RENASCIMENTO DO NORTE Regio de Vneto Norte da

RENASCIMENTO DO NORTE

Região de Vêneto, Norte da Itália.

Região de Flandres, Norte da Bélgica.

Na Itália, a Renascença constituiu um ressurgimento e uma redescoberta dos ensinamentos e das culturas antigas, que não eram, entretanto, tão relevantes para os europeus do norte, para os quais as representações da mitologia clássica eram muito mais raras.

O Renascimento do Norte foi inspirado pela Reforma Protestante, que trouxe consigo um interesse renovado pela representação da imagem humana e por retratar o mundo visível de forma realista.

A PENITÊNCIA DE SÃO JERÔNIMO Lucas Cranach, O Velho, 1502

O MARTÍRIO DE SANTA BÁRBARA Lucas Cranach, O Velho, 1510

Os artistas do norte ficaram impressionados com os resultados obtidos pelos italianos e Albrecht Dürer (1471 -1528) dedicou boa parte de seu tempo e esforços escrevendo dois tratados sobre geometria, A ARTE DA MEDIÇÃO (1525) e PROPORÇÃO HUMANA (1528).

ESTUDO DE MÃOS Albrecht Dürer, 1506

MÃOS DE UM DISCÍPULO Albrecht Dürer, 1506

Muito antes disso, contudo, artistas do norte da Europa já haviam alcançado um sucesso considerável ao produzirem representações naturalísticas da forma humana.

RETRATO DE MULHER EM CHAPÉU DE PONTA Rogier Van Der Weyden, 1435

CASAL ARNOLFINI Jan Van Eyck, 1434 National Gallery, Londres, Reino Unido

Os artistas do norte buscavam um naturalismo quando representavam o mundo físico, de cenas de interiores e paisagens a naturezas-mortas e estudos da fisionomia humana.

Eles foram reconhecidos sobretudo pela habilidade de retratar detalhes microscópicos, como a textura de um casaco de pele ou dos metais, ou, ainda, reflexos exatos em superfícies espelhadas.

A VIRGEM E O MENINO Lucas Cranachi, O Velho, 1540

COROAÇÃO DE CRISTO COM ESPINHOS Hieronymus Bosch, 1495

Os nórdicos tiveram contato e conheciam as regras de perspectiva dos italianos, mas buscaram uma diferenciação de representação por meio da quebra de determinados fundamentos.

As paisagens não almejavam a realidade. Empregava-se uma forma dúbia de perspectiva: a cena como um todo é vista de um lugar elevado, de modo que o horizonte está mais alto e o espectador pode ver uma paisagem profunda.

PAISAGEM COM SÃO JERÔNIMO Joachim Patinir, 1517

Ao mesmo tempo, pessoas, árvores e construções são retratadas de frente, como se estivessem no mesmo nível do espectador.

BATISMO DE CRISTO Joachim Patinir, 1515

CARONTE ATRAVESSANDO O ESTIGE Joachim Patinir, 1530

Pieter Bruegel, o Velho, contribuiu com a maior parte do estímulo para o desenvolvimento da pintura de paisagens. As cenas por ele retratadas em suas séries superam tudo o que já havia sido criado. Em especial, a diagonal ousada do sulco coberto de neve que conduz o olhar do espectador para a parte baixa do vale em CAÇADORES NA NEVE (JANEIRO).

CAÇADORES NA NEVE (JANEIRO) Pieter Bruegel, o Velho, 1565

As guildas se desenvolviam na época e eram associações econômicas das populações rurais que se capacitavam profissionalmente, descobrindo um novo modo de ganhar a vida. Suas características sociais e culturais passaram a se confundir com a própria cidade. (Ferrara, 1993, p. 203)

Tendo a produção e a habilidade como núcleo do cotidiano, a guilda era a demonstração de uma vida comunitária que tinha seu estilo, suas crenças e religião marcados, até hoje, nos vitrais, rosáceas e murais de seus monumentos. (Ferrara, 1993, pp. 203 -206)

