Atividade prtica atividade de linguagem e processo de

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Atividade “prática“, atividade de linguagem e processo de desenvolvimento Jean-Paul Bronckart Universidade de Genebra

Atividade “prática“, atividade de linguagem e processo de desenvolvimento Jean-Paul Bronckart Universidade de Genebra

1. Atividade e desenvolvimento n Princípios comuns das abordagens interacionistas n n O primado

1. Atividade e desenvolvimento n Princípios comuns das abordagens interacionistas n n O primado da sócio-história e das atividades significantes na espécie humana (Vygotski). As atividades « práticas » como quadros da interação entre o organismo humano e seu meio (Leontiev). Os processos de reflexo, refração ou reflexão, como mecanismos de constituição da gnoseologia humana. A dupla ancoragem da gnoseologia (Durkheim): n n n Nas representações coletivas que se organizam em diversos mundos formais de conhecimentos (Habermas) ; Nas representações individuais que se organizam na economia psíquica das pessoas. A articulação estreita das atividades «práticas» e as atividades de linguagem.

1. Atividade e desenvolvimento (esquema 1) ORGANISME Representações coletivas Representações individuais M E I

1. Atividade e desenvolvimento (esquema 1) ORGANISME Representações coletivas Representações individuais M E I O Atividade prática ? ? Atividade de linguagem ?

1. Atividade e desenvolvimento n Questões abertas (e discutidas) nas abordagens interacionistas n n

1. Atividade e desenvolvimento n Questões abertas (e discutidas) nas abordagens interacionistas n n Q 1. Qual é a natureza das relações entre atividades « práticas » e atividades de linguagem? Q 2. Qual é o papel específico da linguagem na constituição e na transformação da gnoseologia humana?

1. Atividade e desenvolvimento (esquema 2) ORGANISME Representações coletivas Representa ções individuais Atividade prática

1. Atividade e desenvolvimento (esquema 2) ORGANISME Representações coletivas Representa ções individuais Atividade prática ? ? M E I O Atividade de linguagem ?

1. Atividade e desenvolvimento n Em busca de uma definição n n n Distinguir

1. Atividade e desenvolvimento n Em busca de uma definição n n n Distinguir a dinâmica geral da matéria e a forma que assume essa dinâmica no humano. A dificuldade e a escassez das definições de desenvolvimento. Distinguir diferentes « objetos » do desenvolvimento: n n desenvolvimento dos conhecimentos (Piaget) ; desenvolvimentos das capacidades de ação (Vygotski? ); desenvolvimento da pessoa (self : Mead). Foco no desenvolvimento das capacidades de ação e da pessoa.

1. Atividade e desenvolvimento n Os processos de desenvolvimento n n A reflexão exige

1. Atividade e desenvolvimento n Os processos de desenvolvimento n n A reflexão exige distanciamento da atividade e tomada de consciência de suas propriedades. Q 3. Quais são as condições, a natureza (semiológica ou puramente cognitiva) e os efeitos desses processos? A tomada de consciência é uma condição necessária mas não suficiente para o desenvolvimento. Q 4. Que outros processos devem intervir para que haja desenvolvimento efetivo?

2. A linguagem (Estatuto e funções) n A dimensão prática: a atividade de linguagem

2. A linguagem (Estatuto e funções) n A dimensão prática: a atividade de linguagem n n Realidade empírica primeira, organizada em textos. A preexistência dos gêneros de textos, produtos da história sociolinguageira de uma comunidade (e a cultura como variante semântica dessa história). A articulação dos novos textos a suas condições particulares de produção. Distinção entre textos produzidos « na » atividade « prática » e textos « sobre » essa atividade.

2. A linguagem (Estatuto e funções) n A dimensão sistêmica (Saussure) n n n

2. A linguagem (Estatuto e funções) n A dimensão sistêmica (Saussure) n n n A realidade e a extrema diversidade das línguas naturais. O caráter radicalmente não-substancial dos signos: eles são « envelopes vazios » produzidos por uma « sistemática » de operações psíquicas. Esses envelopes são preenchidos (instanciados) por elementos oriundos das trocas sociais: portanto, o conteúdo dos signos é integralmente social.

