BIOGEOGRAFIA Luis Gabriel Rodrigues Sousa O QUE BIOGEOGRAFIA
BIOGEOGRAFIA Luis Gabriel Rodrigues Sousa.
O QUE É BIOGEOGRAFIA ? �A Biogeografia é uma ciência complexa e desafiadora que estuda a distribuição geográfica dos seres vivos, no espaço por meio do tempo, com o objetivo de entender os padrões de organização espacial dos organismos, os processos que resultaram desses tais padrões e que abrangem ideias de diversas áreas do conhecimento.
COMO NASCEU A BIOGEOGRAFIA? �Assim, foi com o intuito de se entender os padrões gerais de distribuição das espécies, através da correlação da biota com suas áreas de distribuição e a própria relação entre essas áreas, é que nasceu a Biogeografia, entendida, talvez como a mais abrangente e multidisciplinar das ciências biológicas (Nelson e Platnick, 1981)
BIOGEOGRAFIA ENVOLVE OUTRAS CIÊNCIAS �É certo afirmar, que esta é uma ciência complexa que utiliza informações e teorias de outras disciplinas, tais como a Geografia, Geologia, Ecologia, Paleontologia e Sistemática Filogenética, que serve para documentar e entender os padrões de distribuição dos organismos, tanto no espaço, quanto no tempo.
QUAIS COMPONENTES SÃO NECESSÁRIOS PARA COMPREENSÃO DA BIOTA �De fato, é imperioso citar, que existem três componentes que devem ser avaliados em conjunto para o completo entendimento dos padrões de distribuição da biota: espaço (área geográfica onde se encontram organismos), tempo (eventos históricos que interferiram nos padrões atuais das espécies) e forma (que são os grupos de organismos propriamente ditos) (Croizat, 1952; Humphries, 2000).
HISTÓRIA DA BIOGEOGRAFIA SEGUNDO (NELSON E PLATNICK) �A história da Biogeografia, de acordo com(Nelson e Platnick), pode ser dividida em dois períodos muito distintos, a saber: 1) o período pré-evolutivo, no qual se acreditava no fixismo das espécies, ou seja, na sua constância e estabilidade de lugar na Terra, e em um centro de origem e dispersão; e 2) o período evolutivo, que agrega e incorpora as ideias de mudança tanto da biota(evolução da espécie) quanto da própria Terra às explicações biogeográficas, resultando no paradigma vicariante que serviu de base à biogeografia histórica.
� Fig 1: Dispersão ativa via migração � Fonte: Biogeografia histórica e ecológica de Natália Leiner
PRINCIPAIS PROCESSOS QUE ENVOLVEM A TEORIA BIOGEOGRÁFICA �Para compreendermos de fato, no que se refere à história e à teoria biogeográfica, é importante conceituarmos três processos: extinção, dispersão e vicariância (Figura 10. 1 C). Tais processos são considerados os principais responsáveis por delinear os padrões de distribuição dos organismos propriamente ditos essencialmente. A extinção (Figura 10. 1 A), dentre os três processos, é o mais simples, podendo ser entendido como o desaparecimento total de um táxon (são categorias usadas no sistema de classificação dos seres vivos. São eles: domínio – reino – filo –classe – ordem – família – gênero – espécie).
Fonte: Profa: Lígia H. apostólico, USP
BARREIRAS BIOGEOGRÁFICAS � Hodiernamente pode-se ressaltar que o termo “barreira biogeográfica” não está restrito somente a barreiras geológicas, como o soerguimento de uma cadeia de montanhas (como ilustrado na Figura 10. 1 C) ou a separação dos continentes. É certo, que qualquer aspecto biótico ou abiótico – sendo ele geográfico, ecológico (competição, predação, comportamento), fisiológico (temperatura, profundidade) – que restrinja o movimento ou interação entre populações em diferentes ambientes é considerado uma barreira biogeográfica.
