RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO AMBIENTAL Direito Ambiental DEF
RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO AMBIENTAL Direito Ambiental (DEF 0566) Profa. Ana Maria Nusdeo Monitor: Arthur P. O. Balbani (arthur. balbani@usp. br)
Responsabilidade Civil – Noções Gerais Pressupostos da responsabilidade civil: dano + “conduta lesiva” + nexo de causalidade + elemento subjetivo da conduta (dolo/culpa dispensável em alguns casos) Dano: prejuízo causado pelo agente a alguém (“para o dano patrimonial, o regime da reparação, e para o dano à pessoa, o regime da compensação” (FACHIN, Responsabilidade Civil Contemporânea, p. 11)) Conduta lesiva: ação ou omissão, lícita ou ilícita, que cause dano a outrem Nexo de causalidade: vínculo entre conduta e resultado, apurada faticamente, indicando a relação de causa e efeito entre a conduta lesiva e o dano observado. Elemento subjetivo: dolo ou culpa (imprudência/imperícia/negligência) pouco importante em matéria de dano ambiental, mas importante para as demais espécies de responsabilidade civil.
Responsabilidade Civil – Noções Gerais Objetivo: condenação PECUNIÁRIA ou REPARAÇÃO DO DANO CAUSADO Não há privação da liberdade (cadeia, etc. ) natureza civil, não criminal
Legislação Civil Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. Art. 188. Não constituem atos ilícitos: I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido; II - a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente. Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo. Art. 927. Aquele que, por ato ilícito ( arts. 186 e 187 ), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Responsabilidade civil: entre a teoria e a prática Teoria Prática
Dano Enneccerus: “toda desvantagem que experimentamos em nossos bens jurídicos, do que resulta o direito a uma reparação em pecúnia sempre que decorrente da conduta de outrem” Pretérito (já ocorreu), atual (“está ocorrendo”) ou futuro (ainda não ocorreu, mas é certo que ocorrerá) Dano moral Dano material (prejuízo sofrido diretamente ou aquilo que se deixou de ganhar)
Exemplo prático Responsabilidade Civil - Dano (1) A pessoa “A” tem um imóvel e deseja vendê-lo a “B” por R$100. 000, 00. A Prefeitura Municipal manifesta o desejo de desapropriar aquele terreno (ou seja, “tomá-lo para si”). O negócio entre “A” e “B” não se concretiza. Posteriormente, a Prefeitura volta atrás e decide não desapropriar o terreno. Neste interim, o imóvel passa a valer R$200. 000, 00. A conduta da Prefeitura causou dano à A?
Conduta lesiva Origem: ação ou omissão do agente lesivo (atenção: sempre levar em consideração o ponto de vista do agente e não do lesado). Licitude: não é elemento da conduta. É possível que o dano se origine de conduta lícita (ex: obra pública que desvaloriza imóvel) ou de conduta ilícita (ex: erro médico) Dano deve ser consequência desta conduta
Exemplo prático Responsabilidade Civil – Conduta Lesiva (1) Mulher grávida dá entrada em hospital com quadro de pré-eclâmpsia, necessitando de cirurgia cesariana com extrema urgência. A informação não é registrada na ficha hospitalar. No hospital, além desta pessoa, há outras sete mulheres grávidas, todas próximas de entrar ou que já entraram em trabalho de perto. O único médico plantonista no Pronto Socorro constata o quadro clínico da autora e imediatamente a encaminha para cirurgia. Em virtude da demora, o feto morre por sofrimento fetal. A conduta do médico pode ser considerada lesiva, para fins de responsabilidade civil, uma vez que houve demora no atendimento?
Nexo de causalidade: teorias informativas Teoria da equivalência das condições: não distingue causa, condição ou ocasião. Tudo o que concorrer para o resultado é causa dele (Welzel: “toda condição que não pode ser mentalmente suprimida sem que com ela desapareça o efeito, é causa). Problema: regresso ao infinito (qualquer um que se insere na linha causal pode ser considerado como causador do resultado) Não distingue a relevância dos fatos na cadeia causal Ex: Desastre Aéreo de Tenerife (explosão de bomba em aeroporto + nevoeiro + comunicação confusa dos controladores de tráfego aéreo + ausência de radar de solo no aeroporto + treinamento inadequado da tripulação da KLM).