Essa corporação do trabalho organizava-se pela competência e disciplina, mas identificava-se pelas insígnias da sua profissão: a necessidade de mediar, pela linguagem, o reconhecimento do trabalho como objeto de classificação social. (Ferrara, 1993, p. 206)

O rigoroso apego à ordem e à disciplina deu origem a uma pesada estrutura hierárquica burguesa, que tinha a riqueza como elemento de destaque: estava preparado o terreno para outra imagem urbana medieval que se transformou e se prolongou até hoje: o carnaval. (Ferrara, 1993, p. 206)

O carnaval permite a exibição de uma das suas características mais básicas na praça: o rompimento da distinção entre ricos e pobres, popular e erudito, particular e público, para criar um momento em que tudo ocorre ao ar livre, na praça ou na rua. (Ferrara, 1993, p. 210)

Com o seu desenvolvimento, a imagem urbana carnavalesca do caos e da desordem se aprofunda e se torna mais complexa. A praça já não é, apenas, o espaço público, mas o palco onde se dramatiza a inversão: ‘o mundo de cabeça para baixo’. (Ferrara, 1993, p. 211)

A BATALHA ENTRE O CARNAVAL E A QUARESMA Pieter Bruegel, o Velho, 1565

O Renascimento do norte foi moldado por outro elemento importante: a difusão da gravura. A gravação foi uma invenção alemã atribuída a Johannes Gutenberg e era usada em várias cidades pioneiras do país.

O desenvolvimento de imagens impressas foi uma dádiva para os artistas, que agora podiam vender suas próprias gravações (primeiro em xilogravuras, partindo para gravação em cobre) em mercados e feiras e, no processo, construir uma reputação.

A VIRGEM COM O MENINO E SANTA ANA Albrecht Dürer, 1501

SÃO EUSTÁCIO Albrecht Dürer, 1514

MELANCOLIA I Albrecht Dürer, 1514

Com os conflitos da Reforma Protestante, o mercado de altares e imagens de santos entrou em declínio no norte da Europa por conta da revolução religiosa. Temas morais e religiosos eram tratados com mais discrição.

Artistas como Hieronymus Bosch e Bruegel preferiram se ater à loucura humana e à mitologia, em obras como O ÍCARO (1558). JARDIM DAS DELÍCIAS (1505) e QUEDA DE

Bosch provou que as tradições e realizações da pintura que tinham sido desenvolvidas para representar a realidade do modo mais convincente, podiam ser invertidas, resultando em uma imagem igualmente plausível de coisas que nenhum olho humano jamais vira. (Gombrich, 1987, p. 309)

O JARDIM DAS DELÍCIAS (FECHADO) Hieronymus Bosch, 1505

JARDIM DAS DELÍCIAS Hieronymus Bosch, 1500 -1505

A QUEDA DE ÍCARO Pieter Bruegel, o Velho, 1558

OS SETE PECADOS CAPITAIS Hieronymus Bosch, 1480

O "gênero" de pintura em que Bruegel se concentrou foram cenas da vida camponesa. Pintou aldeões divertindo-se, em festejos, no trabalho, e, por isso, as pessoas acabaram pensando que ele era um dos camponeses flamengos. (Gombrich, 1987, p. 309)

PROVÉRBIOS HOLANDESES Pieter Bruegel, o Velho, 1559

Tons frios Matar dois coelhos numa cajadada só Não sabe se vai ou se vem Cores quentes saindo do ocre em escala, jogo de luz e Não conte sombra Agora que a porca torce o rabo com as galinhas antes de chocarem Dar cabeçadas Atirar dinheiro fora Perspectiva Duas caras É bom ter amigos em Chover toda parte no molhado É preciso Ela veste dois para o marido haver um com uma mexerico capa azul Por uma barba de estopa em Nosso Senhor Tirar a sorte no ossinho Colocar uma pedra no caminho Não consegue Chorar viver do seu sobre o orçamento leite derramado Provérbios Holandeses

A TORRE DE BABEL Pieter Bruegel, o Velho, 1563

Outros artistas tiveram o cuidado de disfarçar os temas religiosos. A FUGA PARA O EGITO (O MERCADO DE CARNES) está completamente escondida na imagem de uma barraca de mercado público. Essa abordagem dissimulada se tornou uma característica do maneirismo, que substituiu a Renascença.