DO ENTENDIMENTO BÍBLICO DA HISTÓRIA DA BIOGEOGRAFIA � Acreditava-se que todos os organismos surgiram em uma só área – o centro de origem das espécies – e que posteriormente se dispersaram a partir dali, ocupando toda a superfície da Terra. Uma das mais antigas teorias geográficas é encontrada no Livro do Gênesis, que hoje é conhecida como a bíblia dos cristãos e a torá para os muçulmanos. Nestes livros está escrito e, portanto, registrado, mesmo por dados as vezes apócrifos, que todos os organismos foram criados no Éden e a partir daí se dispersaram para as outras regiões do globo terrestre. � A história da biogeografia pré-evolutiva diz que o mesmo raciocínio se aplica à ideia da Arca de Noé e da Torre de Babel: onde as espécies e povos viventes naquele período inicial da humanidade, respectivamente, surgiram no centro de origem e então se dispersaram e diversificaram a partir dele (Papavero et al. , 1997).
BIOGEOGRAFIA SEGUNDO A escola dispersalista de Carl Von Linné (Linneaus Lineu) (1707 a 1778) � Este integrante da escola dispersalista Carl Von Linné (Linneaus Lineu) (1707 a 1778) foi o botânico sueco que formulou a primeira teoria biogeográfica dos tempos modernos. De acordo com ela, áreas distintas da Terra com a mesma ecologia, deveriam possuir exatamente a mesma flora. Desse modo, plantas que habitam áreas semelhantes, mas em continentes diferentes, deveriam pertencer à mesma espécie (Papavero et al. , 1997). � Ele é primeiramente reconhecido por sua contribuição na área da Biologia, com a criação da nomenclatura binominal e do sistema de classificação de seres vivos, ambos utilizados até os dias de hoje. Além disso, sua curiosidade a respeito do mundo natural também o fez indagar sobre a origem e a distribuição dos seres vivos na Terra. Conterrâneo aos pensamentos da época, Linnaeus baseou-se no mito do Jardim do Éden para criar a tese e hipotetizar que todas as formas de vida haviam surgido em uma montanha paradisíaca, localizada próxima ao Equador (i. e. , ideia de centro de origem), e depois se dispersado pelo restante do mundo.
BIOGEOGRAFIA SEGUNDO A escola dispersalista de Carl Von Linné (Linneaus Lineu) (1707 a 1778) � De acordo com a explicação de Linnaeus, cada espécie estaria adaptada a determinada condição climática na montanha e, após sua dispersão, habitaria regiões com condições similares no globo terrestre inteiro. Quando seguimos essa lógica, organismos adaptados às regiões mais frias de altitude da montanha se dispersariam para áreas frias do globo terrestre, enquanto que aqueles que habitavam as regiões menos elevadas da montanha se dispersariam para as regiões mais quentes. Conforme entendimento de Linnaeus, essa mesma lógica explicaria a dispersão dos seres vivos a partir do Monte Ararat, local no qual, segundo o mito bíblico do dilúvio, a Arca de Noé teria fundeado devido ao dilúvio e posteriormente desembarcado as pessoas, plantas e animais que estavam naquela Arca. � As ideias de Linnaeus a respeito da distribuição geográfica dos seres vivos foram apresentadas em uma publicação denominada Oratio de Telluris Habitabilis Incremento publicado no ano de 174
BIOGEOGRAFIA SEGUNDO A LEI DE BUFFON � Posteriormente, George Louis Leclerc, Conde de Buffon (1707 -1788), examinou espécies de mamíferos do Velho Mundo conhecidas na época e percebeu que elas não eram encontradas no Novo Mundo. A partir de suas descobertas foi elaborada a lei de Buffon, segundo a qual diferentes regiões do globo, apesar de compartilharem as mesmas condições, são habitadas por diferentes espécies de animais e plantas. Buffon não questionou a noção de centro de origem, mas sugeriu um novo fato: as espécies se modificariam (por degeneração), quando expostas a diferentes condições ambientais. Os estudos de Buffon, sugerem causas históricas para os padrões de distribuição, ou seja, ou o grupo de organismos surgiu naquela dada área ou veio de outro lugar. No primeiro caso, se for uma espécie, implica em dizer, que a especiação ocorreu naquela área; no segundo caso ocorreu dispersão e consequente colonização da espécie. Diversos autores posteriores chegaram às mesmas conclusões de Bufonn quanto à distribuição diferenciada dos organismos, a partir do estudo de outros grupos de seres vivos, como Alexander von Humboldt (1769 -1859) - plantas, Pierre Latreille (1762 - 1833) - insetos; Georges Cuvier ( 1769 -1832) - répteis.
