II Melhores Contos Lygia Fagundes Telles Seleo Eduardo

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II Melhores Contos Lygia Fagundes Telles Seleção Eduardo Portella Análise Baseada no Trabalho da

II Melhores Contos Lygia Fagundes Telles Seleção Eduardo Portella Análise Baseada no Trabalho da Professora Cláudia Regina Silveira

Melhores Contos • Autor: Lygia Fagundes Telles • Escola Literária: Pós- Modernismo / 3.

Melhores Contos • Autor: Lygia Fagundes Telles • Escola Literária: Pós- Modernismo / 3. ª Geração do Modernismo • Ano de Publicação: 1982 • Gênero: Contos • Divisão da Obra: 16 Contos

Melhores Contos Lygia Fagundes Telles RESUMO DOS CONTOS

Melhores Contos Lygia Fagundes Telles RESUMO DOS CONTOS

OBSERVAÇÃO RESUMO DOS CONTOS ALGUNS CONTOS RECEBERAM MAIOR DETALHAMENTO, DADA SUA MAIOR COMPLEXIDADE

OBSERVAÇÃO RESUMO DOS CONTOS ALGUNS CONTOS RECEBERAM MAIOR DETALHAMENTO, DADA SUA MAIOR COMPLEXIDADE

CONTOS DO LIVRO Antes do baile verde Lygia Fagundes Telles 1970

CONTOS DO LIVRO Antes do baile verde Lygia Fagundes Telles 1970

Verde Lagarto Amarelo SÍNTESE • Eduardo visita Rodolfo, os dois conversam sobre trivialidades e

Verde Lagarto Amarelo SÍNTESE • Eduardo visita Rodolfo, os dois conversam sobre trivialidades e relembram o passado, o que significa uma tortura para Rodolfo, pois lhe traz lembranças dolorosas da infância.

Verde Lagarto Amarelo • Em Verde Lagarto Amarelo, escrito em 1969 e inédito até

Verde Lagarto Amarelo • Em Verde Lagarto Amarelo, escrito em 1969 e inédito até a publicação de Antes do baile verde (livro), o tema desenvolvido no conto está relacionado à importância da infância e às consequências dos dramas infantis na vida de duas personagens adultas. Afinal, de que cor é o lagarto? O título talvez tenha sido escolhido com a intenção de despertar a curiosidade do leitor: apenas por seu intermédio não é possível a formação de um projeto virtual sobre o conto, também pode associar o personagem Rodolfo às características do camaleão (adaptável).

Verde Lagarto Amarelo • A narrativa é subjetiva, pois existe no discurso a presença

Verde Lagarto Amarelo • A narrativa é subjetiva, pois existe no discurso a presença de um “eu”, Rodolfo, o narrador. Esse esclarecimento feito pelo narrador parece servir para reforçar a impressão positiva sobre Eduardo. Assim, se ele anda sem fazer ruído, é com a intenção de não incomodar, e não para surpreender Rodolfo sorrateiramente, como faz um felino ao caçar uma presa.

Verde Lagarto Amarelo • Com o sorriso de Eduardo, têm início as recordações da

Verde Lagarto Amarelo • Com o sorriso de Eduardo, têm início as recordações da infância, para Rodolfo. E o leitor recebe a informação que Eduardo é irmão de Rodolfo. A partir desse momento, o conto passa a ser construído com a intercalação de trechos que representam o passado das personagens, com outros que se situam no momento presente da narrativa, na cena que se desenvolve no apartamento de Rodolfo. O passado é composto por recordações da infância, nas quais Rodolfo faz conjeturas sobre o próprio comportamento e o dos outros membros da família, especialmente o do irmão e o da mãe.

Verde Lagarto Amarelo • O diálogo entre os irmãos transcorre normalmente, com a evocação

Verde Lagarto Amarelo • O diálogo entre os irmãos transcorre normalmente, com a evocação das qualidades de Eduardo por parte do narrador. Pela forma como Eduardo é apresentado, percebe-se que existe um engajamento afetivo do narrador em relação a essa personagem e que, aparentemente, o narrador procura fazer com que o leitor sinta simpatia por Eduardo. Entretanto, a partir do trecho citado a seguir, o drama de Rodolfo passa a ser apresentado para o leitor: “Respirei de boca aberta agora que ele não me via, agora que eu podia amarfanhar a cara como ele amarfanhara o papel. Esfreguei nela o lenço, até quando? !. . . E me trazia a infância, será que ele não vê que para mim foi só sofrimento? Por que não me deixa em paz, por quê? Por que tem que vir aqui e ficar me espetando, não quero lembrar nada, não quero saber de nada!. . ”

Verde Lagarto Amarelo • Rodolfo afirma ser “um tipo meio esquisito”, “meio louco” o

Verde Lagarto Amarelo • Rodolfo afirma ser “um tipo meio esquisito”, “meio louco” o que parece ser uma máscara que utiliza para esconder a tristeza que sente, a amargura que traz dentro de si. Eduardo é oposto ao irmão.

Verde Lagarto Amarelo • A consciência da diferença sufoca Rodolfo. Para resolver o problema,

Verde Lagarto Amarelo • A consciência da diferença sufoca Rodolfo. Para resolver o problema, pensa em morrer, “Era menino ainda mas houve um dia em que quis morrer para não transpirar mais”. Chega -se ao clímax do conto. Rodolfo adivinha o motivo da visita do irmão. O impacto da descoberta faz com que ele sinta uma dor “quase física”.

Verde Lagarto Amarelo • A única coisa que era verdadeiramente sua, o único talento

Verde Lagarto Amarelo • A única coisa que era verdadeiramente sua, o único talento que sobrara para Rodolfo, seu único canal para se expressar e conseguir um pouco de admiração, era o ato de escrever, agora também “roubado” por Eduardo. A surpresa e a decepção são grandes demais. “Senti meu coração se fechar como uma concha”.

Verde Lagarto Amarelo • Eduardo tornar-se escritor, o que é sugerido pelo conto, cujo

Verde Lagarto Amarelo • Eduardo tornar-se escritor, o que é sugerido pelo conto, cujo final permanece em aberto, sem a confirmação de Eduardo – é o golpe de misericórdia na tentativa de Rodolfo de manter a compostura.

Verde Lagarto Amarelo • A intertextualidade está presente no conto com o drama entre

Verde Lagarto Amarelo • A intertextualidade está presente no conto com o drama entre os irmãos Abel e Caim, descrito na Bíblia. Caim sente inveja do outro, que é o predileto do Senhor, e a ira cresce a tal ponto que o leva a assassinar Abel.

Apenas um saxofone SÍNTESE • Apenas um saxofone • A narradora é uma mulher

Apenas um saxofone SÍNTESE • Apenas um saxofone • A narradora é uma mulher rica e fútil, que se lembra da paixão que viveu com um saxofonista. Ele era dedicado em extremo, julgava-a a coisa mais bela e importante do mundo. • Ela, com medo de um amor tão puro e autêntico, pede que ele a deixe.

Apenas um saxofone • É a história de uma mulher e rica aos 44

Apenas um saxofone • É a história de uma mulher e rica aos 44 anos. Tinha um homem velho e rico que a sustentava, relacionava-se com um jovem que lhe satisfazia sexualmente e com um professor espiritual com quem dormia e discutia filosofia. • Possuía joias, tapetes e uma mansão, no entanto vivia infeliz. Vivia na saudade do seu grande amor, um saxofonista que se dedicara a ela completamente, ela era a música dele. Ele tocava com paixão o saxofone e assim mantinha a mulher.

Apenas um saxofone • Com ele ela se sentia viva, pois o saxofonista a

Apenas um saxofone • Com ele ela se sentia viva, pois o saxofonista a idolatrava. Eles artista e pobre se esforçava para satisfazer seus desejos frívolos: um sapato, um vestido , uma joia. . . Sempre antecedidos pela frase de Luisiana: Se você me ama, . . . • Seus desejos ficam por demais exigentes. Até que ela diz: Se você me ama, se mate. . . • E ele ir desaparece de sua vida. Assim ela vivia só com a lembrança.

Apenas um saxofone • Ela pode recuperar, pela memória, pessoas, gestos, sons, objetos que,

Apenas um saxofone • Ela pode recuperar, pela memória, pessoas, gestos, sons, objetos que, na verdade, simbolizam o tempo perdido, o desejo de resgatar algo que só foi valorizado no momento de maturidade da vida. • Luisiana, em crise existencial, já satisfeita de outras necessidades, agora quer apenas “ouvir o saxofone”. Ela mergulha na memória, guiada pela música na figura de um objeto-símbolo remetendo-se a outro tempo, e transportase para outro espaço de sua vida, o qual percorre, recordando-se de um amor da juventude. • “A lembrança é uma imagem construída pelos materiais que estão, agora, à nossa disposição, no conjunto das representações que povoam nossa consciência atual”.

Apenas um saxofone • Sob essa ótica, a voz narradora coloca-nos diante dessa personagem

Apenas um saxofone • Sob essa ótica, a voz narradora coloca-nos diante dessa personagem no instante em que ela se depara com sua juventude ao lembrar-se do que passou e agora não há mais. A pergunta que a consome encabeça uma lista de objetos de sua posse numa espécie de balanço cujo resultado é sua certeza de que trocaria tudo por um momento de seu passado jovem com o amor que só entendeu agora ser o importante de sua vida: • “Onde, meu Deus? Onde agora? Tenho também um diamante do tamanho de um ovo de pomba. Trocaria o diamante, o sapato de fivela e o iate – trocaria tudo, anéis e dedos, para poder ouvir um pouco que fosse a música do saxofone. Nem seria preciso vê-lo, juro que nem pediria tanto, eu me contentaria em saber que ele estava vivo, vivo em algum lugar, tocando seu saxofone”

Antes do baile verde SÍNTESE • Tatisa se prepara ir ao baile de carnaval.

Antes do baile verde SÍNTESE • Tatisa se prepara ir ao baile de carnaval. Ela pede ajuda para a empregada, para terminar sua fantasia. Enquanto isso seu pai está no quarto ao lado à beira da morte.

Antes do baile verde • Em Antes do baile verde, conto de Lygia Fagundes

Antes do baile verde • Em Antes do baile verde, conto de Lygia Fagundes Telles, uma jovem se prepara animada para o grande baile a fantasia de sua cidade, em que todos devem comparecer vestidos com roupas verdes. No quarto ao lado, seu pai doente agoniza em seus últimos minutos de vida. • Tudo acontece no apartamento de Tatisa, que juntamente com sua empregada, Lu, preparam-se para um Baile Verde de carnaval. Ambas estão apressadas, em especial Tatisa, preocupada em chegar atrasada ao encontro de seu namorado, Raimundo. Lu vai ajudando Tatisa a terminar sua fantasia.

Antes do baile verde • É nessa situação que a empregada chama a atenção

Antes do baile verde • É nessa situação que a empregada chama a atenção da jovem para a saúde de seu pai. Disse que esteve lá (no mesmo prédio); que o pai de Tatisa estava morrendo e que seria bom que ela fosse vê-lo. No decorrer da conversa, a garota deixa transparecer seu egoísmo em total indiferença ao pai. Transfere não só a culpa disso, mas também a responsabilidade para outrem (o médico e a própria empregada). • Depois, tenta convencer a empregada de ficar com o pai naquela noite. Esta reluta a ideia alegando que não perderá o desfile de carnaval por nada. Tatisa tenta se convencer

Eu era mudo e só SÍNTESE • Manuel sente-se oprimido pelo casamento que o

Eu era mudo e só SÍNTESE • Manuel sente-se oprimido pelo casamento que o afastou dos amigos. Abandonara sua profissão e foi trabalhar com seu sogro − com máquinas agrícolas− apenas para manter o nível de vida da mulher.

