O NASCIMENTO DA SOCIOLOGIA BRASILEIRA Flavio Thales Ribeiro
O NASCIMENTO DA SOCIOLOGIA BRASILEIRA Flavio Thales Ribeiro Francisco Email: flavio. thales@ufabc. edu. br
Etapas da sociologia ■ A Herança Histórico-cultural da Sociologia ■ Período dos Pensadores Sociais ■ Período da Sociologia de Cátedra ■ Etapa Contemporânea da Sociologia ■ Período da Sociologia Científica ■ Período de Crise e Diversificação
Período dos pensadores sociais ■ O período dos Pensadores Sociais, também chamado por alguns autores de período pré-científico, corresponde historicamente ao período que se estende das lutas pela Independência das nações latino-americanas até o início do século XX. ■ Durante esse período a elaboração de teoria social tendeu a ser desenvolvida por pensadores e mesmo homens de ação (políticos), sob a influência de ideias filosófico-sociais européias ou norteamericanas como, por exemplo, o iluminismo francês, o ecletismo de Cousin, o positivismo de Comte, o evolucionismo de Spencer e Haeckel, o social-darwinismo americano de Sumner e Ward e o determinismo biológico de Lombroso.
Questões do período ■ Sob as influências desses autores buscava-se equacionar duas problemáticas centrais – a formação do Estado nacional brasileiro, opondo liberais e autoritários, e a questão da identidade nacional, tendo como núcleo a questão racial opondo os que sustentavam uma visão racista e os inspirados pelo relativismo étnico-cultural.
NINA RODRIGUES E O PROBLEMA DA RAÇA
MANUEL QUIRINO
JOÃO BATISTA LACERDA
O período da Sociologia de Cátedra ■ O período da Sociologia de Cátedra iniciou-se nos países latino-americanos em fins do século passado, quando cátedras de Sociologia foram introduzidas nas Faculdades de Filosofia, Direito e Economia. ■ No Brasil, esse período teve início em meados da década de vinte, quando foram criadas as primeiras cátedras de Sociologia em Escolas Normais (1924 -25), enquanto disciplina auxiliar da pedagogia, dentro do esforço democratizante do movimento reformista pedagógico que tem sua expressão maior no movimento da Escola Nova. ■ Neste momento, ocorreu a proliferação de publicações como os manuais e coletâneas para o ensino de Sociologia, os quais procuravam divulgar as ideias de cientistas sociais europeus e norte-americanos renomados, tais como Durkheim e Dewey
Fatores para a consolidação da Sociologia ■ a origem da consolidação da Sociologia na mesma deve ser procurada, não em uma única causa determinante, senão em múltiplas causas que estão estreitamente ligadas, sendo possível distingui-las unicamente para fins analíticos. ■ A multiplicidade de fatores decorrentes dos contatos, conflitos e acomodações de povos e culturas diversas; o contraste entre as sociedades em mudança e as culturas de folk remanescentes em toda a vasta extensão territorial; a variedade de paisagens culturais e a contemporaneidade ou justaposição nas realidades concretas, de séculos ou de “camadas históricas”, deveriam certamente sacudir a atenção e despertar o interesse pelo estudo científico dessas realidades sociais vivas e atuais, postas sob os olhos de todos e que não escaparam, pela intensidade dos fenômenos, aos observadores menos atentos.
A Etapa Contemporânea da Sociologia no Brasil ■ O início do período da Sociologia Contemporânea corresponde à fase de emergência da Sociologia Científica, que buscava, sob a égide do paradigma estrutural-funcionalista, a consecução de um padrão de institucionalização e prática do ensino e da pesquisa em sociologia, similar ao dos centros sociológicos dos países centrais. ■ A concepção de desenvolvimento desta abordagem teve sua expressão na Teoria da Modernização e em sua análise do processo de transição da sociedade tradicional para a sociedade moderna
O período da Sociologia Científica ■ A institucionalização acadêmica da Sociologia no Brasil ocorreu em meados da década de 1930, com a criação da Escola Livre de Sociologia e Política de São Paulo (1933) e com a criação da Seção de Sociologia e Ciência Política da Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo (1934). ■ As tentativas, de relacionar o ensino e a pesquisa em Sociologia, ainda que limitadas e parciais em ambas as instituições, demarcam o início da chamada etapa da Sociologia Científica, a qual viria a ter seu apogeu em fins dos anos de 1950.