2. A lingaugem (Citações Saussure) n n n « forme = Non pas une

2. A lingaugem (Citações Saussure) n n n « forme = Non pas une certaine entité positive d’un ordre quelconque, et d’un ordre simple ; mais l’entité à la fois négative et complexe : résultant (sans aucune espèce de base matérielle) de la différence avec d’autres formes combinée avec la différence de signification d’autres formes. » (L’essence double, p. 36) « Nous sommes toujours ramené aux quatre termes irréductibles et aux trois rapports irréductibles entre eux ne formant qu’un seul tout pour l’esprit : (un signe / sa signification) = (un signe / et un autre signe) et de plus = (une signification / une autre signification). […] C’est là ce que nous appelons le quaternion final et, en considérant les quatre termes dans leurs rapports : le triple rapport irréductible. » (ibid. , p. 39) Un mot n’existe véritablement, et à quelque point de vue qu’on se place, que par la sanction qu’il reçoit de moment en moment de ceux qui l’emploient. » (ibid. , p. 83)

2. A linguagem (Estatuto e funções) n La dimensão sistêmica (Saussure) n A dupla

2. A linguagem (Estatuto e funções) n La dimensão sistêmica (Saussure) n A dupla ancoragem dos signos e da língua: - na economia psíquica das pessoas; - nas instâncias sociais. n A dialética língua-discurso (Saussure) n As significações (valores) dos signos são elaboradas no « discurso » (nos textos); esses valores, a seguir, são organizados sob outra forma, lógica, na língua, e ela é então um recurso para a produção de novos discursos.

2. A linguagem (Citações Saussure) n n « Toutes les modifications, soit phonétiques, soit

2. A linguagem (Citações Saussure) n n « Toutes les modifications, soit phonétiques, soit grammaticales (analogiques) se font exclusivement dans le discursif. Il n’y a aucun moment où le sujet soumette à une révision le trésor mental de la langue qu’il a en lui, et crée à tête reposée des formes nouvelles (par ex. calmement [ ]) qu’il se propose, (promet) de « placer » dans son prochain discours. Toute innovation arrive par improvisation, en parlant, et pénètre de là soit dans le trésor intime de l’auditeur ou celui de l’orateur, mais se produit donc à propos du langage discursif. » (ELG, p. 95) «[Il existe] deux fonctions qui sont actives également en nous à propos du langage. D’une part, il existe le trésor intérieur, qui équivaut au casier de la mémoire ; c’est là ce qu’on peut appeler le magasin ; c’est un des deux lieux, une des deux sphères. C’est dans ce trésor qu’est rangé tout ce qui peut entrer en activité dans le second lieu. Et le second lieu, c’est le discours, c’est la chaîne de la parole. » (Cours II, p. 79)

2. A linguagem (Estatuto e funções) Respostas à Questão 2 n Os signos organizados

2. A linguagem (Estatuto e funções) Respostas à Questão 2 n Os signos organizados na língua são a condição da elaboração e do desenvolvimento das unidades e das operações do pensamento, ou das representações humanas (gnoseologia). n O pensamento não é nada mais que a língua interiorizada. n Paradoxos n n Os signos e a língua não existem « em si mesmos » : eles são produtos de operações psíquicas que incidem sobre valores da troca social. A posição « real » de Saussure fornece um aporte técnico decisivo para as teses do interacionismo social.

2. A linguagem (transmissão histórica) Efeitos da dinâmica linguageira (textual) n n O desligamento

2. A linguagem (transmissão histórica) Efeitos da dinâmica linguageira (textual) n n O desligamento dos textos de suas condições iniciais de produção (Bakhtin, Ricœur). Devido a esse desligamento, criação de um « meio objetivo » (Voloshinov) : uma organização semiótica relativamente autônoma na qual: n n Os valores significantes assumem uma amplitude humana geral (Ricœur). Devido à heterogeneidade histórico-social dos elementos textuais, esses valores se encontram necessariamente « em debate » ou « em conflito » .

2. A linguagem (arquitetura textual) n Esquema estrutural INFRAESTRUCTURA P L A N I

2. A linguagem (arquitetura textual) n Esquema estrutural INFRAESTRUCTURA P L A N I F I CA Ç Ã O TIPOS DE DISCURSOS ENCAIXADOS TEXTUALIZAÇÃO CONEXÃO RESPONSABILIZAÇÃO ENUNCIATIVA DISTRIBUIÇÃO DAS VOZES COESÃO NOMINAL MODALIZAÇÕES EVENTUAIS SEQÜENCIAS COESÃO VERBAL

2. A linguagem (arquitetura textual) n Os graus de autonomia dos componentes n n

2. A linguagem (arquitetura textual) n Os graus de autonomia dos componentes n n Os gêneros, nível principal da influência das propriedades da atividade « prática » sobre os textos. Os mecanismos de textualização, nível principal do efeito das propriedades da língua natural. Os tipos de discurso, nível principal da colocação em interface das representações coletivas e as representações individuais. Os mecanismos de responsabilização enunciativa, nível « meta » das interações dialéticas entre o gnoseológico (cognitivo) e o textual.