A FUGA PARA O EGITO (O MERCADO DE CARNES) Pieter Aertsen, 1555

O museu Carrières de Lumières, em Les Bauxde-Provence, no sul da França, instalado em uma mina desativada, atualmente abriga a exposição audiovisual O fantástico e maravilhoso mundo de Bosch, Brueghel e Arcimboldo.

O FANTÁSTICO E MARAVILHOSO MUNDO DE BOSCH, BRUEGHEL E ARCIMBOLDO Carrières de Lumière, 2017

O FANTÁSTICO E MARAVILHOSO MUNDO DE BOSCH, BRUEGHEL E ARCIMBOLDO Carrières de Lumière, 2017

O FANTÁSTICO E MARAVILHOSO MUNDO DE BOSCH, BRUEGHEL E ARCIMBOLDO Carrières de Lumière, 2017

As obras dos três artistas são apresentadas a partir de novos enquadramentos, projetados nas paredes e chão das alas do museu, criando um ambiente imersivo para o visitante. A exposição continuará aberta ao público até janeiro de 2018.

As obras dos três artistas são apresentadas a partir de novos enquadramentos, projetados nas paredes e chão das alas do museu, criando um ambiente imersivo para o visitante. A exposição continuará aberta ao público até janeiro de 2018.

PINTURA E CINEMA

“Eisenstein ao criar o termo Cinematismo, procura estabelecer a relação entre o cinema com as outras artes e tenta constatar que a obra de El Greco já desenvolvia princípios que estariam presentes no cinema mais tarde”.

Buscava associar a montagem cinematográfica (meio de reunir sobre a tela fragmentos de um fenômeno, filmado em diversas dimensões e pontos de vistas) às pinturas de El Greco, nas quais os elementos que compõem a sua obra também são fragmentos.

ENTERRO DO CONDE DE ORGAZ El Greco, 1588

O quadro é dividido em duas metades, a de baixo, representando a parte terrestre com o corpo do Conde sendo sepultado por Santo Agostinho e São Estevão, observados por um conjunto de nobres. A criança que aponta para o enterro, em primeiro plano, é o filho de El Greco.

ENTERRO DO CONDE DE ORGAZ (detalhe) El Greco, 1588

A metade superior, nos mostra o céu onde, no topo, está Jesus Cristo, a esquerda a Virgem Maria e a direita vários santos, entre eles São João e São Tomás. Estão, ainda, representados figuras do antigo testamento como Moisés, David e Noé.

ENTERRO DO CONDE DE ORGAZ (detalhe) El Greco, 1588

Ligando as duas partes, está a alma do morto representada por uma criança levada para céu por um anjo.

ENTERRO DO CONDE DE ORGAZ (detalhe) El Greco, 1588

Os fragmentos que compõem a obra são dispostos uns ao lado dos outros, gerando uma composição dinâmica, onde o olhar passeia. Há, nas pinturas, uma forma de conceber a iluminação cinematográfica pela relação de cores, contraste entre luz e sombra, como forma de chamar atenção para um motivo da cena.

BATISMO DE CRISTO El Greco, 1608

ANUNCIAÇÃO El Greco, 1608

Todo plano, assim como um quadro, tem uma composição. O fundo pode sugerir uma profundidade, onde ações paralelas podem ocorrer, dando a opção ao espectador de escolher qual ação irá detalhar com seus olhos.

A composição sugere também diferentes alternativas, conforme a disposição das personagens os objetos em cena. No primeiro cinema, o que era mostrado pela câmera dispunha de uma sequência linear, agora há uma multiplicidade de pontos de vistas, dado pela possibilidade de fragmentação da imagem.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS FERRARA, Lucrécia D’Aléssio. Olhar periférico: informação, linguagem, percepção ambiental. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1993. GOMBRICH, Ernst Hans. História da Arte. Rio de Janeiro: Zahar, 1981. MACHADO, Arlindo. O sujeito na tela. São Paulo: Paulus, 2007.