Eu era mudo e só • Para construir a narrativa em Eu Era Mudo

Eu era mudo e só • Para construir a narrativa em Eu Era Mudo e Só, de 1958, Lygia Fagundes Telles criou o personagem Manuel, o marido que se sente oprimido com o casamento. É por meio do olhar de Manuel que o leitor conhece a esposa, Fernanda. • O conto tem início com uma cena familiar, Manuel observa Fernanda, que está lendo um livro à luz do abajur, já preparada para dormir. Nesse primeiro parágrafo, o narrador emprega a focalização externa para iniciar a caracterização da esposa: descreve o traje que ela está usando e o aspecto e perfume de sua pele. Por meio das características empregadas para compor a personagem, o leitor pode perceber que se trata de uma mulher vaidosa e que, provavelmente, tem um alto poder aquisitivo.

Eu era mudo e só • Utilizando o recurso do monólogo interior, o narrador

Eu era mudo e só • Utilizando o recurso do monólogo interior, o narrador apresenta uma analepse externa, por meio da qual o leitor conhece a opinião de tia Vicentina sobre Manuel: “‘Ou esse seu filho é meio louco, mana, ou então. . . ’ Não tinha coragem de completar a frase, só ficava me olhando, sinceramente preocupada com meu destino. ” (p. 95). Entretanto, com a continuidade do monólogo interior, o leitor toma conhecimento que Manuel é um homem materialmente bem sucedido, contrariando os prognósticos da tia Vicentina

Eu era mudo e só • “Penso agora como ela ficaria espantada se me

Eu era mudo e só • “Penso agora como ela ficaria espantada se me visse aqui nesta sala que mais parece a página de uma dessas revistas da arte de decorar, bem vestido, bem barbeado e bem casado, solidamente casado com uma mulher maravilhosa: quando borda, o trabalho parece sair das mãos de uma freira e quando cozinha!. . . Verlaine em sua boca é aquela pronúncia, a voz impostada, uma voz rara. E se tem filho então, tia Vicentina? ! A criança nasce uma dessas coisas, entende? . . . Tudo tão harmonioso, tão perfeito. ” (Telles, 1982, p. 95)

Eu era mudo e só • Ao pensar no futuro de Gisela, o narrador

Eu era mudo e só • Ao pensar no futuro de Gisela, o narrador prevê que a situação pela qual ele, Manuel, passou, ao ser apresentado à família de Fernanda, irá se repetir, um dia: • “Era o círculo eterno sem começo nem fim. (. . . ) A perplexidade do moço diante de certas considerações tão ingênuas, a mesma perplexidade que um dia senti. Depois, com o passar do tempo, a metamorfose na maquinazinha social azeitada pelo hábito: hábito de rir sem vontade, de chorar sem vontade, de falar sem vontade, de fazer amor sem vontade. . . O homem adaptável, ideal. Quanto mais for se apoltronando, mais há de convir aos outros, tão cômodo, tão portátil. ”(Telles, 1982, p. 99) • O mundo de Fernanda e do senador era belo, mas irreal. Manuel sabe que não faz parte daquele mundo, que se quiser continuar a ser como é deve permanecer do lado de fora, contentando-se a apenas admirá-lo.

As pérolas SÍNTESE • Tomás e Lavínia são casados. Ela se prepara ir a

As pérolas SÍNTESE • Tomás e Lavínia são casados. Ela se prepara ir a uma reunião, enquanto ele está deitado e doente. Por ciúmes, ele esconde o colar de pérolas da mulher, mas depois o devolve.

As pérolas • Em As Pérolas, conto de 1958, o pano de fundo para

As pérolas • Em As Pérolas, conto de 1958, o pano de fundo para tratar o tema é um diálogo entre marido e mulher. as personagens que formam o casal apresentado em As Pérolas, Tomás e Lavínia, se amam. •

As pérolas • O que gera a tensão no conto é o fato de

As pérolas • O que gera a tensão no conto é o fato de Tomás estar doente, e ambos sabem que a morte do marido está próxima. Lavínia preocupa-se com o estado de saúde de Tomás. O leitor não consegue definir o que é pior para Tomás, se a certeza da proximidade da morte ou a iminência da traição. Ele sabe que a situação entre os dois irá mudar depois dessa noite, depois do encontro que acontecerá entre Lavínia e Roberto: “Depois ela não lhe diria mais nada. Seria o primeiro segredo entre os dois, a primeira névoa baixando densa, mais densa, separando-os como um muro, embora caminhassem lado a lado. ”

As pérolas • Essa certeza o deixa desesperado, mas o grito de angústia não

As pérolas • Essa certeza o deixa desesperado, mas o grito de angústia não é verbalizado, fica apenas dentro da mente de Tomás: “‘Lavínia, não me abandone já, deixe ao menos eu partir primeiro!’(. . . ) ‘Não podem fazer isso comigo, eu ainda estou vivo, ouviram bem? Vivo!’”

As pérolas • Tomás não pode alterar o destino que lhe cabe. A morte

As pérolas • Tomás não pode alterar o destino que lhe cabe. A morte está próxima. Lavínia e Roberto ficarão juntos. “(. . . ) Seria triste pensar, por exemplo, que enquanto ele ia apodrecer na terra ela caminharia ao sol de mãos dadas com outro? Hein? . . . ”. • Entretanto, ele pode se permitir uma pequena maldade, a subtração de um detalhe importante na cena, o colar de pérolas que Lavínia usou no casamento e que pretende usar no jantar dessa noite. No fim, Tomás decide aceitar os fatos e entrega o colar à sua mulher.

Herbarium SÍNTESE • A menina se apaixona por um primo que estava doente e

Herbarium SÍNTESE • A menina se apaixona por um primo que estava doente e viera passar uns dias em sua casa. O garoto colecionava folhas.

Herbarium • Herbarium – Em sensível narrativa, esse conto nos traz uma pequena história

Herbarium • Herbarium – Em sensível narrativa, esse conto nos traz uma pequena história contada, em 1ª Pessoa, por uma menina, criança à beira da adolescência, que descobre a paixão num primo doente e mais velho que vem ficar alguns dias em sua casa. • Não se sabe a causa da doença do primo. Sabe-se que ele é estudioso das plantas e está frequentemente apanhando folhas para seu herbanário Todas as manhãs eu pegava o cesto e me embrenhava no bosque, tremendo inteira de paixão quando descobria alguma folha rara (. . . ) ele tinha em casa um herbanário com quase duas mil espécies de plantas (. . . ).

Herbarium • A menina narradora, desconcertada e apaixonada pelo primo, passa a coletar várias

Herbarium • A menina narradora, desconcertada e apaixonada pelo primo, passa a coletar várias amostras e faz de tudo para impressioná-lo. Deixa de roer as unhas e passa, infantilmente, a ocupar-se somente da presença do primo, mudando algumas atitudes e comportamentos que até então não importavam. A convite do próprio primo aceita ser uma espécie de assistente dando asas à sua paixão e imaginação, até que vem a notícia da partida do rapaz O chamado era urgente, teriam que voltar nessa tarde. Sentia muito perder tão devota ajudante, mas um dia quem sabe? (. . . ). • ouro, tinha rompido o sol. Encarei-o pela última vez, sem remorso, quer mesmo? Entreguei-lhe a folha.

Herbarium • Triste e sem graça, a menina tenta encobrir seus sentimentos que, a

Herbarium • Triste e sem graça, a menina tenta encobrir seus sentimentos que, a cada passo desengonçado, ficam mais evidentes. Chateada com a notícia da partida e mais a chegada de uma moça que veio buscar o primo, nossa narradora acha uma rara folha que pensa em ocultar do primo só por birra Estendi-lhe o cesto, mas ao invés de segurar o cesto, segurou meu pulso: eu estava escondendo alguma coisa, não estava? (. . . ) Enfiei a mão no bolso e apertei a folha, intacta a umidade pegajosa da ponta aguda, onde se concentravam as nódoas vermelhas. Ele esperava. Eu quis então arrancar a toalha de crochê da mesinha, cobrir com ela a cabeça e fazer micagem, hi hi! hu hu! Até vê-lo rir pelos buracos da malha, quis pular da escada e sair correndo em ziguezague até o córrego, me vi atirando a foice na água, que sumisse na correnteza! Fui levantando a cabeça. Ele continuava esperando, e então? No fundo da sala, a moça também esperava numa névoa de

Pomba enamorada ou história de amor SÍNTESE • Pomba enamorada era uma jovem moça

Pomba enamorada ou história de amor SÍNTESE • Pomba enamorada era uma jovem moça que possui uma paixão não correspondida por Antenor. Ela sofre, depois casa-se com outro, tem filhos, mas nunca desistiu de seu primeiro amor.

Pomba enamorada ou história de amor • Pomba Enamorada ou Uma História de Amor

Pomba enamorada ou história de amor • Pomba Enamorada ou Uma História de Amor – Outra narrativa que apresenta a figura masculina como grosseira. Numa narrativa em terceira pessoa, acompanhamos as desventuras do decorrer do tempo de uma mulher que se apaixona, ainda na adolescência, por uma figura ríspida, Antenor. É uma obsessão que vai até a velhice. No começo, perseguia-o insistentemente, seja ao telefone, seja indo até o local de trabalho dele.

Pomba enamorada ou história de amor • Não desiste nem mesmo quando fica sabendo

Pomba enamorada ou história de amor • Não desiste nem mesmo quando fica sabendo do casamento do objeto amado. Tenta suicídio, frustrado. Recupera-se e diz ter amadurecido e nunca mais querer incomodá-lo. No entanto, faz questão de escrever uma carta para Antenor, para deixar tal resolução clara. O tempo passa e ela, sempre descobrindo o endereço dele, até a nova profissão (de mecânico passara a motorista de ônibus) manda cartas, falando do casamento dela, enviando notícias dos filhos dela

Pomba enamorada ou história de amor • . No final, já com filhos crescidos,

Pomba enamorada ou história de amor • . No final, já com filhos crescidos, um deles casado, vai à cartomante e esta lhe diz que um grande amor iria entregar-se a ela na rodoviária no domingo próximo. Sua ida ao terminal de ônibus claramente indica que nada havia mudado no coração da sonhadora.

Seminário dos ratos SÍNTESE • Ratos invadem uma mansão onde vai acontecer um seminário

Seminário dos ratos SÍNTESE • Ratos invadem uma mansão onde vai acontecer um seminário entre autoridades políticas justamente para tentar exterminar ratos que invadem a cidade.

Seminário dos ratos • Seminário dos ratos, é um conto de Lygia Fagundes Telles,

Seminário dos ratos • Seminário dos ratos, é um conto de Lygia Fagundes Telles, e está também presente no livro de mesmo nome. Neste conto a autora também rompe com a realidade e com a lógica racional.