Institucionalização da sociologia ■ É interessante destacar que a primeira experiência de institucionalização da Sociologia e da Ciência Política no ensino superior no Brasil, ocorrida na Escola Livre de Sociologia e Política de São Paulo, criada pela elite paulista no contexto da derrota da Revolução Constitucionalista de 1932, tinha por objetivo, como explicitado no Manifesto da Fundação da Escola, suprir a falta de “uma elite numerosa e organizada, instruída sob métodos científicos, a par das instituições e conquistas do mundo civilizado, capaz de compreender antes de agir o meio social em que vivemos”
Industrialização e modernidade (novas classes) ■ O primeiro surto industrial, em 1918, em consequência da guerra mundial, as transformações da estrutura econômica e social que daí resultaram, e a revolução de 1930 que, provocada por essas mudanças, contribuiu para intensificá-las repercutindo nas esferas culturais, devem estar na origem da nova atitude crítica na mentalidade das elites novas, dos movimentos de renovação em diversos setores, como nos das letras e das artes, da educação e da política, e do interesse crescente pelos estudos científicos das realidades sociais.
Sergio Buarque de Holanda Caio Prado Jr.
GILBERTO FREYRE
Democratização, pensamento livre e sociologia ■ No espaço de pouco mais de uma década as continências da vida brasileira fizeram a ideologia das elites dirigentes passar da quase “coqueluche”para o quase pânico diante delas. ■ É que, se a ausência delas significava problemas, a sua expansão poderia acarretar outros problemas igualmente temidos. No caso, mais de uma vez, a timidez ideológica pagou ônus do duplo medo: o medo do problema e o medo da solução dele, que é uma nota constante do comportamento das elites brasileiras nos últimos tempos. ■ Esta ambivalência das elites frente às ciências sociais por vezes implica na criação de condições institucionais e financeiras favoráveis e por vezes desfavoráveis para o desenvolvimento de recursos humanos e para a criação, expansão e consolidação de centros de pesquisa e mercado de trabalho para sociólogos.
Escola Paulista de Sociologia ■ Esta etapa tem como um de seus marcos principais a formação da chamada “Escola de Sociologia Paulista” ou “Escola da USP” com a organização do grupo originário de sociólogos em 1954, sob a direção de Florestan Fernandes, que desenvolveu projetos coletivos de pesquisa acerca das relações raciais no Brasil, da empresa industrial em São Paulo e do desenvolvimento brasileiro. ■ A preocupação com as possibilidades de um desenvolvimento democrático, racional, urbano-industrial da sociedade brasileira, enquanto concepção particular da Teoria da Modernização, ocupou um papel central entre as orientações intelectuais e políticas do “projeto” da “Escola” neste período (Liedke Filho, 1977).
Teorias da modernização ■ A Teoria da Modernização concebe o processo de desenvolvimento como uma transição de uma sociedade rural tradicional para uma sociedade industrial moderna (Germani, 1969). ■ Essa transição, quando incompleta, acarreta a coexistência de ambas as formas societárias dentro de uma mesma sociedade nacional, caracterizando-a como uma sociedade dual (Quadro 1). ■ Ressalte-se que esta tese teve ampla aceitação internacional na sociologia do desenvolvimento, assim como no âmbito das agências internacionais como a UNESCO.
Característica dual das sociedades latino-americanas ■ A “sociedade arcaica” seria caracterizada por relações de tipo essencialmente familiar e pessoal, por instituições tradicionais (o compadrio, certas formas de trabalho coletivo, de dominação personalista e de clientela política, etc. ), por uma estratificação social rígida de status adscritos (isto é, em que a posição do indivíduo na escala social está determinada desde o nascimento, com poucas possibilidades de mudança durante a vida), e por normas e valores que exaltam, ou, quando menos, aceitam, o status quo, os estilos de vida herdados antepassados, e que constituem obstáculo ao pensamento econômico “racional”.
