Boaventura de Sousa Santos Professor Catedrtico Jubilado da
Boaventura de Sousa Santos Professor Catedrático Jubilado da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra e Distinguished Legal Scholar da Faculdade de Direito da Universidade de Wisconsin-Madison e Global Legal Scholar da Universidade de Warwick. É igualmente Director Emérito do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e Coordenador Científico do Observatório Permanente da Justiça. De 2011 a 2016, dirigiu o projecto de investigação ALICE - Espelhos estranhos, lições imprevistas: definindo para a Europa um novo modo de partilhar as experiências o mundo, um projeto financiado pelo Conselho Europeu de Investigação (ERC), um dos mais prestigiados e competitivos financiamentos internacionais para a investigação científica de excelência em espaço europeu. Tem trabalhos publicados sobre globalização, sociologia do direito, epistemologia, democracia e direitos humanos.
A gramática do tempo. Para uma nova cultura política. Porto: Afrontamento, 2006. Também publicado no Brasil, São Paulo: Editora Cortez, 2006 (2ª edição). Organizado em 3 partes, 13 capítulos. 1. Para uma epistemologia do sul 2. A construção de mundos pós-coloniais 3. Uma nova teoria política crítica: reinventar o estado, a democracia e os direitos humanos
- Perspectiva pós-colonial - Construção de textos sintetiza busca por novo senso comum - Objetivo principal é lançar fundamentos de uma nova cultura política que permita o retorno ao pensamento contra hegemônico e consequente transformação social emancipatória. - Pensando a partir da oposição sul-global/norte-global, formula um pensamento alternativo denominado epistemologia do sul. - Em alternativa ao pensamento moderno clássico, adota uma análise focada nas articulações entre espaços-tempo local, nacional e global.
- Perspectiva pós-colonial - Construção de textos sintetiza busca por novo senso comum - Objetivo principal é lançar fundamentos de uma nova cultura política que permita o retorno ao pensamento contra hegemônico e consequente transformação social emancipatória. - Pensando a partir da oposição sul-global/norte-global, formula um pensamento alternativo denominado epistemologia do sul. - Em alternativa ao pensamento moderno clássico, adota uma análise focada nas articulações entre espaços-tempo local, nacional e global.
Capítulo 13: Para uma concepção intercultural dos direitos humanos O autor contextualiza as políticas de direitos humanos a partir da globalização hegemônica e contra hegemônica. Não existe uma única globalização, mas sim globalizações, as quais dependem da influência do seu dinamismo social. Ademais, conforme defende o autor, os direitos humanos observados universalmente dispõem-se de forma hegemônica, enquanto perante uma concepção intercultural deveriam ser de forma contra hegemônica. Nesse sentido, Santos (2010) salienta as asserções necessárias para se firmar uma política contra hegemônica de direitos humanos, como clarificar o embate sobre relativismo e universalismo, isomorfias, especificidades culturais, incompletudes e tendências à hierarquização. Por fim, visando aprofundar essa reflexão intercultural, o autor ainda apresenta a hermenêutica diatópica. Nessa perspectiva, reconhece a complexidade da proposta citando Sartre: “antes de concretizada, uma ideia apresenta uma estranha semelhança com a utopia. ”
Introdução: as tensões da modernidade ocidental e os direitos humanos Objetivo: identificar as condições em que os direitos humanos podem ser colocados ao serviço de uma política progressista e emancipatória passa pelo reconhecimento das tensões dialéticas que informam a modernidade ocidental: Regulação social X emancipação social Antes baseada na discrepância entre experiências sociais (passado) e expectativas sociais (futuro), hoje a crise da regulação social (simbolizada pela crise do Estado intervencionista e do estado providencia) e a crise de da emancipação social (simbolizada pela crise da revolução, do reformismo social democrático e do socialismo enquanto paradigmas da transformação social) são simultâneas e se retroalimentam. Direitos humanos estão nessa interface como uma possibilidade de superação do impasse. Estado X sociedade civil Longe de ser pressuposto da luta política moderna, é resultado dela. Tensão passa a ser entre interesses e grupos sociais que se reproduzem melhor sob a forma de Estado e interesses e grupos sociais que se reproduzem melhor sob a forma de sociedade civil. Direitos humanos tanto em versão hegemônica como contra hegemônica foram capturados nesse impasse de forças. Estado nação X globalização A efetividade dos direitos humanos tem sido conquistada em processos políticos de âmbito nacional, por isso a fragilização do Estado nação pode acarretar em fragilização dos direitos humanos, sobretudo os econômicos e sociais. Busca pelos direitos humanos como política cultural e global, concebido como energia e linguagem de esferas públicas locais, nacionais e transnacionais, atuando em rede para garantia de novas e intensas formas de inclusão social.