Seminário dos ratos • Conto em terceira pessoa que apresenta uma alegoria de nossas

Seminário dos ratos • Conto em terceira pessoa que apresenta uma alegoria de nossas estruturas político-burocráticas. Trata-se de ratos, pequenos e temerosos roedores, numa treva dura de músculos, guinchos e centenas de olhos luzindo negríssimos, que invadem e destroem uma casa recém restaurada localizada longe da cidade. Ali aconteceria um evento denominado VII Seminário dos Roedores, uma reunião de burocratas, sob a coordenação do Secretário do Bem-Estar Público e Privado, tendo como assessor o Chefe de Relações Públicas. O país fictício encontra-se atravancado pela burocracia, invertendose a proporção dos roedores em relação ao número de homens: cem por um.

Seminário dos ratos • O conto aparece em livro homônimo, no ano de 1977,

Seminário dos ratos • O conto aparece em livro homônimo, no ano de 1977, época em que o Brasil se encontrava em um momento histórico de repressão política. No trabalho gráfico da capa da primeira edição do livro Seminário dos ratos, aparecem dois ratos empunhando estandartes com bandeiras à frente de uma figura estilizada – uma espécie de monstro com coroa, um rei no trono, a ser destronado pelos animais?

Seminário dos ratos • O próprio nome do conto "Seminário dos ratos" já causa

Seminário dos ratos • O próprio nome do conto "Seminário dos ratos" já causa uma inquietação. Um seminário evoca atividade intelectual, local de encontro de estudos, possuindo etimologicamente mesma raiz de semente/sementeira – local para germinar novas ideias. • Também traz uma ambiguidade: seminário no qual se discutirá a problemática dos ratos, ou seminário no qual os ratos serão participantes? Essa questão ficará em aberto ao final do conto.

Seminário dos ratos • Que século, meu Deus! – exclamaram os ratos e começaram

Seminário dos ratos • Que século, meu Deus! – exclamaram os ratos e começaram a roer o edifício. A imagem evocada por este verso já traz um efeito em si, remetendo à história de homens sem alma e a construções sem sentido, que não vale a pena conservar, condensando uma perplexidade frente a situações paradoxais daquele século surpreendente. O nome "esplendor" no título do poema é uma ironia, visto que o edifício descrito pelo poeta é pura decadência.

Seminário dos ratos • O espaço privilegiado no relato é um casarão do governo,

Seminário dos ratos • O espaço privilegiado no relato é um casarão do governo, espécie de casa de campo afastada da cidade, recém-reconstruída especialmente para a realização do evento. Portanto, o seminário aconteceria em uma casa de ambiente acolhedor, longe de temidos inimigos como insetos ou pequenos roedores, equipada com todo o conforto moderno: piscina de água quente, aeroporto para jatinhos, aparelhos eletrônicos de comunicação, além de outras comodidades e luxos.

Seminário dos ratos • A narrativa fantástica transcorre neste cenário insólito com protagonistas ambivalentes

Seminário dos ratos • A narrativa fantástica transcorre neste cenário insólito com protagonistas ambivalentes que carecem de nomes próprios. Até mesmo os acontecimentos e seus indícios nesta representação espacial transmitem uma sensação ameaçadora ao leitor. A intenção política fica atestada nesta escolha da mansão restaurada no campo, evidenciando um plano físico/espacial expandido ao psicológico: distante, porém íntimo para quem lá está. Embora o processo psicologizante seja lento, a total e inevitável destruição ao final é completamente bem-sucedida.

Seminário dos ratos • A primeira personagem apresentada no conto é o Chefe das

Seminário dos ratos • A primeira personagem apresentada no conto é o Chefe das Relações Públicas, um jovem de baixa estatura, atarracado, sorriso e olhos extremamente brilhantes, que se ruboriza facilmente e possui má audição. Ele pede permissão, através de batidas leves na porta para entrar na sala do Secretário do Bem Estar Público e Privado, a quem chama de Excelência – homem descorado e flácido, de calva úmida e mãos acetinadas [. . . ] voz branda, com um leve acento lamurioso. O jovem chefe encontra o secretário com o pé direito calçado, e o outro em chinelo de lã, apoiado em uma almofada, e bebendo um copo de leite. Curiosamente, a personagem do jovem chefe é a única que sobreviverá ao ataque dos ratos, restando ao final da história para contá-la.

Seminário dos ratos • As personagens desse conto são nomeadas através de suas ocupações

Seminário dos ratos • As personagens desse conto são nomeadas através de suas ocupações profissionais e cargos hierárquicos, havendo portanto uma focalização proposital nos papéis sociais. Também nesse primeiro momento, há descrição pormenorizada do físico das personagens já apresentadas, que levam a inferências sobre aspectos psicológicos, que permitem conhecer a interioridade.

Seminário dos ratos • No caso destas duas personagens, parece que ambos não têm

Seminário dos ratos • No caso destas duas personagens, parece que ambos não têm contato com seu inconsciente. Elas não se apoderam de si mesmas: não está em contato consigo mesma, mas com sua imagem refletida. As individualidades do chefe e do secretário encontram-se completamente confundidas com o cargo ocupado, resultando num estado de inflação, num papel social representado, longe da essência de seus núcleos humanos e de suas sensibilidades. A ênfase dada à ocupação e ao cargo da primeira personagem mostra que se trata do responsável pela coordenação dos assuntos que dizem respeito ao relacionamento com o público em geral. Em outras palavras, sua função está ligada aos tópicos referentes à mídia, à comunicação com o coletivo.

Seminário dos ratos • Esta primeira cena do conto já remete a uma dualidade

Seminário dos ratos • Esta primeira cena do conto já remete a uma dualidade que acentua oposições: embora seja o responsável pelo bem-estar coletivo, o secretário sofre de um mal-estar individual, pois tem uma enfermidade que ataca seu pé - a gota - em cujas crises seu sentido da audição também se aguça. Cria-se uma figura contraditória: um secretário do bem-estar que se encontra mal.

Seminário dos ratos • A narrativa apresenta a divisão da unicidade física e psíquica

Seminário dos ratos • A narrativa apresenta a divisão da unicidade física e psíquica desta personagem, que já vem nomeada com esta cisão de forças antagônicas: o público e o privado. Este índice já pertence ao duplo – um pé esquerdo doente – que desvela a cisão em que se encontra o secretário. Embora aparentemente restrita ao nível físico, há uma divisão da unidade psíquica também. No outro dia ele calçará os sapatos, para aparecer "uno" diante do mundo externo. Através do discurso, revelase uma bivocalização, uma relação de alteridade, uma interação da voz de um eu com a voz de um outro.

Seminário dos ratos • Este diálogo que se estabelece entre os dois acontece com

Seminário dos ratos • Este diálogo que se estabelece entre os dois acontece com um pano de fundo: a crise de artrite que acomete o secretário. A partir deste momento, estabelece-se uma ênfase acentuada nesta parte-sustentáculo do corpo humano, enfermo na personagem. Ao receber em chinelos seu subordinado – que, também detém um cargo de chefia – ele revela sua intimidade, denunciando sua deficiência física e tornando-se vulnerável. Confessa que fará o sacrifício de calçar sapatos, porque não deseja apresentar-se assim aos demais convidados. Dessa forma, o secretário encontra -se destituído de um dos símbolos de sua autoridade: os sapatos.

Seminário dos ratos • No conto, o fato de o secretário estar com a

Seminário dos ratos • No conto, o fato de o secretário estar com a saúde do pé abalada, e não poder se locomover (a não ser de chinelos) nem calçar sapatos, parece significar justamente não poder gozar de sua plena autoridade. É uma pessoa fragilizada, com limitações expostas, cuja "persona" não está sintonizada com o exigido, além de beber leite, alimento relacionado com a infância.

Seminário dos ratos • Na continuação da conversa, o secretário solicita notícias sobre o

Seminário dos ratos • Na continuação da conversa, o secretário solicita notícias sobre o coquetel que ocorrera à tarde, ao que o Chefe das Relações Públicas responde ter sido bem-sucedido, pois havia poucas pessoas, só a cúpula, ficou uma reunião assim aconchegante, íntima, mas muito agradável. Continua informando em que alas e suítes estão instalados os convidados: o Assessor da Presidência da RATESP na ala norte, o Diretor das Classes Conservadoras Armadas e Desarmadas na suíte cinzenta, a Delegação Americana na ala azul. Complementa dizendo que o crepúsculo está deslumbrante, dando indícios do tempo cronológico do conto, que transcorre entre um entardecer e um alvorecer: o ciclo de uma noite completa. A conversa inicia quase às seis horas, indicando um momento de passagem, de transição entre a luz/claridade e a noite, quando a consciência vai pouco a pouco dando lugar ao mundo da escuridão, do inconsciente. Como bem assinala Franz: . . . a hora do poente pode ser interpretada como dormir, o apagar-se da consciência.

Seminário dos ratos • O secretário solicita explicações sobre a cor cinzenta escolhida na

Seminário dos ratos • O secretário solicita explicações sobre a cor cinzenta escolhida na suíte do diretor das classes, por sua vez representando também uma síntese de contrários, e o jovem Relações Públicas explica os motivos de suas escolhas para distribuir os participantes. Depois indaga se o secretário por acaso não gosta da cor cinza, ao que ele responde com uma associação, lembrando tratar-se da cor deles. Rattus alexandrius.

Seminário dos ratos • O secretário os chama pelo nome latino, o que sugere

Seminário dos ratos • O secretário os chama pelo nome latino, o que sugere um artifício para minimizar a gravidade da situação. Aqui é trazida uma perspectiva polarizada: norte-sul. Entre as duas, uma zona cinzenta. É interessante perceber que o ocupante desta área tem uma responsabilidade contraditória de defender as classes conservadoras com as forças armadas e com as forças desarmadas. No conto, a cor da suíte que lhe é destinada – cinzenta - remete a algo que não é preto nem branco, mas à mescla destas duas cores, como se faltasse uma definição na cor e nas forças que utiliza.

Seminário dos ratos • No prosseguimento da conversa entre ambos, o secretário confessa ter

Seminário dos ratos • No prosseguimento da conversa entre ambos, o secretário confessa ter sido contrário à indicação do americano, argumentando que, se os ratos são pertencentes ao país, as soluções devem ser caseiras, ao que o chefe objeta ser o delegado um técnico em ratos. Fica evidente a posição política contrária à intervenção americana no país, principalmente porque na época havia suspeitas de que agentes americanos especializados em repressão política vinham ao Brasil treinar torturadores. O secretário aproveita para indicar ao jovem chefe (que está sendo orientado, pois é um candidato em potencial) uma postura de positividade diante dos estrangeiros, devendo esconder o lado negativo dos fatos: mostrar só o lado positivo, só o que pode nos enaltecer. Esconder nossos chinelos. Aqui a personagem expõe sua visão de mundo, suas relações consigo mesmo e com o mundo externo - aspectos que são motivo de orgulho e envaidecimento devem ser mostrados, porém aspectos da psique individual e coletiva que envergonhem e representam dificuldades não. Em outras palavras: o mundo da sombra deve ser escondido.

Seminário dos ratos • No discurso sobre as aparências, a personagem relaciona os ratos

Seminário dos ratos • No discurso sobre as aparências, a personagem relaciona os ratos com os pés inchados e com os chinelos. O aspecto que estes três elementos têm em comum é que são todos indesejáveis para a personagem: o rato, pela ameaça da invasão, epidemia e destruição (além de prejudicarem sua gestão e pôr em dúvida sua competência de zelar pelo bem-estar coletivo), o pé enfermo por denunciar sua deficiência física, e os chinelos, finalmente, por revelarem um status inferior, uma espécie de destituição de seu poder. Também não agrada ao secretário saber que o americano é um especialista em jornalismo eletrônico, solicitando ser informado sobre todas as notícias veiculadas a esse respeito na imprensa a partir dali. Já se encontram no sétimo seminário e ainda não solucionaram o problema dos roedores, porém não desejam ajuda estrangeira. O jovem Relações Públicas conta que a primeira crítica levantada fora a própria escolha do local para o seminário – uma casa de campo isolada -, e a segunda questão se referia aos gastos demasiados para torná-la habitável: tem tanto edifício em disponibilidade, que as implosões até já se multiplicam para corrigir o excesso. E nós gastando milhões para restaurar esta ruína. .