2. A linguagem (arquitetura textual) n Esquema funcional Representações coletivas Atividade social Arquitexto Gênero

2. A linguagem (arquitetura textual) n Esquema funcional Representações coletivas Atividade social Arquitexto Gênero adotado Textualização Língua natural T I P O S de D I S C U R S O Discurso interativo Discurso teórico Relato interativo Narração Representações individuais Responsabilização enunciativa

2. A linguagem n n n Resposta à questão 1 A atividade de linguagem

2. A linguagem n n n Resposta à questão 1 A atividade de linguagem é inicialmente dependente da atividade « prática » . A dinâmica histórica permanente dos textos leva à ruptura com esse « cordão umbilical » . Devido a essa autonomização (relativa), os textos se constituem como instrumento (social – geral) de reflexão sobre a atividade, que é condição do desenvolvimento.

3. A reflexão « para » o desenvolvimento n Processos e produtos da reflexão

3. A reflexão « para » o desenvolvimento n Processos e produtos da reflexão § n A reflexão baseia-se em processos de base (comuns ao seres vivos): associação (behaviorismo), assimilação, acomodação, equilibração (Piaget) etc. Esses processos se desenvolvem na atividade social e geram produtos representativos, cujo valor é, ao mesmo tempo, objetivo e social, porque esses produtos são constituídos: n n n de um lado, por traços dos referentes mundanos objetivos que são visados pela e na atividade; de outro lado, por traços das trocas sócio-linguageiras que enquadram e organizam essa atividade. Esse produtos representativos se organizam e se transformam nos textos.

3. A reflexão « para » o desenvolvimento n A interpretação (reflexão) da atividade

3. A reflexão « para » o desenvolvimento n A interpretação (reflexão) da atividade n Quer sejam « espontâneos » quer sejam « dirigidos » , os processos de análise da atividade mobilizam os valores significantes da textualidade, e os resultados desses processos são marcados pelas propriedades da textualidade e, em particular, pelas propriedades dos tipos de discursos. Resposta à questão 3 Os processos de consciência se realizam na textualidade e os resultados desses processos são marcados por uma de suas propriedades, as dos tipos de discurso.

4. A interpretação da atividade de trabalho n As propriedades da atividade « prática

4. A interpretação da atividade de trabalho n As propriedades da atividade « prática » (teoria) n n n Seu caráter situado e imediato. Sua complexidade ou sua impenetrabilidade (Clot). A ação como forma interpretativa da atividade n n O foco nos recursos e na responsabilidade do actante (filosofia analítica). O foco nos determinantes externos; a avaliação a partir dos mundos formais de conhecimento (Habermas). O foco no curso temporal do agir (Theureau) e/ou no vivido dessa temporalidade (Bühler, Schütz). O foco no resultado do agir no mundo (Giddens).

4. A interpretação da atividade de trabalho n n As interpretações dos trabalhadores Dados

4. A interpretação da atividade de trabalho n n As interpretações dos trabalhadores Dados de entrevista antes e depois da realização (filmada) de um curativo feito pelas enfermeiras. n As análises temáticas: os diversos focos dos trabalhadores: recursos do actante, determinismos externos, curso do agir, resultado do agir. n A importância das análises discursivas: como os temas são postos em discurso e qual é a figura interpretativa que resulta disso: as diversas figuras de ação (Bulea).

4. A interpretação da atividade de trabalho n A ação ocorrência No discurso interativo:

4. A interpretação da atividade de trabalho n A ação ocorrência No discurso interativo: contextualizado; sem marca de estruturação temporal; foco na responsabilidade do actante. Entrevista posterior com J. – Tema : o desenrolar « non dans ma tête j’essayais deee / j’ai revisualisé / la façon dont le médecin avait fait [EB : han] juste la partie heu où il utilisait les pinces et pis après j’ai essayé deee // de penser comment est-ce que moi j’allais pouvoir heu [IF : mum] [EB : mum] comment est-ce que j’allais pouvoir faire / tout en me disant dans la chambre peut-être que j’y arriverais pas avec les pinces mais que c’était pas // pas grave // (sourires) puis que j’allais prendre mon temps »

4. A interpretação da atividade de trabalho n A ação acontecimento passado No relato

4. A interpretação da atividade de trabalho n A ação acontecimento passado No relato interativo: colocação a distância e forte estruturação temporal dos atos; responsabilidade do agente; exemplo que « fait événement » . Entrevista anterior com N. – Tema: o desenrolar « la dernière fois par exemple tu vois je devais enlever des fils à un patient / et // il avait / une collection de / de liquide séreux au niveau de la cicatrice j’ai la cicatrice qui s’est ouvert // le bout de la cicatrice / il avait une médiane / c’était le bout de la cicatrice qui s’est ouvert / tu vois […] j’ai enlevé les fils et puis tu sais j’ai commencé à appuyer et puis ça coulait / et heu ça c’est ouvert tu vois… »