Característica dual das sociedades latino-americanas ■ A sociedade “moderna”, pelo contrário, consistiria em relações sociais do tipo que os sociólogos chamam de “secundárias”, determinadas pelas ações interpessoais destinadas a fins racionais e utilitários; de instituições funcionais, de estratificação social pouco rígida (isto é, com mobilidade social) em que abundam os status adquiridos por meio do esforço pessoal e determinados, seja por índices quantitativos (como o são o nível de renda ou o grau educacional), seja por funções sociais (como a ocupação). ■ Na “sociedade moderna”, as normas e os valores das pessoas tendem a orientar-se para a mudança, o progresso, as inovações e a racionalidade econômica (a saber, o cálculo de maiores lucros com menores custos)
Sociologia científica e modernização ■ Esperar-se-ia que um patamar superior de modernização societária, caracterizada pela evolução para uma “sociedade racional, democrática e urbano-industrial” levaria à institucionalização plena da “Sociologia Científica”, típica da terceira etapa de evolução da Sociologia na América Latina. ■ Esta abordagem sustenta, portanto, uma estreita associação entre modernização, democratização e condições favoráveis à evolução da Sociologia. A emergência dos “novos” regimes autoritários latino-americanos, a partir da década de sessenta, e seus impactos negativos sobre a práxis sociológica na região vieram a ser interpretados como “obstáculos” à consolidação da sociologia científica
Sociologia brasileira e teoria da modernidade ■ O dogmatismo “consiste na adoção extensiva de argumentos de autoridade na discussão sociológica, ou em certa tendência a discutir ou avaliar fatos através da mera justaposição de textos de autores prestigiosos”. ■ O dedutivismo decorre diretamente do dogmatismo, pois “desde que se empresta aos sistemas estrangeiros o caráter de validade absoluta, eles passam a ser tomados como pontos de partida para a explicação dos fatos da vida brasileira”
Sociologia e regimes autoritários ■ O fechamento do ISEB em 1964 pelo regime militar e as cassações de cientistas sociais em 1969, assim como o impacto negativo da repressão cultural-educacional aos níveis universitários e das condições de exercício profissional, correspondem plenamente às características gerais da quarta etapa de evolução da Sociologia na América Latina. ■ Todavia, em contraste com a evolução adversa da Sociologia em outros países latino-americanos, particularmente do Cone Sul, sob as condições autoritárias, a Sociologia no Brasil experimentou uma razoável expansão institucional do ensino e da pesquisa.
Fases da trajetória de Florestan Fernandes ■ A evolução das orientações teóricometodológicas e das preocupações temáticopolíticas que caracterizam a obra de Florestan Fernandes, permitem a identificação de quatro etapas distintas: Etapa de Formação Intelectual (1941 -1952); Etapa da Sociologia numa Era de Revolução Social (1952 -1967); Etapa da Reflexão sobre a Revolução Burguesa no Brasil (1967 - 1986) e Etapa da Militância-Cidadã (19861995).
Escola paulista de sociologia ■ Em 1952, Florestan Fernandes assumiu a Cadeira de Sociologia I, em substituição a Roger Bastide que retornava então à Europa, e deu início à organização de um grupo de colaboradores, constituído inicialmente por Fernando Henrique Cardoso, Octavio Ianni e Renato Jardim Moreira, originando a “Escola de Sociologia da USP”. ■ Por “Escola de Sociologia da USP” ou “Escola de Sociologia de Florestan Fernandes” grupo de cientistas sociais que trabalharam ligados a este sociólogo no período de 1954 a 1969, na antiga Faculdade de Filosofia da USP, desenvolvendo uma série de projetos de pesquisa comuns, abrangendo temas referentes (1) às relações raciais no Brasil, (2) à empresa industrial em São Paulo e (3) à análise sociológica do desenvolvimento no Brasil, 13 na “aventura comum de vincular a investigação sociológica à transformação da sociedade brasileira”.