Seminário dos ratos • O chefe continua relatando sobre um repórter que criticou a

Seminário dos ratos • O chefe continua relatando sobre um repórter que criticou a medida do governo e este torna-se alvo do ataque dos dois homens: estou apostando como é da esquerda, estou apostando. Ou, então, amigo dos ratos, diz o secretário. Franz sublinha que a sombra, o que é inaceitável para a consciência, é projetada num oponente, enquanto a pessoa se identifica com uma autoimagem fictícia e com o quadro abstrato do mundo oferecido pelo racionalismo científico, algo que provoca uma perda constantemente maior do instinto e, em especial, uma perda do amor ao próximo, tão necessário ao mundo contemporâneo.

Seminário dos ratos • Entretanto, o jovem chefe salienta a cobrança de resultados por

Seminário dos ratos • Entretanto, o jovem chefe salienta a cobrança de resultados por parte da mídia. Acentua que, na favela, as ratazanas é que andam de lata d’água na cabeça e reafirma ser uma boa ideia a reunião se realizar na solidão e ar puro da natureza no campo. Nesta primeira afirmação, percebe-se uma total falta de sensibilidade, empatia, solidariedade e humanidade para com os favelados: tanto faz que sejam as Marias ou as ratazanas que precisem carregar latas d’água na cabeça. Esta parte do conto é reforçada pela citação supracitada. Neste momento, o secretário ouve um barulho tão esquisito, como se viesse do fundo da terra, subiu depois para o teto. . . Não ouviu mesmo? , porém o jovem relações públicas nada ouve. O secretário encontra-se tão paranoico com a questão dos ratos e do seminário, que desconfia da possibilidade de um gravador estar instalado veladamente, talvez da parte do delegado americano. O relações públicas conta ainda que o assessor de imprensa sofrera um pequeno acidente de trânsito, estando com o braço engessado.

Seminário dos ratos • No prosseguimento da conversa, um ato falho do secretário faz

Seminário dos ratos • No prosseguimento da conversa, um ato falho do secretário faz confundir braço com perna quebrada. Franz faz ver que os braços são em geral os órgãos de ação e as pernas nossa postura na realidade. O jovem chefe diz que o assessor de imprensa dará as informações pouco a pouco por telefone, mas que virão todos ao final, para o que ele denomina "uma apoteose". A tradução do texto latino Finis coronat opus, ou seja, "o fim coroa a obra", evidencia que para ele não importam os meios. Denuncia-se desse modo a falta de princípios éticos das personagens. O secretário confessa se preocupar com a incomunicabilidade, preferindo que os jornalistas ficassem mais perto, ao que o jovem assessor contraargumento que a distância e o mistério valorizam mais a situação. A preocupação da personagem é com o mundo externo, com os meios de comunicação, com as boas notícias, mesmo que inverídicas. Entretanto, permanece incomunicável com seu mundo interno, não lhe dando atenção.

Seminário dos ratos • O secretário pede inclusive para seu assessor inventar que os

Seminário dos ratos • O secretário pede inclusive para seu assessor inventar que os ratos já estão estrategicamente controlados. Fica evidenciada no diálogo a manipulação da informação, principalmente na vocalização do chefe: [. . . ] os ratos já se encontram sob controle. Sem detalhes, enfatize apenas isto, que os ratos já estão sob inteiro controle. Além disso, aqui são visíveis os mecanismos da luta pelo poder: o binômio mandante/poder – executor/submissão representa parte de um sistema sócio-político explorador e falso, prevalecendo a atitude de ludibriar. • Novamente, o secretário chama a atenção para o barulho que aumenta e diminui. Olha aí, em ondas, como um mar. . . Agora parece um vulcão respirando, aqui perto e ao mesmo tempo tão longe! Está fugindo, olha aí. . . , mas o chefe das relações públicas continua a não escutar. A comparação com forças poderosas e potencialmente destrutivas da natureza mostram o quanto ele estava apreensivo. O barulho desconhecido e esquisito que persegue o secretário aparece como uma ameaça severa, como se algo já existente em potencial estivesse por acontecer.

Seminário dos ratos • O secretário afirma que escuta demais, devo ter um ouvido

Seminário dos ratos • O secretário afirma que escuta demais, devo ter um ouvido suplementar. Tão fino. e que é o primeiro a ter premonições quando coisas anormais acontecem, evocando sua experiência na revolução de 32 e no golpe de 64. Esta verbalização aponta indícios de que a sede do sétimo seminário é o Brasil, ao menos como inspirador do país ficcional do texto. No entanto, o cenário é ampliado para a América do Sul, com o uso repetido do termo "bueno" pelo jovem assessor, em várias de suas vocalizações, e o nome da safra do vinho, mais adiante analisado. Respira-se uma atmosfera latina em função disto. Em geral há um tom de tragédia, típico da simbologia isomorfa das trevas.

Seminário dos ratos • • • O jovem assessor lança um olhar suspeitoso sobre

Seminário dos ratos • • • O jovem assessor lança um olhar suspeitoso sobre uma imagem de bronze: aqui aparece, sob a forma de uma estatueta – da justiça – uma figura feminina no conto: tem os olhos vendados, empunha a espada e a balança. Desta, um dos pratos está empoeirado, novamente numa alusão à situação de injustiças em que vive o país. A balança é o elemento mais evidenciado da imagem, como se estivesse em primeiro plano. Através dessa alegoria, há como um convite para refletir sobre as diferentes polaridades que se evidenciam, já que se trata de um instrumento que serve para medir e pesar o equilíbrio de duas forças que se colocam em pratos opostos: bem estar x mal estar, pé sadio x doente, ratos x governo, mansão x ruína. Os dualismos apontados acabam por sintetizar uma confrontação simbólica entre homens e animais, entre racionalidade e irracionalidade. A espada é o símbolo por excelência do regime diurno e das estruturas esquizomorfas. A arma pode representar a reparação e o equilíbrio entre o bem e o mal. No tecido do conto, a imagem da espada nas mãos da justiça adquire sentido de separação do mal. Neste conto, a correspondência das situações e personagens apresentadas corrobora uma significação dualista, através do uso de antíteses pela escritora. Somente então o secretário faz menção ao pé enfermo, usando o termo "gota" pela primeira vez na narrativa.

Seminário dos ratos • E o jovem assessor de imediato canta Pode ser a

Seminário dos ratos • E o jovem assessor de imediato canta Pode ser a gota d’água!, estribilho da canção popular do compositor Chico Buarque de Holanda, na época um crítico dos fatos políticos do país. A associação musical do chefe parece não agradar ao secretário. O jovem chefe defende-se, dizendo ser uma música cantada pelo povo, ao que o secretário aproveita a deixa para declarar que só se fala em povo e no entanto o povo não passa de uma abstração [. . . ] que se transforma em realidade quando os ratos começam a expulsar os favelados de suas casas. Ou roer os pés das crianças da periferia. O secretário complementa que quando a "imprensa marrom" começa a explorar o fato, aí "o povo passa a existir". • Na afirmação de que o povo não existe enquanto realidade, o secretário parece ser um secretário mais para privado do que para público, porém é forçado a reconhecer o povo quando suas mazelas e infortúnios aparecem nos jornais, expostos em manchetes, o que muito abomina.

Seminário dos ratos • • • Na rede de intertextualidade do Seminário dos ratos,

Seminário dos ratos • • • Na rede de intertextualidade do Seminário dos ratos, a alusão à canção "Gota d’água" completa uma série de referências presentes no conto a poetas brasileiros: Carlos Drummond de Andrade, Chico Buarque de Holanda, Vinícius de Moraes, presentes no texto. Poderíamos contar ainda com a presença da letra de "Lata d’água", música de carnaval tipicamente brasileira. É como se a narrativa quisesse enfatizar as coisas boas do país, em contraponto com a situação política vigente. Outra teia intertextual possível é o conto de fadas O flautista de Hamelin: a personagem-título livra a população da peste dos ratos apenas com sua música. A condução/expulsão dos ratos para longe é um contraponto ao texto de Lygia, que, por sua vez, trata da chegada de ratos. Órgãos públicos como RATESP – numa clara referência aos ratos e à cidade de São Paulo – parecem não alcançar nenhum resultado contra os ratos que se multiplicam em uma cidade sem gatos exterminadores. O secretário lembra também que no Egito Antigo, resolveram esse problema aumentando o número de gatos, ao que o assessor responde que aqui o povo já comera todos os gatos, ouvi dizer que dava um ótimo cozido!, em uma resposta claramente irônica, aludindo ao fato de que o povo estaria esfaimado a ponto de comer carne de gato.

Seminário dos ratos • Com o escurecer, o jovem relações públicas recorda que o

Seminário dos ratos • Com o escurecer, o jovem relações públicas recorda que o jantar será às oito horas, e a mesa estará decorada com a cor local: orquídeas, frutas, abacaxi, lagostas, vinho chileno. O preparo cuidadoso e aparência requintada do alimento não o afastará de ao final tornar-se comida dos animais. Aqui aparece outro fio intertextual – com a política de outro país da América do Sul, o Chile - pois na narração o nome da safra do vinho é Pinochet, referência explícita ao ditador na época da publicação do conto, recentemente julgado por seus atos. • O ruído retorna de forma bem mais forte: agora o relações públicas identifica-o, levantando-se de um salto. Aparece a satisfação do secretário ao ver confirmadas suas intuições, porém ele mal imagina que esta satisfação logo irá também por sua vez inverter-se, pois é a confirmação de um barulho prenunciador da catástrofe que logo a seguir se abaterá sobre o casarão, o ruído surdo da invasão dos ratos que se articula. Novamente compara com vulcão ou bomba, e o jovem assessor sai apavorado murmurando: Não se preocupe, não há de ser nada, com licença, volto logo. Meu Deus, zona vulcânica? !. .

Seminário dos ratos • No corredor, ele encontra-se com Miss Glória, secretária da delegação

Seminário dos ratos • No corredor, ele encontra-se com Miss Glória, secretária da delegação americana, a única personagem feminina do conto, com quem conversa rapidamente em inglês, praticando seu aprendizado de idiomas. Parece haver uma ironia também no nome, pois contrariamente à glória esperada, o seminário parece fadado ao fracasso. Ela tem um papel secundário no seminário, que aparece como um evento de poder eminentemente masculino. O chefe encontra-se em seguida com o diretor das classes conservadoras armadas e desarmadas, vestido com um roupão de veludo verde e encolheu-se para lhe dar passagem, fez uma mesura, ‘Excelência’ e quis prosseguir mas teve a passagem barrada pela montanha veludosa, e ainda lhe admoesta sobre o ruído e o cheiro. Informa-lhe que os telefones estão mudos (no país os meios de comunicação estavam sob censura), o que o surpreende. A comparação que a escritora faz com uma montanha veludosa, em correspondência ao chambre de veludo verde, neste contexto, alude à cor do conservadorismo e do poder. Trata-se de cor muito utilizada pela escritora, já referido em outros contos. O uso desta cor na obra da escritora é tão notável, que mereceu análise de Fábio Lucas no ensaio Mistério e magia: contos de Lygia Fagundes Telles.