BUFFON X LECLERC � Dentro desta ideia ainda, o naturalista George-Louis Leclerc, o Conde de Buffon (1707 -1788), foi o primeiro a contestar as ideias de seu contemporâneo, Linnaeus. Buffon, ao estudar com profundidade o fenômeno, observou que em diferentes áreas tropicais da terra, mesmo aquelas onde as condições ambientais e climáticas eram similares, eram habitadas por espécies de mamíferos completamente distintas. Na visão de Leclerc, a origem dos seres vivos deveria ter acontecido em regiões mais próximas ao norte da Europa, e jamais tão próximas aos trópicos conhecidos. Baseado nessa hipótese, Leclerc defendia que, ao longo do processo de dispersão pelo mundo terrestre, as espécies se modificavam mais quanto mais distantes de seu centro de origem. Essa ideia permitiu a formulação do primeiro princípio biogeográfico, conhecido como Lei de Buffon, o qual postulava que as diferentes regiões da Terra, apesar de compartilharem determinadas características, seriam habitadas por diferentes espécies de plantas e animais.
J. Forster, Alexander von Humboldt (1769 -1859) e o desenvolvimento da Biogeografia � É certo ressaltar, que o alemão Johann Reinhold Forster (1729 -1798) foi outro naturalista de destaque neste período. Quando de suas viagens exploratórias pelo mundo, Forster coletou milhares de espécies de plantas não descritas até então e comprovou que a Lei de Buffon aplicava-se não somente aos mamíferos, mas também às plantas e a outros animais. Através de suas anotações e observações, ele descreveu de forma contundente e objetiva os gradientes latitudinais de diversidade que ocorrem no mundo, deixando claro quanto a possibilidade de aumento da riqueza de espécies, quando estas vivem em direção às baixas latitudes e em regiões tropicais. � Da mesma época de J. Forster, Alexander von Humboldt (1769 -1859) foi outro naturalista dos mais importantes para o desenvolvimento da Biogeografia, que, após viagens exploratórias pelo mundo, generalizou de forma simples a Lei de Buffon para inserir as plantas e a maioria dos animais viventes terrestres conhecidos até hoje. A sua principal contribuição sobre este assunto, porém, foi resultado de sua ideia de escalar mais de 5800 metros para chegar ao topo do vulcão Chimborazo, localizado no Equador, durante uma de suas expedições à América do Sul. Como resultado desta exploração, Humboldt observou que a riqueza de espécies de plantas diminuía conforme se aumentava a altitude em relação ao topo do vulcão. Segundo ele, existiam faixas de distribuição ao longo das diferentes altitudes, ou uma sucessão altitudinal – similares ao gradiente latitudinal de diversidade proposto por Forster –, as quais ele denominou de zonas fisionômicas.
CANDOLLE E O ENDEMISMO BIOGEOGRÁFICO � As definições, procedimentos e conceitos formulados por de Candolle foram a primeira tentativa de entender e depois explicar os fatores que levariam os organismos a se distribuírem em determinados locais, mas não em outros, como era entendido que poderia acontecer. Através desta linha de pensamento, Candolle observou que algumas espécies de planta apresentavam uma distribuição muito ampla, podendo ser encontradas em quase todas as regiões do planeta, enquanto outras estavam aglomeradas em áreas restritas a regiões singulares. Dessa forma e a partir dessas observações, que Candolle formulou o conceito de endemismo – usado para designar espécies restritas a uma única região e um dos conceitos centrais da Biogeografia Cladística – e também uma das primeiras propostas de classificação do planeta em regiões biogeográficas de acordo com as espécies encontradas.