Atraso brasileiro ■ Em “Existe uma Crise da Democracia no Brasil? ”, buscando responder por que a construção da democracia no Brasil era então, em seu entender, um processo incipiente, Florestan aponta a possibilidade de emergência de disnomias (irracionalidades) em setores da vida social, estereotipados em termos de tensões entre padrões recorrentes tradicionais de ação e padrões racionais emergentes de institucionalização e ação.
Democracia e arcaísmo ■. . . toda a argumentação desenrolada tenta mostrar que um dos fatores que prejudicam o desenvolvimento da democracia no Brasil é a persistência de uma mentalidade política arcaica, inadequada para promover ajustamentos dinâmicos não só a situações que se alteram socialmente, mas que estão em fluxo contínuo no presente. ■ A contribuição que a educação sistemática pode oferecer para alterar semelhante mentalidade exprime, naturalmente, as tarefas políticas que ela pode preencher em uma esfera neutra
Projeto Unesco ■ Uma outra vertente de investigação abre-se, no decorrer da década de 50: são os estudos sobre relações raciais, iniciados na USP, a partir do projeto de Roger Bastide e Florestan Fernandes. ■ A tendência fundamental da análise reside na inserção do preconceito e das relações desencadeadas pelo fenômeno na estrutura social. Os autores orientam as suas reflexões, no interior da consideração de situações sociais propícias à emergência do preconceito. ■ Em torno do tema do negro, Florestan Fernandes dirige pesquisas importantes, voltadas ao estudo das relações raciais, na gênese e desenvolvimento da sociedade brasileira. Encontram- se nesse campo de preocupações, o doutoramento de Fernando Henrique Cardoso — Formação e desintegração da sociedade de castas: o negro na ordem escravocrata do Rio Grande do Sul defendido em 1961; de Octavio Ianni O negro na sociedade de castas do mesmo ano; a tese de Maria Sylvia de Carvalho Franco Homens livres na velha civilização do café (1964); e a tese de Juarez Rubens Brandão Lopes — Crises do Brasil arcaico — que se aproxima, em termos de preocupações, das anteriores.
A Integração do Negro na Sociedade de Classes (1965) ■ O dilema racial brasileiro (. . . ) se caracteriza pela forma fragmentária, unilateral, e incompleta com que [o regime de classes sociais] consegue abranger, coordenar e regulamentar as relações raciais. Estas não são totalmente absorvidas e neutralizadas, desaparecendo atrás das relações de classes. ■ Mas sobrepõem-se a elas, mesmo onde e quando as contrariam, como se o sistema de ajustamentos e de controles sociais da sociedade de classes não contivesse recursos para absorvê-las e regulá-las socialmente.
A revolução Burguesa ■ Certamente, a obra A Revolução Burguesa no Brasil é uma tentativa de explicar a especificidade do desenvolvimento do capitalismo no Brasil e os traços profundamente antidemocráticos, de nossa burguesia, que se apresentavam sem nenhum pudor com o golpe de 1964. ■ Ele começou a escrever o livro em 1966 e foi uma resposta aos desafios expressos pelas novas tarefas que a intelectualidade e o movimento socialista e democrático teriam que defrontar.
Revolução Burguesa e a interpretação comunista ■ “imagem de Brasil” desenvolvida por Florestan no livro busca se opor à imagem formulada pelo PCB, que se pautava em um etapismo, segundo o qual o país deveria transitar de um suposto feudalismo para o capitalismo, ou seja, um percurso equivalente à chamada “via clássica” de transição.