Seminário dos ratos • Neste momento surge a personagem do cozinheiro-chefe, que anuncia a

Seminário dos ratos • Neste momento surge a personagem do cozinheiro-chefe, que anuncia a rebelião dos animais, aparece correndo pelo saguão – sem gorro e de avental rasgado – com mãos sujas de suco de tomate que limpa no peito, a cor vermelha em clara alusão a sangue, revolução, esquerda – dizendo aos gritos que acontecera algo horrível: Pela alma de minha mãe, quase morri de susto quando entrou aquela nuvem pela porta, pela janela, pelo teto, só faltou me levar e mais a Euclides! - os ratos haviam comido tudo, só se salvara a geladeira. Relata, como o secretário, que o barulho fora percebido antes, feito um veio d’água subterrâneo. Depois havia sido um apavoramento, um espanto com aquela invasão despropositada e aterrorizante em meio aos preparativos para o seminário. O estranhamento que causa a invasão dos ratos dentro desta atmosfera é abrupta, apesar dos indícios, pois não existe uma explicação lógica da desmesura dos ataques. A violência do ocorrido, de uma certa forma, reflete aspectos "monstruosos" dentro do homem, e que também dá a medida de como a sociedade se constitui. Aqui, o fato fantástico instala-se no âmago do real, confundindo os parâmetros racionais e provocando uma ruptura da ordem do cotidiano. A não resolução da narrativa e o sistema metafórico fazem da narração, um drama e da leitura, um exercício conflitiva.

Seminário dos ratos • O jovem assessor preocupa-se com as aparências, pedindo que o

Seminário dos ratos • O jovem assessor preocupa-se com as aparências, pedindo que o cozinheiro-chefe fale baixo, não faça alarde sobre os acontecimentos. A cozinha é, no conto, o local por onde inicia a invasão dos roedores. • Como é sugerido desde o título do conto, os agentes instauradores da estranheza são os ratos, símbolos teriomórfico, uma vez que se constituem responsáveis pela invasão, tomando conta do espaço físico conhecido, e pela destruição do local. Convertem-se no centro das preocupações das personagens e, depois, no ponto deflagrador do pânico. Os atributos desses animais significam o poder destruidor do tempo, possuindo uma grande resistência ao extermínio. Ratos são considerados animais esfomeados, prolíficos e noturnos, aparecendo como criaturas temíveis, até infernal. No conto, os ratos são totalmente subversivos, no sentido de corroerem a ordem e estabelecerem o caos e o terror.

Seminário dos ratos • Na sequência do conto, o jovem chefe tenta que o

Seminário dos ratos • Na sequência do conto, o jovem chefe tenta que o cozinheiro volte à cozinha, porém este mostra que a gravidade da situação não está sendo compreendida pelo jovem: nenhum carro está funcionando [. . . ] Os fios foram comidos, comeram também os fios, ir embora só se for a pé, doutor. Foram retirados todos os símbolos que remetem à acessibilidade e à comunicação com o mundo exterior, e agora, sem subterfúgios externos para se salvarem, somente restam suas próprias forças e recursos. Os ratos devastaram toda a infraestrutura do VII Seminário de Roedores. O relações públicas com olhar silencioso foi acompanhando um chinelo de debrum de pelúcia que passou a alguns passos do avental embolado no tapete: o chinelo deslizava, a sola voltada para cima, rápido como se tivesse rodinhas ou fosse puxado por algum fio invisível. • Esta imagem é dúbia, não se sabe se o secretário está sendo arrastado junto com o chinelo ou se o chinelo é o que resta do corpo devorado; voltemos à sua premonição: o pé fora roído por ratos como o das crianças pobres? De qualquer forma, o destaque é dado para o chinelo, justamente aquilo que fora desprezado pela personagem: era tudo o que restara de si.

Seminário dos ratos • • Nesse momento a casa é sacudida em seus alicerces

Seminário dos ratos • • Nesse momento a casa é sacudida em seus alicerces por algo que parece uma avalanche e as luzes se apagam. Invasão total. O texto compara a irrupção dos animais aos milhares, brotando do nada e de todos os lugares, a uma erupção vulcânica, incontrolável. A própria narrativa vai avisando que foi a última coisa que viu, porque nesse instante a casa foi sacudida nos seus alicerces. As luzes se apagaram. Então deu-se a invasão, espessa como se um saco de pedras borrachosas tivesse sido despejado em cima do telhado e agora saltasse por todos os lados numa treva dura de músculos, guinchos e centenas de olhos luzindo negríssimos. Do ataque rapidíssimo dos roedores, salva-se somente o chefe das relações públicas, que se refugia entrincheirando-se na geladeira: arrancou as prateleiras que foi encontrando na escuridão, jogou a lataria para o ar, esgrimiu com uma garrafa contra dois olhinhos que já corriam no vasilhame de verduras, expulsou-os e, num salto, pulou lá dentro, mantendo-a aberta com um dedo na porta para respirar, logo em seguida substituindo-o pela ponta da gravata.

Seminário dos ratos • No início do conto, a gravata representa o status, o

Seminário dos ratos • No início do conto, a gravata representa o status, o prestígio, o mundo das aparências. Já no final, aparece como símbolo de sobrevivência. Há aqui, portanto, uma transformação de um símbolo em função das ameaças e do perigo que se apresentaram à personagem, modificando o contexto. E ainda pode-se apontar mais uma inversão: as pessoas fogem espavoridas enquanto os ratos se instalam, e o chefe das relações públicas esconde-se na cozinha (depósito de mantimentos) como se fosse um rato. • Aqui tem-se o início do segundo bloco. Em flashback, avisase ao leitor que, após os acontecimentos daquele dia, houve um inquérito – medida obscura que ocorria no panorama do país naquela época. É a única coisa que o narrador conta de concreto após os fatos.

Seminário dos ratos • O elemento invasor, portanto, conseguiu exterminar o seminário. • A

Seminário dos ratos • O elemento invasor, portanto, conseguiu exterminar o seminário. • A estada do jovem chefe no interior da geladeira parece ter se constituído em um ritual de passagem, até mesmo um cerimonial, pois de um certo modo ele não renasceu? Afinal, somente ele sobreviveu e regressou ao social para relatar, tendo ficado privado de seus sentidos, que ficaram enregelados durante um tempo. A personagem, buscando refúgio na geladeira, tenta sobreviver e se salvar.

Seminário dos ratos • Aqui o narrador suspende a história. Este final é ambíguo,

Seminário dos ratos • Aqui o narrador suspende a história. Este final é ambíguo, talvez em uma alusão aos ratos se reunindo para realizar o VII Seminário dos Roedores, deliberando e decidindo o destino do país em lugar dos homens dizimados. . . Após a iluminação do casarão, inicia-se uma nova era, governada pelo mundo das sombras, com os ratos assumindo o poder. • Todo o conto é filtrado por indicativos do fantástico, tendo seus limites no alegórico. Predomina a inversão e os animais corporificam o duplo. O clima permanente é o medo apavorante de algo que se desconhece – e principalmente, que não se controla. E sob esta capa do fantástico, Lygia compôs um conto denunciador da situação não menos terrificante em que vivia o país, abordando uma temática sobre as complexas relações entre o bem e o mal-estar coletivo e pessoal. O atributo sobrenatural – a hesitação experimentada por um ser que só conhece as leis naturais, face a um acontecimento aparentemente sobrenatural, aparece neste conto, fazendo o leitor hesitar ao realizar a interpretação.

Seminário dos ratos • Esta narrativa de Lygia é outro exemplo da literatura como

Seminário dos ratos • Esta narrativa de Lygia é outro exemplo da literatura como duplo, ou seja, o próprio conto como um todo é uma duplicidade de uma situação real. Uma situação política de um país, as forças militares que nele operavam, praticamente toda sua doença social personificadas nas personagens que se desdobram, os ratos como imagem de um povo faminto de liberdade e justiça que refletem (se duplicam) no conto literário. O epílogo do conto prova a existência do povo, sob forma de ratos rebelados, que mostra sua revolta e vingança, ao contrário da crença do secretário, de que ele não existiria. Neste conto, na luta entre os homens do poder e os ratos (os duplos - representantes do fantasmático), os vencedores são aparentemente estes últimos, que conseguem aniquilar com o VII Seminário. Porém, o final ambíguo (com a iluminação da mansão) e a sobrevivência do Chefe das Relações Públicas podem encaminhar a outras possibilidades de interpretação. Porém, a dúvida se instala: se os ratos haviam roído a instalação elétrica, de onde provinha a iluminação? Mais um enigma proposto pelo fantástico.

Seminário dos ratos • Este conto, por se tratar de uma temática social, distingue-se

Seminário dos ratos • Este conto, por se tratar de uma temática social, distingue-se dos demais e traz um diferencial. Uma praga sobrenatural de ratos: eis a fantasia de Lygia Fagundes Telles para dizer de sua indignação com a situação do país e com a censura instalada. Os ratos aqui aparecem como elementos que subvertem a ordem estabelecida. A ironia, o humor negro e o sentido crítico perpassam as linhas dessa história satírica, sem abandonar o sentido de uma invasão sobrenatural dos animais. A inversão de papéis realizada entre os animais e os homens apresenta-se como a principal característica do fantástico e do duplo nesse tenso universo representado no conto.

A confissão de Leontina SÍNTESE • A mulher está na cadeia, presa por ter

A confissão de Leontina SÍNTESE • A mulher está na cadeia, presa por ter assassinado um homem em legítima defesa. Ela conta sua triste história de vida, desde a infância, a uma senhora que se propôs a escutá-la

A confissão de Leontina • A Confissão de Leontina - Quinto conto do livro:

A confissão de Leontina • A Confissão de Leontina - Quinto conto do livro: a narradora é uma mulher pobre e de pouco verniz cultural, que reclama por não confiar em ninguém da cidade grande. Nasceu na pequena cidade Olhos D’Água e mal sabe ler e escrever, além de não ter ninguém por ela no mundo. Lembra do primo Pedro que, ao derrubar a pequena Luzia, irmã da narradora, atingiu o cérebro da menina, criada desde ali como um vegetal. • A mãe de Luzia e dela, Leontina, era uma lavadeira que criara o filho da irmã, Pedro. Os poucos centavos, a melhor comida, a escola, tudo só dava a ele, em quem depositava falsas esperanças. Quando ela morreu, Leontina foi ser lavadeira. E também na formatura de Pedro, Luzia afogouse. Pedro não a quisera no colégio, mal podia aturar a miséria da nossa narradora. Forma-se, pega o que pode e vai para São Paulo estudar medicina e fazer o possível para vencer e esquecer Leontina e todo aquele horrível passado de pobre. Obrigou-a a vender tudo que tinha e entregoua aos cuidados de um padre que a empregou na casa de uma perversa mulher, mãe de um filho que quis abusar de Leontina.