As globalizações em síntese O autor define globalização por processo pelo qual determinada condição ou entidade local estende sua influência a todo o globo e ao fazê-lo, desenvolve a capacidade de designar como local outra condição social ou entidade rival. Formas ou processos de globalização: localismo globalizado, globalismo localizado, cosmopolitismo insurgente e subalterno e patrimônio comum da humanidade. Dois processos de globalização hegemônica, divisão tenaz entre Norte global e Sul global: Localismo globalizado – o que se globaliza é o vencedor de uma luta pela apropriação de recursos, pelo reconhecimento de uma dada diferença, reconhecimento hegemônico pela imposição de dada regra Globalismo localizado – impacto específico nas condições locais e práticas e imperativos transnacionais que emergem dos localismos globalizados. Processo de globalização contra-hegemônica, a partir de baixo: Cosmopolitismo subalterno insurgente – resistência contra os processos hegemônicos por meio de articulações possíveis por meio das tecnologias de comunicação e informação. (diferença de Marx pela não exclusividade classista de representação) pesos iguais valor da igualdade e reconhecimento da diferença. Patrimonio comum da humanidade: lutas transnacionais por valores reportados ao globo em sua totalidade
Reconstrução intercultural dos direitos humanos Para que os direitos humanos constituam forma de globalização contra-hegemônica, é preciso uma reconceitualização destes como interculturais. Multiculturalismo emancipatório é pré-condição para relação equilibrada entre competência global e legitimidade local. Origem X Validade dos direitos humanos = energia mobilizadora e identificação cultural é mais importante do que a ancoragem cultural e a validade filosófica. Direitos humanos não são cultura global, são Ocidentais - “O único fato transcultural é a relatividade de todas as culturas” Aspirações diversas a diferentes valores fundamentais em diferentes culturas podem conduzir a preocupações isomórficas dados procedimentos de tradução cultural adequados = mestiçagem ou interpenetração de preocupações e concepções. Pressupostos tipicamente ocidentais se apoiam num conceito invariante de natureza humana, e a serviço de interesses econômicos e geopolíticos de Estados capitalistas hegemônicos. Necessidade de transformar a conceitualização e a prática dos direitos humanos de localismo globalizado em projeto cosmopolita insurgente.
Premissas de uma política contra-hegemônica de direitos humanos Premissa 1. Superação do debate entre universalismo e relativismo cultural Proposição de diálogos interculturais sobre preocupações isomórficas Distinção entre política conservadora X progressista, capacitação X desarme, emancipatória X regulatória Ideia de menores denominadores comuns Premissa 2. Transformar concepções de dignidade humana em referenciais de direitos humanos Premissa 3. Assumir a incompletude de tais referenciais de dignidade em diferentes culturas Premissa 4. Nenhuma cultura é monolítica, e ele propõe como medida a amplitude do círculo de reciprocidade Premissa 5. Saber distinguir a luta pela igualdade e a luta pelo reconhecimento igualitário das diferenças
A hermenêutica diatópica Topoi: lugares comuns retóricos mais abrangentes de determinada cultura, que funcionam como premissas de argumentação (senso comum) Proposição de uma hermenêutica diatópica para entender determinada cultura a partir de seus topois. Postulado da HD: os topois de uma cultura, por mais fortes que sejam, são incompletos como a própria cultura a que pertencem e essa consciência precisa ser ampliada por um diálogo que alcança tal mérito exatamente por sua condição limiar HD requer uma produção de conhecimento coletiva, participativa, intersubjetiva e reticular. Ela privilegia o conhecimento-emancipação em detrimento do conhecimento regulação.
O imperialismo cultural e a possibilidade de uma contra-hegemonia Colonialismo é impasse para submeter direitos humanos à hermenêutica diatópica, há uma relação histórica de domínio e sujeição de base Proposta de partir do pressuposto de que as culturas sempre foram interculturais e as trocas e interpenetrações mútuas sempre foram desiguais e hostis a um diálogo cosmopolita As dificuldades da reconstrução dos direitos humanos Impasse de estabelecer diálogo intercultural quando uma das culturas foi moldada por massivas e continuadas agressões à dignidade humana perpetradas em nome de outra cultura. Epistemicídio: quando o pressuposto da incompletude é apenas mais uma forma de domínio
Condições para uma reconstrução intercultural dos direitos humanos Da completude à incompletude: ponto de partida é a completude e referencial orientador é aquele que representa o círculo de reciprocidade mais amplo, que vai mais longe no reconhecimento do outro. De tempos unilaterais a tempos partilhados: disponibilidade e empenho demandam decisão mútua, e não unilateral De parceiros e temas unilateralmente impostos a parceiros e temas escolhidos por mútuo acordo: escolha de interlocutores e pontos de inflexão pelo caráter isomórfico Da igualdade ou diferença à igualdade e diferença: temos o direito a ser iguais quando a diferença nos inferioriza; temos direito a ser diferentes quando a igualdade nos descaracteriza
Direitos Humanos Interculturais e Pós-imperiais Proposição de nova arquitetura dos direitos humanos, com nova fundamentação e justificação radicais por meio de uma inquirição epistemológica baseada em genealogia, geologia e arqueologia que possam dar a ver as camadas que constituíram o que se tornaram os direitos humanos universais. Encontrar os fundamentos dos ur-direitos, essas negatividades abissais que são normatividades originárias e possibilitarão uma concepção pós-colonial e pós-imperial dos direitos humanos: - Direito ao conhecimento - Direito de levar o capitalismo global a julgamento num tribunal mundial - Direito de transformação do direito de propriedade segundo a trajetória do colonialismo para a solidariedade - Direito à concessão de direitos a entidades capazes de terem deveres, nomeadamente a natureza e gerações futuras - Direito à autodeterminação democrática - Direito à organização e participação na criação de direitos
Conclusão Negação dos ur-direitos legitima direitos humanos hegemônicos Direitos humanos atualmente são globalismo localizado A concepção intercultural deve basear-se em: - reconstrução intercultural por meio da hermenêutica diatópica - reconstrução dos ur-direitos
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