Argumentos em Revolução Burguesa ■ Crítica a ideia de que o senhor de engenho pudesse ser assimilado ao burguês pelas suas funções. Para ele, o senhor de engenho ocupava uma posição marginal no processo de mercantilização da produção agrária e não pode ser considerado o antecessor do empresário moderno ■ Para Fernandes, quem nega que houve uma revolução burguesa no Brasil busca, na verdade, um caminho semelhante à via clássica de desenvolvimento do capitalismo, ocorrida na Europa, e a transplanta para o Brasil. ■ O liberalismo, para Florestan Fernandes, não é mero ornamento, mas cumpriu um papel importante — foi funcional para as elites se livrarem do fardo colonial que representava a Metrópole e ajudou a formatar, nos campos ideológico, político e jurídico, a configuração do Estado Nacional
Argumentos em Revolução Burguesa ■ A Independência, para Florestan Fernandes, melhorou a posição do senhor rural como agente econômico em face do mercado, mas não retirou o País da situação de heteronomia. A Independência também burocratizou a dominação patrimonialista. ■ A economia de mercado nacional foi plasmada por volta de 1822. Posteriormente, com a abolição da escravatura, e mais tarde, com a industrialização, o mercado nacional entrou em nova fase cujas características foram a generalização do trabalho livre, a subordinação da agricultura à indústria e o fortalecimento, em meados do século XIX, do poder burguês. ■ É o modelo neoimperialista de desenvolvimento que se impõe de fora para dentro. Florestan Fernandes (1974) reúne três fases de desenvolvimento do capitalismo no Brasil e ressalta que, em nenhuma das três, houve um desenvolvimento no qual a via democrática se impusesse: 1ª) eclosão e emergência do capitalismo moderno. Abrange o período de 1808 a 1860; 2ª) formação e expansão do capitalismo competitivo. Período que vai de 1860 a 1950; 3ª) fase de irrupção do capitalismo monopolista que começa na década de 1950.
Limites da interpretação de Florestan ■ Florestan acerta ao apontar que o capitalismo brasileiro nasce de uma sociedade que denominou como patrimonialista. ■ O ponto principal da não-classicidade do caso brasileiro, em Florestan, “residiria sobretudo nesse caráter dependente e subalterno de nossa formação social”, mas também do caráter tardio do capitalismo nacional. ■ Estes dois elementos, centrais no pensamento de Florestan, são questionados pelo sociólogo baiano, uma vez que, a Alemanha e o Japão, por exemplo, também possuem capitalismo tardio
Atraso prussiano e o brasileiro ■ Diferente da Alemanha, o Brasil se desenvolve de forma hiper-tardia (Chasin, 1999), ou seja, historicamente ainda mais tarde que Alemanha e Itália. Por outro lado, a diferença nos elementos que antecederam a consolidação do capitalismo industrial no Brasil e na Alemanha é fundamental na constituição de suas respectivas burguesias, que consequentemente apresentarão disposições distintas na efetivação do capitalismo nesses países. ■ Enquanto a Alemanha desenvolve uma conciliação entre burguesia e feudalismo, o Brasil realizará uma conciliação entre burguesia e latifundiários, voltada para o atendimento das demandas do mercado externo
Influência externa sobre as dinâmicas externas ■ Para Florestan, “a América Latina é o único continente no qual é possível observar toda a sequência da formação e desenvolvimento das formas de dominação externa associadas à chamada ‘expansão da civilização moderna’” (Fernandes, s/d), o que já define o sentido de seu “desenvolvimento”
Especificidade da evolução histórica brasileira ■ O que há neste “antigo sistema colonial” é uma mescla de fatores, na qual temos, por um lado, a “transplantação dos padrões iberos de estratificação social” que se ajunta à “escravidão ou o trabalho forçado (nas plantações e nas minas)”, gerando uma combinação entre estamento e casta que produz a “real sociedade colonial na qual só os colonizadores podiam participar das estruturas de poder e transmitir posições sociais de acordo com linhagens “Europeias”