A confissão de Leontina • Nossa heroína vai à luta na cidade grande fugindo

A confissão de Leontina • Nossa heroína vai à luta na cidade grande fugindo do interior. Dançarina de aluguel, prostituta e. . . assassina? Com tantos elementos assim, Lygia entrega ao leitor sua visão confortável de todo o nosso desconforto. É como perguntaria Machado de Assis sobre Dona Plácida, de Memórias Póstumas de Brás Cubas: para que existir deste modo? • A narradora dirige-se a alguém que mal conseguimos distinguir. Há um tom de tragicômico, desespero. A morte da mãe e da cachorra Titã no mesmo parágrafo revela que o mundo é dos fortes: Pedro venceu, mesmo quando nega conhecer Leo como sua prima. O primeiro “amor” da vida dela, já dançarina de aluguel: um marinheiro; seu primeiro vestido: aquele que vestiria na mãe para enterrá-la e que lhe foi deixado como herança. • Minha mãe vivia lavando roupa na beira da lagoa (. . . ) nunca vi minha mãe se queixar. Era miudinha e tão magra que até hoje fico pensando onde ia buscar forças para trabalhar tanto não parava (. . . ) Pedro precisava estudar para ser médico. Prometera a irmã e todos passavam necessidades em nome dele. E ele as renegava.

A confissão de Leontina • • Não podemos aqui falar em felicidade. Leontina é

A confissão de Leontina • • Não podemos aqui falar em felicidade. Leontina é uma Macabreia (de A Hora da Estrela, de Clarice Lispector, 1977) que foi à luta e acabou na prisão. Lygia vai tecendo a trama desta pequena novela. Onde está a narradora? O que aconteceu com ela para estar assim? Com quem fala? A ruptura com o tempo cronológico faz o leitor viajar na mente tortuosa e ao mesmo tempo simplista da personagem. '“Essa daí não é a tua irmã? ", um menino perguntou. Mas Pedro fez que não e foi saindo. Fiquei sozinha no palco com um sentimento muito grande”, diz diante da primeira negativa de Pedro. “Não conheci meu pai. Morreu antes de você nascer, respondia minha mãe sempre que eu perguntava”. A narrativa é fragmentada e trabalha o discurso indireto livre imprimindo ao texto um ritmo ágil: “Meu pai feito um Deus desaparecendo atrás da montanha com sua capa de nuvem num carro de ouro”. É um pai mítico e a menina o cria com elementos do seu universo particular: as nuvens, quando se deitava na beira da lagoa e escolhia a cara que o pai devia ter. A velha Gertrude (e o filho João Carlos), sua primeira “patroa”, a tratara como um animal: “Nem pra ir ao banheiro eu tinha sossego que ela ficava rodando a porta e resmungando que eu devia estar cagando prego pra demorar tanto assim”.

A confissão de Leontina • • • Na fuga de trem, ela vê uma

A confissão de Leontina • • • Na fuga de trem, ela vê uma “estrelinha verde brilhando lá longe” que a acalma e também nos transmite o grau poético da cena. Rogério era o nome do marinheiro com quem ela “se perdeu”. Um quartinho de hotel / pensão barato. Ele a chamara de Joana e não de Leontina: “Seu cabelo encacheado é igual ao de São João do carneirinho”. Segunda referência à Bíblia, Pedro faz a primeira: “Conte só com você que todo mundo já está até as orelhas de tanto problema e não quer nem ouvir falar do problema do outro”, sentencia Rogério ao prometer levá-la para conhecer o mar, comer uma peixada em Santos: “Aprendi a tomar banho com Rogério. Você tem que tomar banho todo dia e lavar as partes (. . . ) em casa a gente só tomava banho de bacia em dia de festa, mas outras vezes só lavava o pé. E na casa da patroa ela não gostava que eu me lavasse pra não gastar água quente”. Às vezes o verde da tal estrelinha ou do sabonete do marinheiro esbarram com nossa frieza de leitor: “Não sei por que pensei no meu pai quando Rogério passou o braço por baixo da minha cabeça e me chamou, Vem Joana”. Depois da vírgula o “v” maiúsculo do “vem”. Uma felicidade clandestina e efêmera de fazer amor e fumar. Dava tristeza “fazer amor” com Rogério: ia “com cara de boi indo pro matadouro”. "Ele dizia que minhas sobrancelhas eram como as asas das gaivotas. ”

A confissão de Leontina • Ele se foi. Ela decai e numa pensão, cheia

A confissão de Leontina • Ele se foi. Ela decai e numa pensão, cheia de artistas de circo, conhece Rubi, quem levou Leontina para lá foi o Milani, colega de Rogério. Personagem secundário mas Lygia os tece com carinho de mãe. • Leontina trabalha em inferninhos rodeada da escória típica destes locais: “Nunca dizia não pro freguês”. • A segunda vez que encontra Pedro, e ele fingiu não conhecê-la, foi na enfermaria da Santa Casa. Aqui a narradora faz a inevitável comparação com Jesus. Leontina é tentada. • Ao apreciar um vestido marrom com rosa de vidrilho vermelho no ombro, ela é assediada por um velho rico dono de jornais “e mais isso e mais aquilo”: “Amaldiçoada para que enveredei por aquela rua e parei naquela vitrina. O vestido estava numa boneca e tinha o meu corpo”.

A confissão de Leontina • O duplo está estabelecido: o jogo completamente armado. O

A confissão de Leontina • O duplo está estabelecido: o jogo completamente armado. O ritual do sacrifício se encaminha para um desfecho dramático: ela deixa na loja o vestido branco. O velho a proíbe de voltar. Ele lhe comprara o vestido que ela queria. A estrada, o repúdio, o carrão, a estrada: “Era rico e feio com aquele jeito de peru do bico mole molhado de cuspe (. . . ) boca inchada e roxa como se tivesse levado um murro”. • “O bofetão veio nessa hora e foi tão forte que me fez cair no banco (. . . ) o punho do velho desceu fechado na minha cara. Foi como uma bomba (. . . ) achei uma coisa pura e fria no chão. Era o ferro. . . ”. • Depois de tudo ela volta à loja para buscar o vestido branco a polícia está lá. A vendedora dera a reconhecer.

Missa do galo SÍNTESE • Versão moderna de um conto homônimo de Machado de

Missa do galo SÍNTESE • Versão moderna de um conto homônimo de Machado de Assis, no qual a personagem Conceição, mostra-se sedutora e sensual em seu diálogo com o garoto Nogueira.

Missa do galo • Neste conto, Lygia disseca a intertextualidade com o conto de

Missa do galo • Neste conto, Lygia disseca a intertextualidade com o conto de Machado de Assis, no qual nos é apresentada uma mulher da segunda metade do século XIX: Conceição, casada, vítima de um marido adúltero, que a deixa praticamente só numa noite de Natal. Esta senhora mantém um insinuante diálogo com um hóspede adolescente, o Nogueira (que é leitor, tal qual a senhora, de romances românticos, como Os três mosqueteiros, ou os do senhor Joaquim Manuel de Macedo). Ele faz hora esperando um amigo para juntos irem à tal missa do galo. • Ela “deixou travesseiro e quarto numa disponibilidade sem espartilho, livre o corpo” e Lygia cria um narrador que vai invadindo o espaço do não dito, nas entrelinhas, de Machado, coloca até na alcova do adúltero com uma certa “mulata”.

Missa do galo • A relação do jovem Nogueira com Conceição também é, digamos

Missa do galo • A relação do jovem Nogueira com Conceição também é, digamos assim, intensificada nesta recriação. Lygia apimenta-a, vasculha-a como um psicanalista provocador. • O insólito é observado: “Durante o dia Conceição parece tão objetiva, eficiente. E agora esta inconsistência”. Seu narrador observa pelas vidraças da casa, ele está na rua da “noite antiguíssima”. Sente desejo de entrar e vive um tempo anacrônico como a interferência de uma lembrança de algo escrito em um caminhão (!): “Matérias perecíveis”. Mas “aquela casa”, o narrador contrapõe, é “imperecível”, no ”bojo de tempo”. A obra de Machado. • Conceição: “bruxa” ou “belíssima”? Quer gritar, é hora de calar: “Vocês sabem que dentro de alguns minutos será nunca mais? ”, pergunta-nos. O menino de 17 anos estará na igreja e ela no quarto.

Missa do galo • Parece Clarice Lispector, amiga de Lygia: “Faça alguma coisa”, pede

Missa do galo • Parece Clarice Lispector, amiga de Lygia: “Faça alguma coisa”, pede o narrador insistentemente com o coração pesado diante desses dois indefesos no tempo. • Metalinguagem e intertextualidade aqui se confundem quando o amigo do rapaz chega, ele vai para a missa, Conceição volta para o quarto e o narrador conclui: • Quando volta ao quarto, pisa na tábua do corredor, aquela que range. Rangeu, paciência! Agora está desinteressada da mãe e da tábua. No canapé, a almofadinha das guirlandas um pouco amassada. Apago o lampião.

A estrutura da bolha de sabão SÍNTESE • A narradora reencontra, depois de anos,

A estrutura da bolha de sabão SÍNTESE • A narradora reencontra, depois de anos, uma antiga paixão, um físico, que agora estava casado e à beira da morte e estudava a estrutura da bolha de sabão.

A estrutura da bolha de sabão • A estrutura da bolha de sabão -

A estrutura da bolha de sabão • A estrutura da bolha de sabão - Neste conto, que dá título à obra, Lygia cria um narrador em primeira pessoa: uma mulher que encontra o ex-marido com a atual esposa num bar. Sente ciúme e testa a incomunicabilidade entre os seres, a aprendizagem dos sentimentos: uma delicada teia de relacionamentos. Ele é físico e estuda a estrutura da bolha de sabão (sólida / líquida / gasosa): híbrida. Ele, ela percebe aos poucos, está com uma doença terminal. Ela pensa na própria infância, revê sua vida em labirinto: “No escuro eu sentia essa paixão contornando sutilíssima meu corpo”. Lygia é dona de uma sintaxe especial, particular. Pratica o intimismo com maestria. Sua poesia narrativa é uma espécie de ritual sem sangue, sem grito: “Amor de transparência e lembranças condenado à ruptura”.

A estrutura da bolha de sabão • Em relação à outra mulher, a narradora

A estrutura da bolha de sabão • Em relação à outra mulher, a narradora mostra-se superior: “Como ele podia amar uma mulher assim? ”. São frases insólitas como: “Me refugiei nos cubos de gelo amontoados no fundo do copo”. Ela tem ciúmes e ao saber da doença do ex-marido vai à casa dele. É recebida pela fulana que agora ocupa o “seu” lugar. Quando a “outra” sai, ela se aproxima do homem que já foi seu. Ela não tem nome no conto. Ela flui. Ele usa um roupão verde, mãos “branquíssimas”, está quase lívido. Ela começa a sentir uma falta e não sabia do que era. Descobre: “Ô! Deus – agora eu sabia que ele ia morrer”. • Este final vago e brusco nos conduz ao amor interrompido, petrificado em narrativa de prosa lírica, urbana, metafísica.

A caçada SÍNTESE • Um homem visita uma loja de antiguidades e fica fascinado

A caçada SÍNTESE • Um homem visita uma loja de antiguidades e fica fascinado com uma tapeçaria que está na parede. Ele se sente preso à imagem, como se fizesse parte da caçada a qual ela ilustrava.