A Biogeografia Evolutiva dos notáveis Darwin e Wallace � O educandário da Biogeografia Evolutiva teve seu surgimento a partir das ideias de dois notáveis naturalistas ingleses, Darwin e Wallace. Darwin e sua teoria da evolução por meio da seleção natural, além de sua indiscutível contribuição à Biologia, teve também consequências positivas para a Biogeografia. Antes do surgimento desse pensamento, os naturalistas da época limitavam suas explicações às descrições dos padrões de distribuição observados, sem enfatizar a questão do tempo, de forma que as explicações levavam em consideração notadamente aspectos ecológicos, mas não históricos. Por conseguinte, ao contrário da ideia fixista, de que as espécies seriam imutáveis, as ideias de Darwin permitiram combinar a teoria da evolução com o modelo de dispersão dos táxons. Ressalta-se, que apesar de Darwin e Wallace preocuparem-se com a distribuição dos organismos, ambos mantiveram as ideias a respeito de centros de origem e de dispersão como única força motora de diversificação (paradigma dispersalista). � O estudioso Sr. Wallace foi conhecido, principalmente, por ter proposto a teoria da evolução por seleção natural ao mesmo tempo que o Sr. Darwin. Na área da Biogeografia, Wallace é identificado como o pai da Zoogeografia, devido a sua proposta de regionalização do mundo em zonas zoogeográficas.
A Escola da Biogeografia Evolutiva oposta a lei de Buffon � Os escritores da escola da Biogeografia Evolutiva se baseavam na ideia de centros de origem, delineados como centros geradores de fauna e flora, a partir dos quais as espécies poderiam se disseminar para novas áreas. Para esses escritores, o centro de origem deveria ser o local onde estariam divididas as espécies de origem mais recente (mais derivadas), as quais poderiam levar ao deslocamento de espécies mais antigas para regiões mais periféricas devido à competição por recursos. Essa ideia é oposta ao que conjecturava a lei de Buffon. Ademais, o centro de origem seria o local com maior diversidade de espécies, uma vez que, por ser o local mais antigo, deveria conter o maior número de espécies viventes. É certo, dizer, que o conceito de centro de origem sofreu mudanças conceituais drásticas ao longo do tempo, especialmente durante o predomínio da escola da Biogeografia Filogenética.
O Naturalista Croizat X Darwin-As barreiras geográficas. A Evolução das biotas =“form-making process” � Segundo Croizat, não parecia sensato acreditar que padrões semelhantes de distribuição de diferentes organismos estivessem ligados a histórias independentes de dispersão. A dispersão seria um evento que dependia do acaso e também da capacidade de dispersão de cada espécie, de forma que era mais lógico assumir que os padrões observados seriam consequência de histórias compartilhadas, causadas por respostas similares às modificações da superfície do planeta. Defensor de que as barreiras geográficas evoluem juntamente com as biotas, Croizat acreditava que a teoria de Wegener de deriva continental explicava de forma satisfatória padrões antigos de distribuição de biotas, mas seria insuficiente para explicar os eventos geológicos associados aos padrões de distribuição geográficos complexos e mais recentes. � O conceito central formulado por Croizat para explicar a evolução das biotas foi o chamado “form-making process” – termo que pode ser entendido como o processo de mudança de forma ao longo do tempo, mas incluindo, nesse caso, a importância de movimento no espaço. Para a ocorrência desse processo, Croizat defendia que deveria existir um estágio de mobilidade, o que permitiria que as espécies expandissem sua distribuição, e um estágio de imobilidade, resultado do processo de vicariância. A partir dessa lógica, o autor defendia que uma espécie ancestral deveria estar amplamente distribuída (cosmopolitismo ancestral) em determinada área. Para ele, eventos vicariantes—tais como o surgimento de lagos, montanhas ou vulcões—seriam responsáveis pela fragmentação da área de distribuição da população original e resultariam, dessa forma, em processos de especiação alopátrica, ou seja, de diferenciação em novas espécies. Em oposição ao modelo de evolução por seleção natural de Darwin, Croizat enfatizava a importância dos eventos vicariantes para a mudança de forma (form-making process) ao longo do tempo 3. 1(Profª Lígia Haselmann apostólico, USP, com grifos nossos)
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