Brasil e a América Latina ■ A Era Neocolonial, cumprirá, segundo o autor, um papel de acumulação primitiva, a partir dos recursos que passam a ficar no país e que serão essenciais para a transformação seguinte, gerando a Era do capitalismo dependente. ■ Como vimos, estas Eras são modelos aplicáveis a outros países da América Latina, ainda que os vários países latino-americanos não participem destes modelos simultaneamente, como no caso de Cuba. ■ Na análise do autor, o país estava na Era Neocolonial no momento em que realiza a Revolução Cubana. Com a revolução, Cuba, ao invés de seguir para a Era Burguesa, transita para o socialismo
Domínio da oligarquia ■ A oligarquia mantinha a dominação tradicional no momento anterior à implantação da hegemonia burguesa e, no geral, estava vinculada ao campo – no caso de São Paulo, ao plantio do café – tendo no escravo o meio de produção por excelência. Seria a classe que teoricamente estaria em oposição direta à burguesia, pois representava o atraso, o conservadorismo, mas que, ao tomar o capitalismo financeiro como casulo, desdobrar-se-á como uma burguesia “apática”. ■ Assim, “graças ao café e à associação direta com o capital financeiro mundial, os homens de negócios transformaram a oligarquia paulista em uma complicada floração do capitalismo competitivo dependente”, de tal forma que os setores arcaicos da oligarquia eram tão burgueses quanto os setores mais liberais
Capitalismo dependente do Brasil ■ A era do capitalismo dependente no Brasil se inicia, para Florestan, por volta de 1880 e, até seus últimos escritos, o autor considera que o país continuava envolto por esta estrutura. No entanto, há mudanças estruturais, dentro do próprio capitalismo dependente que influenciarão toda a movimentação no plano da história em processo. ■ Dividindo-o em fases, o primeiro período da Era capitalista dependente é o que o autor chamou de capitalismo competitivo, que iria desde 1880 até 1964, momento que levará a uma aceleração industrial, através de governos que Florestan denomina de demagógicos populistas.
Efeitos do capitalismo competitivo ■ Apesar dos sucessivos governos que mantiveram as classes trabalhadoras manietadas, através do “ardil populista”, o autor compreende que houve, no período, um desenvolvimento industrial suficiente para que, nos anos 1960, tivéssemos “a emergência e difusão de movimentos de massa antiburgueses, nas cidades e até em algumas áreas do campo”. ■ Tais movimentos, mesmo sem representar perigo imediato, “acabaram repercutindo e fermentando, de modo quase incontrolável, no próprio radicalismo burguês: ‘contaminaram’ estudantes, intelectuais, sacerdotes, militares, vários setores da pequena-burguesia etc. ”
Forças democráticas da revolução burguesa ■ A ditadura militar de 1964 representará a barreira de contenção desta pressão dentro da ordem. ■ Segundo Florestan, a ditadura será o elo forte da transição do capitalismo competitivo para o capitalismo monopolista no Brasil; ■ ela foi a saída necessária para a burguesia, uma vez que a dinâmica do capitalismo competitivo, fomentando o desenvolvimento econômico, acabou, “dialeticamente”, impondo uma necessidade de ampliação da participação política, de uma revolução dentro da ordem, que gerasse uma democracia ampliada pela qual, através da atuação efetiva das massas, romper-se-ia com o caráter autocrático e dependente do Estado nacional – algo impensável para a chamada “elite autocrática nacional”.
A contrarrevolução de 1964 ■ Nesse sentido, Florestan ressaltará que, em 1964, houve uma contenção contrarrevolucionária, “para garantir a ‘modernização’, a incorporação e a industrialização maciça”, produzindo um Estado autocrático que “é também um Estado heterogêneo”, com três faces salientes: a primeira seria a aparência democrática sustentada por um formalismo institucional, mas na qual “os oponentes reais estão desqualificados ou neutralizados; a maioria, mesmo eleitoral, não tem influência concreta”; a segunda seria “uma política econômica de linha dura”; e, por fim, seu caráter fascista, que terá como principal função “a fragmentação do movimento operário e sindical bem como a neutralização de qualquer potencialidade de protesto popular”
Fernando Henrique Cardoso ■ A produção intelectual de Fernando Henrique Cardoso abrange uma variada gama de temas teóricos e históricos em ciências sociais, tais como: relações raciais no Brasil; empresariado e desenvolvimento econômico no Brasil; dependência e classes sociais na América Latina; autoritarismo e possibilidades da redemocratização no Brasil.