A caçada • A caçada • Em A Caçada, de 1965, Lygia Fagundes Telles

A caçada • A caçada • Em A Caçada, de 1965, Lygia Fagundes Telles emprega um narrador extradiegético, com relação ao nível narrativo, e heterodiegético, quanto à sua relação com a história, ou seja, a voz que conta está ausente da história. • O cenário é uma loja de antiguidades e é apresentado ao leitor por meio do discurso narrativizado. Para compor o espaço físico onde a ação irá se desenvolver, o narrador emprega imagens de percepção sensória. Assim, o leitor sente o cheiro da loja: “tinha o cheiro de uma arca de sacristia com seus panos embolorados e livros comidos de traça” (p. 41); tem a sensação do tato, por intermédio da personagem, que, “com a ponta dos dedos” (p. 41), toca em uma pilha de livros; vê detalhes do lugar, “uma mariposa levantou voo e foi chocar-se contra uma imagem de mãos decepadas” (p. 41). • As imagens literárias produzidas com o uso de detalhes transferem maior verossimilhança à narrativa. •

A caçada • Existem duas personagens, uma velha, provavelmente a dona da loja, ou

A caçada • Existem duas personagens, uma velha, provavelmente a dona da loja, ou então uma funcionária, há muito tempo no estabelecimento, e um homem, que vai ao estabelecimento atraído por uma tapeçaria antiga, com a representação de uma caçada. As personagens não têm nome e o narrador não faz descrições sobre seus aspectos físicos para caracterizá-las. O tempo da história abrange um período de dois dias. No primeiro dia, o homem vai à loja de antiguidades. • No dia seguinte, o segundo dia da história, o homem vai, novamente, à loja de antiguidades, mais cedo do que de costume, " – Hoje o senhor madrugou. ” (p. 44). Essa mesma personagem diz para o homem “Pode entrar, pode entrar, o senhor conhece o caminho. . . ” (p. 44), referindo-se ao local onde está pendurada a tapeçaria, na loja. O homem murmura “Conheço o caminho” (p. 44), referindo-se ao caminho do bosque, representado na tapeçaria.

A caçada • Chega-se, então, ao clímax da narrativa. Mais uma vez, são empregadas

A caçada • Chega-se, então, ao clímax da narrativa. Mais uma vez, são empregadas imagens sensoriais: “aquele cheiro de folhagem e terra” (p. 44), “a loja foi ficando embaçada” (p. 45), “seus dedos afundaram por entre galhos e resvalaram pelo tronco de uma árvore” (p. 45). Nesse trecho se alternam as focalizações externa e interna, caracterizando a mistura do real e do fantástico, e retratando o possível delírio pelo qual passa o homem. “Imensa, real só a tapeçaria a se alastrar sorrateiramente pelo chão” (p. 45), passa a impressão de que apenas a tapeçaria é real, tudo o mais são elementos do delírio da personagem. Observe-se o segmento em discurso indireto livre: “Era o caçador? Ou a caça? Não importava, não importava, sabia apenas que tinha que prosseguir correndo sem parar por entre as árvores, caçando ou sendo caçado. Ou sendo caçado? . . . ” (p. 45).

As formigas SÍNTESE • Duas estudantes hospedam-se em um quarto de pensão. À noite,

As formigas SÍNTESE • Duas estudantes hospedam-se em um quarto de pensão. À noite, elas veem formigas misteriosas andando pelo quarto e indo em direção a uma caixa de ossos− os insetos montam o esqueleto de um anão.

As formigas • O enredo do conto se passa em uma pensão simples, na

As formigas • O enredo do conto se passa em uma pensão simples, na qual duas estudantes, e primas, resolvem morar para ficar mais perto da universidade. Quem conta a história é a própria protagonista, portanto vemos o ocorrido através dos olhos de quem viveu tudo que aconteceu. • Logo de início, sabemos que tudo se passa à noite. A protagonista começa dizendo que já era quase noite, ou seja, que a luz do dia já estava indo embora. Aliás, durante todo o conto, pouco sabemos a respeito da vida diurna das protagonistas, uma estudante de medicina e outra de direito. • A pensão é um lugar decadente, apresentado a nós como um lugar velho, triste, sombrio e até um pouco assustador. As personagens obviamente não desejam ficar ali, mas infelizmente não há muito escolha, já que o lugar é o único que poderiam pagar. A narradora conta ainda que ainda antes de entrar, ambas ficaram imóveis, avaliando a fachada da pensão, que parecia um rosto entristecido. • Elas entram na pensão decadente, em salas escuras e móveis velhos. Até a mulher que as atende parece algo triste, envelhecido, vestida em pijamas.

As formigas • • Assim que as moças chegam ao quarto, percebem que o

As formigas • • Assim que as moças chegam ao quarto, percebem que o antigo morador esqueceu um pertence, um caixote deixado em um canto. Curiosas, resolvem avaliar o que tem dentro e percebem um conjunto de ossos. A estudante de medicina, logo se interessa, e avaliando mais de perto, percebe que o conjunto, apesar de estar totalmente completo, é bastante pequeno, e portanto que se trata de um raro esqueleto de anão. Resolvem então dormir, e no meio da noite, e todas as noites que se seguirão, serão preenchidas com um forte cheiro de bolor e uma invasão quase inacreditável de formigas. O rastro dos animais segue sempre para debaixo da cama, mas especificamente para dentro do caixote de ossos, que fora guardado ali. O que deixa tudo ainda mais intrigante e estranho, é que na primeira noite naquele quarto, a protagonista ainda nos conta que teve um sonho um pouco bizarro, no qual um anão de olhos azuis a fitava firmemente. Ao perceberem as formigas, as primas se perguntam o que poderia ter chamado a atenção dos animais para os ossos. Uma delas então abre o caixote e percebe que os ossos mudaram de posição. Mesmo assim, resolvem simplesmente matar as formigas e voltar a dormir.

As formigas • Na noite seguinte, as moças percebem o mesmo cheiro, a volta

As formigas • Na noite seguinte, as moças percebem o mesmo cheiro, a volta das formigas e mais uma vez, que os ossos mudaram de posição dentro do caixote. Por isso, na terceira noite, resolvem ficar acordadas até descobrir de onde e por onde, chegam as formigas. O problema é que elas se sentem muito cansadas e sem perceber, acabam adormecendo. • Quando acordam, ficam ainda mais assustadas, já que ao observar o caixote, encontram o esqueleto de anão quase totalmente formado, faltando apenas um osso da perna e um braço para ficar completo. • O medo então toma conta das duas estudantes, que resolvem que não irão ficar mais tempo para descobrir o que vai acontecer. Elas pegam suas coisas e deixam a pensão desesperadas, assustadas com toda a história e a montagem dos ossos de anão pelas formigas que só chegam a noite. • Como leitores, ficamos presos neste mistério. Jamais seremos capazes de descobrir a razão pela qual as formigas montavam o esqueleto, e o motivo pelo qual estava ali.

Noturno Amarelo SÍNTESE • Laura transpassa para outro tempo e espaço (vai para casa

Noturno Amarelo SÍNTESE • Laura transpassa para outro tempo e espaço (vai para casa de seus avós), enquanto está parada, com o marido, na beira da estrada, por falta de combustível.

Noturno Amarelo • Família, cheiros, lembranças, calor, memórias, acerto de antigas contas: a oportunidade

Noturno Amarelo • Família, cheiros, lembranças, calor, memórias, acerto de antigas contas: a oportunidade via o fantástico. Esses ingredientes de "Noturno amarelo", narrado ao sabor do intimismo de mais uma mulher, desta feita Laurinha que nessa noite junto ao amado Fernando encontra-se em plena estrada com o carro sem gasolina e que em breve irá rever velhos conhecidos. • Enquanto espera Fernando providenciar o combustível, não sem antes aludir que a relação amorosa não vai nada bem, chega até ela o cheiro estonteante da Dama-da-noite. Instintivamente segue o perfume e se vê no antigo cenário familiar de uma casa alta e branca fora do tempo, mas dentro do jardim. Luzes se acendem nas janelas. A sempre boa, Ifigênia, anos na cozinha da família, vem receber festivamente a narradora. Lá dentro estão todos e principalmente aqueles que ela precisava encontrar: - Que feio, Laura! A Chapeuzinho Vermelho atravessou um bosque cheio de lobos só pra levar o bolo pra Avozinha que estava com resfriado, não era um resfriado? (. . . ) – Não veio buscar Ifigênia queria cumprir promessa, não trouxe meu espelho, roubou a torre do Avô, roubou o noivo de Eduarda e não visitou a avó.

Noturno Amarelo • Assim, não se sabe por quanto tempo, esteve entre todos desculpando-se

Noturno Amarelo • Assim, não se sabe por quanto tempo, esteve entre todos desculpando-se ou ao menos podendo conversar sobre suas culpas. • O título do conto fica por conta de sua avó que ao piano mostra uma composição de sua autoria: Noturno amarelo, para a neta visitante, que vê sua irmã caçula, Ducha dançar ao som da música. • De repente, rápido ou lento, Laura não sabe precisar, confunde-se na lembrança e só recorda-se que todos começam a ficar distantes saindo porta fora. Bastante emocionada, Laura consegue sair também e ao dar volta pela casa certifica-se do que suspeitava: nada havia ali atrás daquela porta, apenas um campo. Em seguida reencontra Fernando que nem percebera que ela tinha saído ou não do carro. Ou não terá saído? A viagem continua.

A presença SÍNTESE • Um rapaz de 25 anos hospeda-se em um hotel para

A presença SÍNTESE • Um rapaz de 25 anos hospeda-se em um hotel para velho e é misteriosamente assassinado.

A presença • A Presença – O velho, o idoso e o desgastado versus

A presença • A Presença – O velho, o idoso e o desgastado versus o novo, o jovem, a vitalidade em pessoa. Em "A presença", um narrador oculto, em 3ª pessoa, conta-nos com certo mistério o conflito de faixas etárias distintas quando um moço de 25 anos hospeda-se num hotel ocupado por pessoas idosas, burguesas e acabadas para o mundo lá fora. O porteiro, igualmente velho, à medida que faz o registro do novo hóspede, tenta de todas as formas também dissuadi-lo de não permanecer naquele lugar mofado e sem atrativos para um jovem. O rapaz entende e continua firme no propósito de ali se hospedar. O velho tenta novamente descrevendo o mal que a juventude do moço poderá causar aos velhinhos decadentes com seus feridos orgulhos já que muitos ali eram artistas. Fala de uma ex-atriz que mal sai do quarto. Diz também que os espelhos grandes que antigamente pipocavam pelo hotel, foram removidos Era evidente o alívio dos hóspedes livres daquelas testemunhas geladas, captando-os em todos os ângulos. (. . . )

A presença • Diz que antigamente aquele hotel fora agitado com inúmeras famílias passando

A presença • Diz que antigamente aquele hotel fora agitado com inúmeras famílias passando o verão ali na bonita piscina. Danças até de madrugada. Jogos. Competições. . . o hotel dispunha de ótimos cavalos. Charretes. Mas aos poucos os hóspedes mais velhos foram dominando, à medida que os mais jovens começaram a rarear, não sabia explicar o motivo (. . . ). • Ressalta que se lá fora não há espaço para eles, naquele hotel eles conquistaram esse direito. Formavam uma verdadeira comunidade uniram-se, e a antiga fragilidade, tão agredida além daqueles portões, foi se transformando numa força. Num sistema. E eram seres obstinados (. . . ) se não eram felizes, pelo menos conseguiram isso, a segurança (. . . ).