4. A interpretação da atividade de trabalho n A ação experiência No discurso interativo:

4. A interpretação da atividade de trabalho n A ação experiência No discurso interativo: descontextualizado; sucessão de atos neutralizados/ menor foco na responsabilidade do actante; acão-tipo habitual. Entrevista anterior com S. – Tema : o desenrolar « j’fonctionne toujours comme ça / je vois si le patient est disponible dans la matinée s’y a pas d’examen s’y a pas de chose comme ça / j’préviens le patient qu’on va faire son pansement // des fois ça peut être dix minutes avant / des fois ça peut être une demie heure un heure // si c’est quelqu’un très angoissé on évite de le prévenir trop avant parce que sinon (rires) / mais / je préviens toujours avant le soin / après j’arrive ben si il est s’il est assis au fauteuil ben je le recouche je l’installe // je préserve la / la pudeur / puis j’installe mon matériel puis je fais le pansement »

4. A interpretação da atividade de trabalho n A ação canônica No discurso teórico;

4. A interpretação da atividade de trabalho n A ação canônica No discurso teórico; totalmente descontextualizado; justaposição de frases simples; ausência de responsabilidade do actante; protótipo do agir ou colocação em discurso dos procedimentos. Entrevista anterior com S. – Tema: o desenrolar « l’installation heu on déballe la plaie on prépare le / le set [IF : hum] / après on fait le pansement on communique / on ferme le pansement on réinstalle le patient on met la ceinture on réhabille / on remet bien le lit en position on lui propose d’aller au fauteuil si il doit aller au fauteuil ou il reste comme ça on lui remet tout son matériel à disposition / on tire le rideau et après / on on dit heu / voilà / au revoir au patient quoi »

4. A interpretação da atividade de trabalho n A ação definição No discurso teórico

4. A interpretação da atividade de trabalho n A ação definição No discurso teórico : apresentação geral do curativo como « fenômeno no mundo » ; sem tematização dos actantes, nem dos atos, nem de sua cronologia. Entrevista anterior com Adèle – tema: caracterização « ben le matin c’est le premier soin on rentre en contact avec les patients car on essaie de toujours les prendre au lever lorsqu’ils sont pas encore levés donc / c’est vraiment le / le premier réveil en fait / donc c’est là où on dit bonjour on / une première prise de contact donc bonjour on serre la main / on demande comment s’est passée la nuit qu’est-ce qu’on envisage pour la toilette donc c’est heu ça va dérouler un petit peu toute la journée en fait // c’est la prise de température du matin quelque part cette tension (rires) »

5. Da reflexão ao desenvolvimento n Teses em resposta à questão 4: n n

5. Da reflexão ao desenvolvimento n Teses em resposta à questão 4: n n A tomada de consciência é uma condição necessária mas não suficiente para o desenvolvimento. O desenvolvimento implica uma reorganização positiva e coerente das significações na economia psíquica da pessoa. n n n Positiva: se houver apropriação-interiorização das variantes do « debate interpretativo » em ação no social. Coerente: se houver a ultrapassagem desse debate e a construção de uma solução pessoal. A apropriação do debate interpretativo se efetua no quadro da análise da atividade.

5. Da reflexão ao desenvolvimento n O debate interpretativo da atividade n n Volta

5. Da reflexão ao desenvolvimento n O debate interpretativo da atividade n n Volta às entrevistas junto com as enfermeiras Em uma mesma entrevista, a alternância das figuras de ação em relação a uma mesma atividade é um índice empírico do processo de apropriação do debate interpretativo. As enfermeiras se diferenciam pela variedade das figuras de ação que elas podem propor de uma mesma atividade.

5. Da reflexão ao desenvolvimento n § O desenvolvimento da pessoa e de suas

5. Da reflexão ao desenvolvimento n § O desenvolvimento da pessoa e de suas capacidades de ação (competências? ) Ordem das representações construídas na análise da atividade de trabalho 1) A mobilização de recursos próprios. n 2) A regulação da utilização desses recursos em função das variantes da situação. n 3) A identificação (criação) e o desenvolvimento de novos modos de agir. n 4) A partir disso, atribuição de nova significação a seu trabalho.

6. Conclusão n Teses a serem debatidas: - O desenvolvimento implica, de um lado,

6. Conclusão n Teses a serem debatidas: - O desenvolvimento implica, de um lado, a apropriação-interiorização do debate (social) interpretativo sobre a atividade. - De outro, implica a mobilização recursiva do esquema de competências: mobilização —>regulação — >criação —> atribuição de nova significação. - Nos dois casos, sob efeito de uma análiseinterpretação da atividade « prática » . - Análise, ela mesma, determinada pelas propriedades discursivas da atividade de linguagem.

n Tradução de Anna Rachel Machado (LAEL – PUC/SP)

n Tradução de Anna Rachel Machado (LAEL – PUC/SP)