Fernando Henrique Cardoso ■ o conjunto dos estudos de Fernando Henrique Cardoso sobre o Brasil contemporâneo, divide-se em quatro temas-momentos: o estudo da sociedade escravocrata brasileira e das relações raciais no Brasil (1955 -1961); a reflexão sobre o desenvolvimentismo brasileiro (1961 -1963); a análise da dependência estrutural da sociedade brasileira no contexto da dependência latino-americana (1965 -1972); e o modelo político autoritário brasileiro e as possibilidades e tarefas da redemocratização.
FHC e as relações raciais ■ No período de 1955 a 1960, Cardoso e Ianni realizam, com a colaboração parcial de Renato Jardim, um levantamento de dados sobre a situação social dos negros no Brasil Meridional, tanto no passado como no presente. ■ Como resultados desta investigação são publicados os livros Cor e Mobilidade Social em Florianópolis (1961), de Cardoso e Ianni, Capitalismo e Escravidão no Brasil Meridional (1962) de Cardoso e As Metamorfoses do Escravo (1962) de Ianni.
Burguesia e desenvolvimento nacional ■ Em sua tese de livre-docência, defendida em novembro de 1963, Empresário Industrial e Desenvolvimento Econômico no Brasil, Cardoso discute a questão central do período histórico desenvolvimentista - teria a burguesia nacional intenção e condições de realizar um projeto de desenvolvimento nacional, democrático-popular?
Tese de FHC para o desenvolvimentismo ■ Os resultados da pesquisa desenvolvida entre 1961 e 1963 acerca das elites empresariais permitiram a Cardoso sustentar teses contrárias à interpretação do desenvolvimentismo, então compartilhada tanto pelo ISEB (Instituto Superior de Estudos Brasileiros) como por setores marxistas. ■ Cardoso apontava que (1) não foi a burguesia industrial a responsável primeira pela elaboração do projeto nacional-desenvolvimentista, mas sim setores tecnocráticos do Estado que, com a chancela das oligarquias, buscavam atender as reivindicações das massas populares urbanas nascentes; ( ■ 2) quando a burguesia industrial pôde e buscou ter um “controle da situação”, ela redefiniu o projeto vigente, enfatizando o desenvolvimentismo nãonacionalista, facilitando o ingresso de capitais internacionais e marchando para um “subcapitalismo”
Teoria da dependência na América Latina ■ A discussão comparativa da crise sociopolítica das sociedades latinoamericanas, no período de “expansão para fora”, tendo por referência os conceitos de “situações de controle nacional do sistema produtivo” (Argentina, Brasil, Uruguai e Colômbia) versus “situações de economia de enclave” (México, Bolívia, Venezuela, Chile, Peru e América Central), representou uma renovação interpretativa da história latino-americana. ■ Ao mesmo tempo, propunha-se a necessidade de apreender “o novo caráter da dependência” – a internacionalização do mercado – através da abertura dos mercados internos ao controle externo, via ingresso de capitais estrangeiros.
Teoria da dependência ■ Para a teoria da dependência a caracterização dos países como "atrasados" decorre da relação do capitalismo mundial de dependência entre países "centrais" e países "periféricos". Países "centrais", como centro da economia mundial será identificado nos espaços em que ocorrem a manifestação do meio técnico científico informacional em escala ampliada e os fluxos igualmente fluam com mais intensidade. ■ A periferia mundial (países periféricos)se apresente como aqueles espaços onde os fluxos, o desenvolvimento da ciência, da técnica e da informação ocorram em menor escala e as interações em relação ao centro se deem gradativamente. A dependência expressa subordinação, a ideia de que o desenvolvimento desses países está submetido (ou limitado) pelo desenvolvimento de outros países e não era forjada pela condição agrárioexportadora
Teses de FHC ■ (1) a tese da viabilidade de algum tipo de desenvolvimento capitalista, ainda que em condições de dependência associada, com presença do capital internacional, sem que isto signifique as burguesias locais deixem de existir; ■ (2) a tese da viabilidade de algum tipo de (re)distribuição de renda, mesmo nessas condições; ■ (3) baseada nas teses anteriores, a tese da necessidade-viabilidade de uma democratização substantiva, com justiça social, participação democrática e liberdade efetiva.
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