Nexo de causalidade: teorias informativas Teoria da causalidade adequada: a causa será o antecedente necessário e adequado à produção do resultado, de acordo com a experiência comum Busca, dentre todos os fatores sem os quais um dano não teria ocorrido, daqueles que são determinantes (causas), que se diferenciam daqueles que são meras condições. Teoria dos danos diretos e imediatos (ou teoria da interrupção do nexo causal): nem todo fator que alcança o evento dano é causa do dano Nem todas as condições que interferem no resultado são causas necessárias. A causa necessária é a que explica o dano. O último antecedente deve ser adequado para caracterizar o dano. Ex: engenheiro comete falha na instalação elétrica de um prédio, o que resulta em um “apagão”. Em decorrência deste apagão, terceiros invadem o prédio e furtam grande quantia de dinheiro do cofre de um dos proprietários, que, em virtude do desfalque financeiro, pede falência e lesa seus clientes.
Exemplos práticos – Responsabilidade Civil (1) Mulher grávida realiza teste de gravidez de farmácia, que acusa resultado positivo, e compra todo o enxoval do bebê. Sem realizar o pré-natal ou qualquer outro exame que comprovasse a gravidez, acredita estar grávida. Próximo da data que deveria dar à luz, se encaminha ao hospital e, ao fazer ultrassom, descobre não estar grávida. Há dever de indenizar do fabricante do teste? (2) Motociclista dirigindo embriagado e acima da velocidade no acostamento de rodovia que colidiu com caixa d’água que caiu de caminhão. Há dever de indenizar por parte da concessionária da rodovia? (3) Paciente recém-operada de cirurgia na bacia, com implantação de pinos para fixação óssea, que, em sendo enfermeira, se automedicou com potente anestésico e foi dançar forró logo após a cirurgia, o que provocou o agravamento de seu quadro clínico e a necessidade de nova cirurgia. Há dever de indenizar do médico?
Rompimento do nexo causal (“excludentes de responsabilidade”) Culpa exclusiva da vítima Ato/fato de terceiro Força maior Caso fortuito (interno/externo)
Resumo da responsabilidade civil Dano Conduta lesiva Nexo de causalidade Elemento subjetivo • Prejuízo causado à vítima • Agente: aquele que será responsabilizado • Deve ser adequada à provocação do dano • Vínculo entre dano e conduta lesiva • Pode ser desnaturado por excludentes • Apenas na responsabilidade subjetiva • Dolo/culpa
Responsabilidade civil (esquema) Elemento subjetivo Conduta lesiva Dano Culpa exclusiva da vítima Ato/fato de terceiro Nexo de causalidade Excludentes de responsabilidade Força maior Caso fortuito
Responsabilidade Civil por Dano Ambiental Marga Tessler: “o nexo causal [. . . ] apresenta novas e grandes dificuldades, pois em geral são muitas as fontes poluidoras. Aplica-se então a ideia da indivisibilidade do dano e da solidariedade dos agentes, pois se trata de uma questão que só quem domina a técnica de produção tem condições de estabelecer” (Teoria Geral da Resp. Ambiental, p. 8) Dano: deve ser certo (ou seja, não pode ser meramente hipotético) e atual (que já existe ou já existiu) ATENÇÃO: também se admite a reparação pelo dano futuro, ou seja, que, a despeito de não existir no momento presente, pode ser suscetível de avaliação quando da propositura da ação.
Constituição Federal Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações. § 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
Política Nacional do Meio Ambiente (Lei n° 6. 938/81) Art. 14 - Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores: § 1º - Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.
Dano Ambiental Morato Leite: “toda lesão intolerável causada por qualquer ação humana ao meio ambiente, diretamente, como macrobem de interesse da coletividade, e indiretamente, a terceiros, tendo como vista interesses próprios e individualizáveis e que refletem no macrobem”. Édis Milaré: “não só as interferências graves, mas qualquer perturbação, desde que prejudicial ao meio ambiente, deve ser considerada, tendo em vista, por exemplo, que muitas emissões, a priori inocentes, podem apresentar extraordinário potencial poluidor, em razão de seus efeitos sinergéticos”. IMPORTANTE: (i) pode se originar de ato lícito; (ii) não precisa ter ocorrido (“dano futuro” ou “dano potencial”); (iii) contempla os “danos por ricochete” (danos individuais operados por intermédio do dano ao meio ambiente)
Sujeito passivo da responsabilidade civil ambiental (1) Responsabilidade concorrente: Estado + particular, pois é dever do Estado proteger o meio ambiente e defender a ecologia (nesse caso, o Estado responde por omissão) (2) Responsabilidade principal do Estado: art. 225, CF direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. O Estado responde tanto como agente poluidor como na forma da omissão no dever de proteger o meio ambiente.
