reais por dia de trabalho. • Não se tem oferta de cursos, de qualificação ou formação, como não se tem atividades culturais ou esportivas na cidade. Está presente nesse território o problema das drogas e do alcoolismo; da exploração do trabalho e da falta de trabalho e de oportunidades.
• O território do CRAS Palha, em Diamantina, também pode ser caracterizado como de infra estrutura social precária, pela ausência de uma rede de serviços e oferta de oportunidades reais para as famílias atendidas. O CRAS atende as famílias do bairro Palha principalmente, localizado em um bairro periférico da cidade. • O território do CRAS Palha é marcado por distintas vulnerabilidades. Precárias condições de urbanização, presença de situações de criminalidade, violência e tráfico de drogas. Tal como o território de São Sebastião da Vitória, Diamantina não oferece muitas oportunidades de atividades culturais ou esportivas para os jovens da região, nem no município e tampouco nos distritos.
• Também o território do Independência, em Belo Horizonte, pode ser descrito como um território com uma infra estrutura social frágil, dada a escassez da rede de serviços e de condições urbanas e de saneamento ainda precárias. O bairro é carente de estrutura de saneamento em algumas áreas, tem problemas de transporte, poucos equipamentos de saúde e uma rede precária de serviços na região. • O território tem apresentado alterações significativas ao longo dos treze anos de existência do CRAS (que já existia antes no território como NAF, Núcleo de Atenção à Família), sendo que a presença da criminalidade e do tráfico de drogas constituem as mudanças mais visíveis e impactantes.
• Em todos os territórios tem-se a presença de vulnerabilidades diversas, com maior presença da insegurança alimentar em algumas zonas rurais e a presença cada vez mais intensa dos problemas drogas e criminalidade nos territórios dos CRAS urbanos; situação também presente, com menor incidência, nos territórios rurais. • Precariedade da infraestrutura urbana mistura-se com fragilidades da infraestrutura social. Situações de abuso sexual, alcoolismo e drogadição, violência doméstica e gravidez precoce constituem principais vulnerabilidades enfrentadas nos territórios da proteção básica, não apenas no espaço urbano, mas também rural.
Desafios que os números grandes e miúdos espelham: dados para que? • Sobre os registros dos sistemas pelos “técnicos da ponta” • Pouca diferenciação, nos registros do CRAS, entre os serviços do PAIF e do Serviço Convivência e Fortalecimento Vínculos/SCFV. • Disparidade entre os registros e a realidade. Pouca importância conferida ao processo de produção de informação? Não compreensão das diretrizes (acompanhamento, atendimento. . . )? Percepção de que as atividades meio prejudicam o desenvolvimento do trabalho social com famílias (“burocracia mata o social”)? • Sobre avaliação de efeitos • Como avaliar resultados da política, para além das metas de produtos? • Dificuldades para mensurar objetivos de natureza menos tangível, como é o caso do fortalecimento de vínculos ou da produção de efeitos nos aspectos de natureza psicossocial. • Que efeitos são esses? Como podem ser operacionalizados e mensurados?
Desafios que os números grandes e miúdos espelham: redes frágeis ou inexistentes • A proteção social para famílias pobres ou socialmente vulnerabilizadas depende de redes de serviços, com capacidade para atendê-las com qualidade. • E quando não se tem oferta de serviços? Quando se tem uma estrutura de oportunidades ou infra estrutura social precária nos territórios de abrangência, com redes socioassistenciais inexistentes ou inadequadas? • As condições da oferta, a variedade e a adequação dos serviços disponíveis são heterogêneas, mas bastante precárias, no geral. • Na prática, isso irá requerer a atuação consistente dos agentes públicos sobre as condições de oferta, de forma a criar uma estrutura de oportunidades que respondam por mudanças nos padrões de vulnerabilidade social.
Desafios que os números grandes e miúdos espelham: prevenção em contextos violação direitos • Ofertar serviços de caráter preventivo em territórios de extrema vulnerabilidade e para famílias que vivenciam situações de violação de direitos. Como prevenir situações de privações e inseguranças, se os usuários já vivenciam problemas e situações de violações de direitos? Que meios os CRAS encontram para fornecer respostas adequadas? • Sistema de Notificações de Violação de Direitos e os desafios de sua operacionalização
Desafios que os números grandes e miúdos espelham: integralidade, intersetorialidade e direitos • O trabalho de prevenção fica comprometido quando se enfrenta situações onde a violação está presente, misturada a uma carência de itens tão básicos, como alimento, educação, saúde e moradia adequada. • O reconhecimento do papel limitado dos serviços socioassistenciais diante de privações intensas, materiais e de recursos emocionais que marcam a existência da maioria das famílias atendidas. • Os limites do trabalho social e o imperativo da intersetorialidade e da construção de uma estratégia integral de proteção social, que envolva outros setores e políticas. • Um desafio central: Reconhecimento de critérios político –normativos para definição das necessidades sociais, o que remete a direitos, que não permite gradações.
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