A presença • O jovem não considera a advertência dada pelo porteiro e instala-se

A presença • O jovem não considera a advertência dada pelo porteiro e instala-se no segundo andar. Antes do jantar exercita-se na piscina exibindo seu corpo jovem e observando as cabeças alvas que o espiam das janelas. • No jantar comeu com apetite de ‘jovem’ e aplaudiu muito os três velhos músicos que tocaram antigas peças que alguns hóspedes (poucos desceram para o jantar) ouviram imperturbáveis. Achou um certo amargor na goiabada com queijo. • Ao se deitar, depois de ter tomado o chá servido às vinte e uma horas, ele já não se sentia bem.

A mão no ombro SÍNTESE • Um homem de quase 50 anos de idade

A mão no ombro SÍNTESE • Um homem de quase 50 anos de idade prenuncia a sua morte a partir de um sonho, por meio do toque de uma mão em seu ombro.

A mão no ombro • Como anuncia o título, o conto "A mão no

A mão no ombro • Como anuncia o título, o conto "A mão no ombro" expressa a anunciação da morte de um homem de quase cinquenta anos, pelo toque de uma mão no ombro através de uma sonho. O conto constrói-se em torno dessa narrativa onírica do protagonista, oriunda da necessidade de refletir sobre sua vida antes de enfrentar a iminência da morte, abordando a passagem temporal.

A mão no ombro • Uma frase do próprio conto: um homem (ele próprio)

A mão no ombro • Uma frase do próprio conto: um homem (ele próprio) fazendo parte do cenário – indicia os aspectos do narrador. Pode-se classificá-lo como heterodiegético. O narrador relata os fatos orientado pela percepção da personagem, em determinados momentos como se fosse um monólogo interior, pois são fatos que ele próprio vivencia. O confronto com a situação de morte iminente é protagonizado por ele, tendo seu processo interno exposto através da voz do referido narrador. A narração funciona como se fosse em primeira pessoa, pois o homem participa da história.

A mão no ombro • A narrativa divide-se em três blocos, separados através de

A mão no ombro • A narrativa divide-se em três blocos, separados através de um espaçamento físico de três linhas. No primeiro bloco, destaca-se o sonho no qual ele se encontra em um jardim causador de uma série de estranhamentos, em uma dada situação temporal. O espaço/cenário dessa primeira parte é o jardim. No segundo bloco, em outra situação temporal, a personagem aparece em estado de vigília, cumprindo com sua rotina matinal. O espaço/cenário dessa segunda parte é o interior da casa: quarto, banheiro e sala de jantar. No terceiro bloco, fundem-se os planos espaciais e temporais na experiência da morte. O espaço/cenário dessa última parte do relato é o interior do carro da personagem.

A mão no ombro • No primeiro bloco, a personagem passeia nesse irreconhecível jardim

A mão no ombro • No primeiro bloco, a personagem passeia nesse irreconhecível jardim de plantas sem vida, com aquele céu verde com a lua de cera coroada por um fino galho de árvore, as folhas se desenhando nas minúcias sobre o fundo opaco, que parecem artificiais, cujo céu verde-cinza é de fosca luminosidade. Esses elementos formam uma ambientação na qual ela pressente uma força inusitada, prenunciadora de algum acontecimento. Buscando uma orientação temporal, o protagonista se detém a observar indícios das estações - o tempo cíclico. Não há vida no jardim, não se consegue identificar nenhuma das estações: eram as folhas cor de brasa, mas não era outono. Nem primavera [. . . ] Não era verão. Nem inverno. . Porém não os encontra: sente, sim, situar-se em um jardim fora do tempo, mas dentro do [seu] tempo, pensou. Esta afirmação denota um tempo interno contrário ao fluxo e refluxo da vida, ao ritmo, ao ir e vir da natureza, como o nascimento, a morte e o renascimento.

A mão no ombro • O tempo não se ajusta a nenhum padrão a

A mão no ombro • O tempo não se ajusta a nenhum padrão a que esteja habituado. Evoca o agasalho (um sobretudo), trazido pela associação com a fria viscosidade das pedras. Além de indicar a ideia de proteção, o agasalho comporta outras possibilidades: pode ser tanto um símbolo utilizado para impressionar os outros quanto uma proteção para ocultar-se dos outros, numa alusão à ideia de persona. Um casaco é, muitas vezes, símbolo de abrigo protetor ou de máscara que o indivíduo apresenta ao mundo. Tem dois propósitos: primeiro, dar determinada impressão aos outros; segundo, ocultar o íntimo do indivíduo da curiosidade alheia. • A sensação de estranhamento experimentada pela personagem remete ao desconhecido que, associado à perspectiva atemporal e a seu mundo interno, reflete o onírico.

A mão no ombro • Conto em terceira pessoa que começa com a narração

A mão no ombro • Conto em terceira pessoa que começa com a narração de um sonho que o protagonista tem, todo recheado de idéias ligadas a morte: Cristo crucificado, trapezista acidentado. No jardim em que o personagem principal se vê, sente que alguém vem por trás tocar-lhe o ombro. Assustado, pois intuí que se trata da morte, acorda imediatamente. A partir de então, resolve começar o seu dia de forma diferente, como se estivesse diante dos seus últimos momentos. Vive o seu momento, dando especial atenção a tudo o que se refere ao simples, mas importante ato de viver. Estava, de alguma forma, preparando-se para a morte. No instante em que prepara o carro para sair, vê-se fantasticamente no mesmo jardim do sonho. Já não tem mais medo da mão que vai tocar seu ombro.

A mão no ombro • No conto "A mão no ombro", a escritora ironiza

A mão no ombro • No conto "A mão no ombro", a escritora ironiza os valores burgueses, o sistema da família de aparências que vive mais para o social. • A personagem está fora do tempo, sentindo-se sem raízes, em um estado de expectativa ansiosa, enquanto prossegue aventurando-se naquele estranho espaço. Ela vivencia uma outra dimensão temporal na experiência onírica. A linguagem do conto transmite a angústia do sonhador. A focalização é a representação da informação diegética que se encontra ao alcance de um determinado campo de consciência, quer seja o de um personagem da história, quer o do narrador heterodiegético.

A mão no ombro • A narração (as palavras, os pensamentos, as percepções e

A mão no ombro • A narração (as palavras, os pensamentos, as percepções e os sentimentos), nesse conto, parece brotar direto do interior da personagem. O narrar é discreto, apesar da interioridade densa, sendo que é tão harmonioso que parece ao leitor que a história flui como se contasse a si mesma. O ouvido do leitor acompanha o protagonista nas profundezas de suas reflexões e remorsos, como se fosse ele vivenciando o fato. • O jardim, espaço selecionado como cenário desse conto, agrega elementos diversos e essenciais ao simbólico da narrativa. Esta paisagem é recorrente na literatura da escritora. Nesse conto, o jardim reúne um mosaico de cores e percepções, que catalisam a irrupção das memórias infantis do protagonista. Ele toma uma conotação de atmosfera pesada e opressiva para a personagem. Trata-se de um jardim impregnado de inquietação, um jardim sem vida, sem abelhas, formigas ou pássaros, onde nem mesmo resina existe nos troncos: o jardim da morte, antítese do jardim do paraíso.

A mão no ombro • A cor verde é explorada principalmente na descrição do

A mão no ombro • A cor verde é explorada principalmente na descrição do jardim, tendo esta um simbolismo ambíguo, uma polaridade simultânea de representar vida (da vegetação) e morte (dos cadáveres). • A personagem sentia e sabia com muita força que alguma coisa ia acontecer, o quê? ! Sentiu o coração disparar. A premonição aparece com mais intensidade. Este também é o primeiro indício do enfarte final. Prosseguindo o caminhar pelo local, o homem se depara com uma estátua: aquilo não era uma estátua? Aproximouse da mocinha de mármore arregaçando graciosamente o vestido para não molhar nem a saia nem os pés descalços, que examina minuciosamente: trata-se de uma jovem dentro de um tanque seco – com pedras ao redor - com uma estria negra – cicatriz que vai da cabeça ao meio dos seios e lhe decepa metade do nariz.

A mão no ombro • Observa a cabeça encaracolada, os anéis se despencando na

A mão no ombro • Observa a cabeça encaracolada, os anéis se despencando na nuca, imagem que desperta ternura e vontade de acariciar. Faz um gesto para se relacionar com a estátua, propondo-se até mesmo a ajudá-la. Todavia, assusta-se à vista de um inseto desconhecido e cheio de penugens que sai inopinadamente da orelha da estátua. • É bem visível a representação de contrastes através das características paradoxais do próprio jardim e da estátua, já que o jardim não é paradisíaco e a estátua, embora jovem, está deteriorada. O valor simbólico da estátua reveste-se de duplicidade por tratar-se da estátua de uma jovem, porém com características velhas, no sentido de estar carcomida, corroída, tendo estado sujeita a intempéries.

A mão no ombro • Também os pés, a par dos sinais de erosão,

A mão no ombro • Também os pés, a par dos sinais de erosão, insinuam uma delicadeza ao sugerir medo em escolher as pedras para pisar. Outro exemplo é a deterioração visível da estátua, provocada pela cicatriz, que marca seu rosto e peito, todavia com uma certa sensualidade, pois se perdia ondulante no rego dos seios meio descobertos pelo corpete desatado. Muitas dessas imagens parecem constituir-se em símbolos da passagem do tempo. A personagem sente-se sensibilizada pela estátua, a ponto de ensaiar uma fala com a mesma. Aqui, temos a primeira vez em que o homem depara-se mais explicitamente com a dualidade - o velho e o novo. A estátua parece representar um espelho do homem: é ainda fisicamente jovem, porém tem seu interior carcomido pela idéia da morte. A estátua descomposta, as plantas sem vida, a fonte e o tanque secos levam a crer em referenciais da passagem do tempo. Tais elementos são indiciadores do regime diurno da imagem, que reconhece e luta contra a passagem temporal.

A mão no ombro • A personagem percebe os sentidos se aguçarem, mergulhada nesse

A mão no ombro • A personagem percebe os sentidos se aguçarem, mergulhada nesse cenário esquisito, nesse jardim repleto de estranhas ervas perfumosas, com um silêncio cristalizado como num quadro, tudo muito estático, em meio a um torpor. O único movimento é o do inseto saindo da orelha – em um movimento semelhante ao dos insetos nos corpos dos mortos. Outra alusão à morte é o fato de ele seguir andando com as mãos nos bolsos e encontrar dois ciprestes, árvores típicas dos cemitérios, cujas fortes folhagens simbolizam a imortalidade. Uma curiosidade, nesse primeiro segmento, é que o sonhador faz uso de quase toda a sensorialidade, desenvolvendo quatro sentidos: visão, audição, olfato e tato, somente faltando alusão ao paladar que, em contrapartida, será resgatado no segundo segmento, na cena do café da manhã. Aliás, o fato do paladar não estar presente neste sonho corrobora seu sentido como experiência da morte: esta, ao invés de nutrir, retira a vida do corpo.

A mão no ombro • Apesar da aparência inocente, o jardim é tão inquietante

A mão no ombro • Apesar da aparência inocente, o jardim é tão inquietante quanto o jogo de quebra-cabeça de sua infância. Nesse, seu pai estimulava sua perspicácia em localizar rapidamente o caçador no bosque, sob pena de perder o jogo: vamos, filho, procura nas nuvens, na árvore, ele não está enfolhado naquele ramo? No chão, veja no chão, não forma um boné a curva ali do regato? . Ao final da narrativa, no detalhe desta lembrança, temos a situação inversa no plano da realidade, pois a personagem é caçada pelo caçador. Porém, desta vez a morte é o ônus: o homem fantasia a figura do caçador na escada como representação da morte.