Sujeito passivo da responsabilidade civil ambiental (3) Natureza da responsabilidade do agente agressor Regra geral: responsabilidade objetiva, diante de previsão legal expressa (art. 14, § 1°, Lei PNMA). Edis Milaré: responsabilidade objetiva “melhor atende aos anseios da comunidade de fruir a um meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado” Exceção: responsabilidade subjetiva (exige comprovação de dolo/culpa), nos casos em que (i) a atividade não era proibida e (ii) o agente agiu naturalmente, sem intenção de causar dano ao meio ambiente [“culpa aquiliana”, ou seja, inobservância de um dever geral de cuidado] DOUTRINA MINORITÁRIA (Rui Stoco) Alvaro Villaça: responsabilidade objetiva impura o Estado responderia pelos atos culposos de seus agentes, se autorizar a atividade e não fiscalizá-la.
Teorias da Responsabilidade Civil Ambiental Teoria do Risco Integral: não admite causa excludente de responsabilidade, tornando irrelevante a força maior e o caso fortuito, e dispensando o próprio nexo de causalidade. Elementos constitutivos: dano + conduta lesiva Superior Tribunal de Justiça (STJ) entende ser a teoria aplicável em matéria ambiental, diante do princípio do poluidor-pagador. Problema: secas de verão provocando incêndio em propriedade privada; raio que atinge propriedade e destrói vegetação nativa; caso da usina de Fukushima “É firme a jurisprudência do STJ no sentido de que, nos danos ambientais, incide a teoria do risco integral, advindo daí o caráter objetivo da responsabilidade, com expressa previsão constitucional (art. 225, § 3º, da CF) e legal (art. 14, § 1º, da Lei n. 6. 938/1981), sendo, por conseguinte, descabida a alegação de excludentes de responsabilidade, bastando, para tanto, a ocorrência de resultado prejudicial ao homem e ao ambiente advindo de uma ação ou omissão do responsável. ” (REsp 1. 175. 907 -MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão)
Teorias da Responsabilidade Civil Ambiental Teoria do Risco Agravado: responsabilidade objetiva, porém cuja atividade “lesiva” desenvolvida contém ínsita a si um potencial lesivo (o fortuito externo vira fortuito interno, não servindo para a exclusão do nexo) Fortuito interno: Causas ligadas à conduta humana e que não justificariam a exclusão da responsabilidade, relacionadas aos riscos da atividade desenvolvida (cancelamento de voo por nevasca; fraude em cartão de crédito) [RISCO PREVISÍVEL] Fortuito externo: Fato imprevisível e inevitável, resultando de fatos estranhos ao desempenho da atividade (assalto à mão armada no interior de ônibus coletivo) [RISCO IMPREVISÍVEL]
Teorias da Responsabilidade Civil Ambiental Teoria (Mitigada) do Risco: a comprovação do nexo causal é suficiente para delimitar a responsabilidade civil ambiental, PORÉM este pode ser desconstituído por excludentes de responsabilidade Fortuito externo: Fato imprevisível e inevitável, resultando de fatos estranhos ao desempenho da atividade (assalto à mão armada no interior de ônibus coletivo) [RISCO IMPREVISÍVEL] Fato de terceiro: Comportamento imprevisível e inevitável de terceiro estranho que exclui a responsabilidade pelo dano causado (terceiro estranho = sem ligação com o causador do dano e com o lesado)
Reparação do dano ambiental Obrigação de não-fazer = cessar a atividade poluidora/lesiva ao meio ambiente Obrigação de fazer = Retorno ao status quo ante: ideal, porém, por vezes, irrealista (ex: poluição atmosférica) Obrigação de dar = Indenização em dinheiro: sanção pecuniária, destinada a fundo especial e que tem por objetivo reparar o prejuízo
Prescrição da ação reparatória STJ: entendimento dominante de que a ação reparatória por dano ambiental é imprescritível (ou seja, pode ser ajuizada a qualquer tempo) STF: não há posição definida (reconhecida repercussão geral, mas sem julgamento). Problema: Tema 666 de Repercussão Geral entendeu que a reparação por ilícito civil, em face da Fazenda Pública, prescreve em cinco (05) anos. Termo inicial: ocorrência do dano ambiental ou sua efetiva ciência (actio nata)?
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